Teses e dissertações (2021-2022)

Defesas no ano de 2024

 

Teses de Doutorado

Língua portuguesa de herança: a paisagem sociolinguística na superdiversidade de Port-of-Spain

Partindo-se da premissa de que a língua portuguesa europeia de herança tem um alto grau de obsolescência em Trinidad e Tobago, esta tese tem por objetivo analisar a superdiversidade na paisagem sociolinguística na região de Port-of-Spain, capital de Trinidad e Tobago, no Caribe anglófono. A partir dessa análise, pretende-se relacionar a superdiversidade étnica e as memórias individuais e coletivas, buscando-se o lugar da língua portuguesa de herança nessa superdiversidade. Parte-se do princípio de que barreiras culturais implícitas na formação linguística e sociocultural do país, com raízes históricas advindas do século XIX, implicaram a formação de uma nova identidade sociocultural em decorrência da cisão entre a língua e a cultura, o que promoveu o surgimento e o fortalecimento de identidades múltiplas, de um hibridismo étnico que, através da paisagem sociolinguística, descortina a riqueza da superdiversidade do país. Esta pesquisa é de cunho etnográfico, qualitativo e quantitativo e, para a obtenção dos dados, aplicou-se um questionário online, entrevistas virtuais e presenciais, para um número de 16 participantes, adultos, com idade acima de 30 anos e com ancestralidade madeirense, a fim de relacionar a memória e a identidade individual. Além do questionário e das entrevistas, realizou-se uma pesquisa de campo, para mapear a presença da língua portuguesa europeia na superdiversidade da paisagem sociolinguística local. A análise da paisagem sociolinguística da região estudada incorpora-se aos espaços de memória individual e da comunidade étnica ancorando-se em estudos voltados ao pertencimento e à identidade cultural, à Língua de Herança (Lima-Hernandes e Ciochi-Sassi, 2015), à superdiversidade (Vertovec, 2007), à memória e identidade (Jelín, 2002), às Barreiras Culturais à Comunicação (Chibás Ortiz, 2020), bem como em estudos relacionados à língua portuguesa de herança no Caribe anglófono (Ferreira, 2011-2016; Collins-Gonsalves, 2017-2020) e em evidências na paisagem linguística local. Os resultados obtidos nas análises mostraram que, embora os madeirenses e seus ancestrais tenham contribuído para o desenvolvimento econômico do país, ainda há em seus discursos identitários e na superdiversidade existente na paisagem linguística local marcas que evidenciam barreiras culturais remanescentes do século XIX, o que justifica a obsolescência da língua portuguesa e atribui a ela o status de criticamente em perigo de extinção. Esse resultado pede, portanto, uma estratégia de ressignificação dessa língua e da aplicação, ainda que tardia, de políticas públicas que implementem ações afirmativas no âmbito sociolinguístico, para esse fim

Palavras-chave: Caribe anglófono; Cidades MIL; Língua de herança lusófona; Paisagem linguística; Superdiversidade.

Autoria: Eliete Sampaio Farneda

Orientação: Maria Célia Pereira Lima Hernandes

Coorientação: Felipe Chibás Ortiz

Data da defesa: 20/12/2024

Caminhos da imigração: os sobrenomes que contam histórias

A Onomástica é, por definição, a ciência linguística que se dedica ao estudo dos nomes próprios, considerando suas origens, processos de formação, organização no léxico das línguas e em sociedade. Este estudo, embasado pelos princípios teóricos da Linguística Cognitiva, volta-se para a Antroponímia – vertente que se ocupa dos nomes de pessoas, os antropônimos –, em específico, para os sobrenomes que, na tradição portuguesa, são os elementos posteriores ao(s) prenome(s) e que, unidos a este(s), compõem o ortônimo – nome civil completo, obrigatório por lei. Com base na reflexão acerca do grande fluxo imigratório observado no Brasil desde a abertura dos portos, em 1808, e mais intensamente a partir de 1850 (com auge em 1880), busca-se reunir os sobrenomes portugueses verificados em corpora datados a fim de elaborar um dicionário onomástico etimológico desses sobrenomes em uso no Brasil, segundo os dicionários de Nascentes (1952), Guérios (1981) e Machado (2003). Os corpora analisados foram: a) as fichas de registro de matrícula de imigrantes portugueses recém-chegados ao Brasil que se dirigiram à Hospedaria de Imigrantes do Brás entre os anos de 1887 e 1889; b) os passaportes dos portugueses que imigraram para o Brasil entre os anos de 1888 e 1890, documentos preservados pelo Arquivo da Universidade de Coimbra, referentes ao Fundo do Governo Civil de Coimbra; e c) a lista de aprovados na primeira chamada da Fundação Universitária para o Vestibular (Fuvest), em 2017, em domínio público. O resultado dessas análises compõe o referido dicionário onomástico etimológico dos sobrenomes portugueses em uso no Brasil, perpassando conceitos do Léxico, da Etimologia, da Filologia, da Linguística Cognitiva e da Linguística Histórica e contribuindo com o cabedal das produções lexicográficas em língua portuguesa em meio a um cenário carente de obras dessa natureza.

Palavras-chave: Antroponímia; Etimologia; Léxico; Onomástica; Sobrenomes portugueses.

Autoria: Letícia Santos Rodrigues

Orientação: Mário Eduardo Viaro

Data da defesa: 17/12/2024

Os criptogramas de Antonio Telles da Silva contra a colonização holandesa em Pernambuco: um estudo paleográfico

Esta tese investiga o uso de criptogramas assinados por Antonio Telles da Silva  – figura proeminente na história militar portuguesa  – como ferramentas de combate durante a ocupação holandesa em Pernambuco no século XVII. Diferentemente dos manuscritos convencionais, aqui chamados de texto simples, os criptogramas são mensagens ou textos codificados, cujo objetivo principal é assegurar sigilo. No entanto, as mensagens desses criptogramas revelam uma função adicional da escrita: atuar como instrumentos de desinformação, ampliando os recursos portugueses contra os holandeses, prática reconhecida no meio militar. A pesquisa aborda, assim, a função social da escrita e seus papéis na comunicação colonial. O objeto de estudo inclui seis manuscritos: dois com criptogramas, dois com as respectivas chaves de acesso e dois em texto simples que contêm as respostas dos criptogramas. Esse material inédito, interceptado pelos holandeses à época de sua produção, em 1649, e hoje preservado no Arquivo Nacional de Haia, representa uma temática ainda pouco explorada nas pesquisas de humanidades. Redigidos para o rei de Portugal, esses documentos incluem diversos relatos sobre a guerra então instaurada, incluindo alguns que parecem ser distorções ou inverdades. O objetivo geral desta tese é divulgar e analisar criticamente esses testemunhos, por meio de seus fac-símiles e da transcrição semidiplomática. Para tanto, utiliza-se uma metodologia que combina análise paleográfica e historiográfica, explicada na segunda seção; a terceira seção traça um panorama histórico da ocupação holandesa e da resistência portuguesa em Pernambuco. A quarta foca no papel de Telles da Silva, enviado ao Brasil para liderar as insurreições pernambucanas e que, embora não tenha vivido para presenciar a vitória final, deixou suas assinaturas nos papéis dessa história. A quinta seção apresenta um ensaio paleográfico sobre as diferenças nos modos de produção entre manuscritos codificados e convencionais, configurando o primeiro objetivo específico da pesquisa. A sexta seção apresenta um estudo paleográfico e histórico sobre os manuscritos assinados por Telles da Silva, além de uma colação entre fragmentos que revela variações ortográficas, evidenciando que a produção documental tenha sido feita por mais de um punho. Este estudo comparativo representa o segundo objetivo específico deste trabalho. Ao compreender a necessidade de uma rede de pessoas que atuassem em favor da produção e do envio das mensagens de Telles da Silva, a sétima seção foi incluída na pesquisa para promover uma discussão sobre os modos de circulação desses documentos. Na conclusão, reúnem-se todas as informações das seções anteriores e argumenta-se que esses criptogramas não foram apenas ferramentas de comunicação secreta, mas armas estratégicas no arsenal de Telles da Silva, contribuindo de forma decisiva para a soberania portuguesa sobre Pernambuco, consolidada em 1654.

Palavras-chave: Colonização holandesa no Brasil; Criptografia; Função social da escrita; Paleografia.

Autoria: Antonio Sergio Ackel Barbosa

Orientação: Marcelo Módolo

Data da defesa: 16/12/2024

Gramaticalização e semanticização da expressão se pá no português brasileiro

O presente trabalho tem como proposta uma análise funcionalista-cognitivista sobre os processos de gramaticalização e semanticização da expressão se pá no português brasileiro. Para tanto, essa investigação é amparada em dados concretos da língua em uso – no caso, enunciados retirados do X (antigo Twitter) – o que explica o caráter funcionalista da pesquisa, pois, neste trabalho, a língua é considerada um instrumento de interação social. Além disso, o caráter cognitivista desta tese se justifica pela hipótese de que parte da expressão em estudo fornece informações referentes a domínios mais concretos que podem levar a projeções metafóricas e metonímicas a fim de desenvolver noções mais abstratas. Dessa forma, esta tese tem como modelo teórico-metodológico os pressupostos básicos da Abordagem Multissistêmica da língua. Procura-se, então, contribuir com estudos do português brasileiro, defendendo que a expressão se pá se encontra gramaticalizada e semanticizada como adjunto adverbial de dúvida e conjunção condicional no português brasileiro.

Palavras-chave: Se pá; Abordagem Multissistêmica da Língua; Gramaticalização; Semanticização.

Autoria: Monique Bisconsim Ganasin

Orientação: Marcelo Módolo

Data da defesa: 21/11/2024

Impolidez, avaliatividade e desacordo: por um modelo de análise da violência verbal em comentários conversacionais digitais

Os estudos sobre violência verbal em interações digitais têm ganhado relevância nos últimos anos, diante da crescente polarização política e social e da proliferação de discursos agressivos on-line. Nesse contexto, esta tese busca compreender as dinâmicas argumentativas e interacionais subjacentes a esses fenômenos discursivos, focalizando especificamente as manifestações de violência verbal em comentários sobre um tema polêmico: o aborto. Por meio da articulação de teorias da Argumentação, da Pragmática e da Linguística Sistêmico-Funcional, este estudo propõe um modelo teóricometodológico de análise da violência verbal em comentários conversacionais digitais. O aparato teórico-metodológico que embasa esse modelo analítico integra os conceitos de polêmica, o sistema de AVALIATIVIDADE e as teorias da Impolidez com os conceitos de acordo e desacordo profundo, oriundos da Nova Retórica e da Lógica Informal, para descrever, interpretar e explicar os atos de violência verbal no contexto das interações polêmicas on-line. A hipótese central de nossa pesquisa é a de que diferentes tipos de desacordo, da falta de acordo com base em hierarquias de valores a desacordos profundos, podem influenciar significativamente as estratégias de impolidez empregadas pelos interlocutores e as formas de construção avaliativa instanciadas. O corpus analisado é composto de comentários a artigos sobre um caso específico de aborto, envolvendo uma criança de 10 anos vítima de estupro, publicados nos sites da Folha de S.Paulo e da Gazeta do Povo. A análise evidenciou uma predominância de desacordos profundos em ambos os jornais, especialmente aqueles baseados em choques de princípios subjacentes, com foco no papel e legitimidade da Igreja Católica em sua posição anti-aborto e no estatuto moral do feto. As estratégias de impolidez positiva foram as mais frequentes, com destaque para a subestratégia Associe explicitamente o outro a um aspecto negativo. Quanto à avaliatividade, houve prevalência de julgamentos de sanção social de propriedade negativa. Observamos uma correlação entre a tipologia do desacordo e a intensidade da impolidez e da atitude negativa. Os resultados obtidos corroboram nossa hipótese e ressaltam os mecanismos argumentativos e linguísticos que podem favorecer a manifestação da violência verbal on-line, oferecendo uma contribuição teórica para os estudos nesse campo e subsídios para a compreensão de questões sociais urgentes relacionadas às interações em ambientes digitais polarizados.

Palavras-chave: Avaliatividade; Desacordo profundo; Impolidez; Interação digital; Polêmica; Violência verbal.

Autoria: Adelmo Cordeiro Galindo

Orientação: Paulo Roberto Gonçalves Segundo

Data da defesa: 29/10/2024

Proposta didática de leitura interativa de poemas de Oswald de Andrade: contribuições dos estudos léxico-semânticos

A semana de 22 foi um marco no que diz respeito a quebras de padrões estéticos e sociais. Nas artes, percebe-se, nitidamente, a identificação dos artistas brasileiros com os movimentos de vanguarda europeus. A literatura, por sua vez, não fica à margem dessa influência, manifestando, em sua estética e composição, um estilo inovador, que, de certa forma, quebra a norma tida culta. É nesse contexto que Oswald de Andrade inscreve seu estilo telegráfico a partir de ideais cubofuturistas. Entretanto, a abordagem desse estilo inovador nos poemas oswaldianos, que defendiam a democratização do acesso à literatura, era (e ainda continua sendo) um obstáculo a ser transposto por um leitor não experiente. Atualmente, no âmbito escolar, há de se considerar as dificuldades dos alunos da Educação Básica em preencher as lacunas interpretativas da literatura de Oswald de Andrade (doravante OA). Nesse sentido, as teorias de Richards (1976) e Nation (2005) sobre o ensino de léxico e a construção de relações semânticas (Biderman, 2001 e Ullmann, 1964) podem fundamentar a organização do vocabulário nos poemas oswaldianos. O objetivo é mostrar como o estabelecimento de relações semânticas pode ser a base para uma proposta de leitura interativa, organizada metodológica e sistematicamente, para auxiliar o trabalho do professor de Língua Portuguesa da Educação Básica na interface língua-literatura.

Palavras-chave: Educação Básica; Ensino de léxico; Leitura interativa; Poemas oswaldianos; Relações semânticas.

Autoria: Dafne Rodrigues Alvares de Castro

Orientação: Beatriz Daruj Gil

Data da defesa: 26/09/2024

Edição eletrônica para extração automática de dados linguísticos a partir de metadados em corpora eletrônicos: uma proposta de aplicação com base em uma edição semidiplomática de correspondências pessoais do século XX

Esta tese tem o objetivo de propor uma edição eletrônica de textos voltada à extração automática de dados linguísticos a partir de metadados em corpora eletrônicos, utilizando um sistema de busca flexível que pode ser aplicado a diferentes conjuntos de textos. Para tanto, foi proposto um fluxo de trabalho, organizado em duas fases de aplicação: fase preliminar – que compreende a prospecção e a digitalização dos textos, seguida pela edição semidiplomática; e fase essencial para a extração de dados – na qual ocorre a edição dos textos em linguagem XML e a aplicação do módulo de busca para a extração automática dos dados linguísticos a partir de metadados. O sistema de busca desenvolvido permite tanto pesquisas simples, por meio da busca de palavras, quanto pesquisas avançadas, utilizando a rede de ligações entre os dados extraídos. A aplicação da proposta foi feita com base na edição semidiplomática acompanha de fac-símiles da Coleção Documental Família Estrela Tuy, composta por 152 correspondências pessoais do século XX, produzidas por 49 brasileiros, nascidos entre 1890 e 1959, cuja maioria, com o local de nascimento identificado, é baiana. Além da proposta de um fluxo de trabalho replicável, o estudo discute a importância da interdisciplinaridade entre Filologia, Linguística Histórica sócio-histórica e Humanidades Digitais para a constituição e manipulação de corpora eletrônicos. A tese explora a relevância de práticas filológicas tradicionais, bem como a importância da descrição codicológica e paleográfica, aliadas ao uso de ferramentas digitais, que permitem a otimização do tempo de pesquisa e a ampliação do volume de textos acessíveis para análise. O corpus controlado utilizado nesta pesquisa, a Coleção Documental da Família Estrela Tuy, foi selecionado por sua riqueza de informações socioculturais e históricas, levantadas por meio de uma investigação exaustiva para responder às perguntas básicas da paleografia, Qué?, Cuándo?, Dónde?, Cómo?, somadas àquelas propostas por Petrucci (2003, p. 7-8): Quién lo realizo?, Para qué fue escrito ese texto. A investigação dos remetentes e destinatários foi realizada a partir de entrevistas narrativas, consultas à bibliografia disponível sobre as famílias e informações contidas nas correspondências. A edição semidiplomática desses textos, disponível no Volume II desta tese, foi elaborada com base normas propostas pelo Projeto Para a História do Português Brasileiro (PHPB). O sistema de busca e a edição eletrônica implementados neste estudo demonstram a viabilidade de realizar buscas automatizadas e a extração de dados linguísticos com eficiência, oferecendo uma solução que pode ser adaptada a outros corpora. O website desenvolvido para abrigar os textos e o sistema de busca está acessível ao público (disponível em Coleção documental da Família Estrela Tuy), contribuindo para futuras pesquisas nas áreas de Filologia, Linguística Histórica e Humanidades Digitais. Entre as perspectivas futuras, estão o desenvolvimento de novas camadas de anotação morfossintática e a criação de um manual para facilitar a replicação do método proposto em novos corpora.

Palavras-chave: Edição eletrônica; Exploração automática de dados; Filologia; Humanidades Digitais; Linguística Histórica sócio-histórica.

Autoria: Priscila Starline Estrela Tuy Batista

Orientação: Maria Clara Paixão de Sousa

Data da defesa: 26/08/2024

Cadeias de gênero: uma abordagem ontológica e tipológica

Esta tese realiza um debate teórico-metodológico sobre a ontologia das cadeias de gênero, de modo a construir uma tipologia adequada. Além disso, também promove uma reflexão sobre como as características da internet e as plataformas digitais contribuem na constituição deste fenômeno. Também realiza a análise de uma cadeia de gêneros para testar a produtividade do percurso teórico-metodológico construído. O debate é guiado pelos pressupostos de enunciado e gênero do Círculo de Bakhtin, a partir de autores como Volochinov (2018) e Bakhtin (2003; 2010), articulados às propostas da Análise Crítica do Discurso (ACD), em especial de autores como Fairclough (2003), Wodak, Chouliaraki & Fairclough (1999), no que diz respeito aos gêneros interligados, em diálogo com outras perspectivas sobre cadeia de gênero como Swales (2004), Nobre e Biasi-Rodrigues (2012) e Araújo (2021). Defende-se a hipótese de que as cadeias de gênero configuram-se a partir de recortes metodológicos de uma rede de enunciados mais complexa. Também foram mobilizados os estudos de Plataforma Digital e os estudos discursivos na internet, de autores como D'Andréa (2020), Morozov (2018), Araújo (2021) e Paveau (2021), articulando as reflexões sobre gêneros e cadeias de gêneros. A tese debruçou-se sobre um corpus formado pela cadeia de gêneros intitulada "cloroquina", composta por diversos tipos instanciados entre março de 2020 e outubro de 2021, guiados pela temática da cloroquina enquanto um tratamento à COVID-19. Como resultado, verificou-se dois tipos de relações principais entre os gêneros: a relação por posição e a relação por conteúdo tópico. Da relação por posição, foram constituídas as categorias de relação chaveada, linear e associada, intra e interesférica; da relação por conteúdo tópico, foram constituídas as categorias de relação central, colateral, periférica e acessória. A análise da cadeia de gêneros permitiu testar na prática a tipologia estabelecida, demonstrando a transformação dos sentidos no entorno da cloroquina, que passou de uma esperança e um potencial ao tratamento contra a COVID-19 para um objeto de discurso com sentido de ineficácia e negacionismo.

Palavras-chave: Cadeias de gênero; Discurso; Discurso digital; Gênero discursivo; Plataforma digital.

Autoria: Sergio Mikio Kobayashi

Orientação: Paulo Roberto Gonçalves Segundo

Data da defesa: 20/08/2024

Terminologia em sala de aula por meio da leitura de artigos de divulgação científica

O presente trabalho tem como objetivo verificar de que forma os componentes da competência lexical, em especial, os conhecimentos terminológicos estão presentes em documentos oficiais que funcionam como diretrizes para o Ensino Fundamental 1, no que diz respeito ao componente Língua Portuguesa. Tal investigação justifica-se pelo fato de que o desconhecimento de elementos da competência lexical impede a compreensão de artigos de divulgação científica e, por conseguinte, a difusão de conhecimentos. No âmbito deste trabalho, as terminologias serão componentes privilegiados na análise, de forma a demonstrar como colaboram na compreensão leitora e na democratização de conhecimentos científicos. Trata-se de uma pesquisa documental, com a análise de documentos oficiais (Base Nacional Comum Curricular e Currículo da Cidade de São) e do material didático Caderno da Cidade: saberes e aprendizagens, além da apresentação de propostas didáticas para o ensino do léxico especializado para estudantes do Ensino Fundamental.

Palavras-chave: Artigos de divulgação científica; Competência leitora; Competência lexical; Material didático; Terminologias.

Autoria: Lígia Fabiana de Souza Silva

Orientação: Mariângela de Araújo

Data da defesa: 19/08/2024

Produção de artigos de opinião nos manuais da Educação de Jovens e Adultos (EJA)

A Educação de Jovens e Adultos (EJA), um espaço significativo de políticas educacionais, abre portas de aprendizagem para estudantes que retornam à escola em busca de conhecimento para uma atuação profissional. Nesse contexto sociocultural, o ensino de gêneros discursivos argumentativos assume um aspecto central na formação crítica dos educandos, possibilitando uma ampliação de conhecimento e uma inserção cidadã deles na sociedade. O objetivo geral desta tese é analisar e discutir, por meio dos conceitos da Análise Dialógica do Discurso (ADD), as orientações didáticas do gênero argumentativo artigo de opinião nas coleções didáticas aprovadas no PNLD-EJA/2014. A escolha do programa se deve porque, em um período de dez anos (2014 a 2024), não se produziram manuais didáticos de língua portuguesa para EJA. Diante dessa descontinuidade do programa, coloca-se um problema: Como o material disponível propõe o ensino de produção de artigos de opinião no Brasil? Tomamos como fundamentação teórica três conceitos de Bakhtin e o Círculo o enunciado concreto (Volóchinov, 2018[1929-30]), os gêneros do discurso (Bakhtin, 2016[1952-53), as tensões discursivas (Bakhtin, 2015[1975]). São fundantes também o conceito de pedagogia libertadora (Freire, 1981) e o conceito de argumentação a partir da análise do discurso desenvolvida por Charaudeau (2019). Levando em consideração esse embasamento teórico-metodológico, a pesquisa está organizada em duas etapas: documental e analítico-qualitativa. Na primeira etapa, foram coletadas seis coleções didáticas de língua portuguesa da EJA dos anos finais do Ensino Fundamental, compondo o corpus de análise. Na segunda, o foco recaiu na análise das atividades didáticas relativas ao gênero artigo de opinião. São os seguintes os resultados da investigação quanto ao ensino do artigo de opinião nos manuais do PNLD-EJA/2014: foram identificados dois conjuntos de obras: multisseriados (2) e seriados (4), com marcas composicionais distintas. No primeiro conjunto, as atividades de leitura e de produção do artigo de opinião consideram os seguintes aspectos: a) temas sociais; b) metalinguagem; c) oralidade. No segundo conjunto, as atividades de leitura e de produção do artigo de opinião voltam-se para: a) temas sociais; b) crítica e ponto de vista; c) texto escrito. As obras multisseriadas exploram a oralidade, permitindo a ampliação do repertório dos estudantes; as seriadas enfatizam as regras gramaticais e a estrutura composicional do gênero. Ambas, entretanto, convergem na abordagem de temáticas sociais e culturais, enfatizando o debate público. As convergências e divergências reforçam as tensões discursivas, silenciam o potencial argumentativo da língua e distanciam os estudantes de práticas de produção de textos que ativam a cidadania. Com os novos avanços tecnológicos, assim como a natureza multigeracional da EJA, entende-se ser necessário ampliar as formas de direcionamento e estruturação de materiais didáticos para essa modalidade de ensino, pautando-se nos discursos públicos e sua relação com a vida. Os estudantes, ao produzirem artigos de opinião, desenvolvem uma ação cidadã autônoma e crítica por meio da linguagem e suas refrações socioideológicas.

Palavras-chave: Artigo de opinião; Cidadania; Educação de jovens e adultos; Ensino da argumentação; Língua em uso.

Autoria: Elvis Lima de Araujo

Orientação: Maria Inês Batista Campos

Data da defesa: 20/06/2024

A história se repete: uma visão crítico-discursiva de notícias sobre agressão ao meio ambiente

A vida de moradores das regiões afetadas por acidentes de grandes impactos negativos às pessoas e ao meio ambiente que ocorreram no passado mais distante, e continuam a acontecer até hoje, não foi plenamente recuperada, nem os elementos naturais dos quais os seres vivos são dependentes voltaram à sua normalidade cíclica. A presente tese tem o objetivo de identificar os recursos linguístico-discursivos a fim de analisar as possíveis relações de desigualdade social existente entre os considerados responsáveis pelo acidente e os vitimados. Nesse caso, a ordem social formando uma rede de práticas, em algum sentido, apresenta um problema e, sendo assim, busca-se na Análise Crítica do Discurso suporte teórico-metodológico para estudar o contexto situacional que envolve a representação dos atores sociais e os processos de fala e ação a eles relacionados. Os participantes do discurso posicionados diferentemente na sociedade veem e representam a vida de modo próprio, com discursos distintos e tais representações, no entanto, podem incluir ou excluir atores sociais para servir aos interesses e propósitos da mídia em relação aos leitores a quem se dirigem. O inventário desenvolvido por van Leeuwen contribui sobremaneira para reconhecer os processos de formação de representação social. Conceber a língua como um mecanismo de escolhas, a linguagem como representação que faz referência às entidades do mundo e como elas agem e se relacionam compõem o sistema de transitividade gramatical referente à metafunção ideacional conforme a Linguística Sistêmico-Funcional, o que nos auxilia a compreender os diferentes tipos de Processos Verbais e Materiais, recorte adotado por nós neste trabalho entre os seis propostos por Halliday e Matthiessen. Busca-se uma análise diacrônica em textos que noticiaram seis acidentes: dois deles envolvendo liberação de radioatividade, o da explosão da usina de Chernobyl em 1986 e o do início da Guerra entre Rússia e Ucrânia em 2022; dois acidentes envolvendo vazamento de petróleo no mar, o do navio Exxon em 1989 e o aparecimento de petróleo nas praias do Nordeste brasileiro em 2019; os outros dois acidentes envolveram rompimento de barragens em duas cidades mineiras, Mariana e Brumadinho, em 2015 e 2019. O corpus consiste em sessenta textos, pertencentes ao gênero notícia, coletados nos jornais O Estado de S.Paulo e Folha de S.Paulo nas respectivas datas dos acidentes ou na primeira divulgação deles, assim como também em datas comemorativas que vão de dois a dez anos após os acidentes ou de iminência de nova ocorrência. A comparação do discurso nas notícias publicadas no mesmo dia e no mesmo período nos dois jornais, possibilitou, ademais, uma análise sincrônica. Os conceitos definidos pela Ecolinguística contribuíram com as análises, por representarem as interações verbais que se dão no interior do ecossistema linguístico, além de o tema perpassar a agressão à natureza e nos concentrarmos nas consequências dos acidentes que acarretam sofrimento e dor, preocupação da Ecolinguística ao valorizar qualquer forma de vida e bem-estar. Como resultado, pode-se compreender os textos jornalísticos inseridos em contextos sócio-históricos que estabelecem relações hegemônicas e ideológicas nos e pelos discursos.

Palavras-chave: Acidentes; Discurso; Ecolinguística; Meio Ambiente; Notícia.

Autoria: Célia Regina Araes

Orientação: Maria Lúcia da Cunha Victório de Oliveira Andrade

Data da defesa: 10/06/2024

Os manuscritos de Vidas secas: a gênese

Entre maio e outubro de 1937, Graciliano Ramos redigiu a sua obra mais famosa, Vidas secas. Por meio da análise genética dos manuscritos que deram origem ao livro, esta pesquisa tem como objetivo elucidar as práticas e os processos de escrita do autor. O corpus objeto de trabalho é constituído por documentos da chamada "fase redacional", os quais, com suas marcas e emendas, testemunham a variação sofrida pelo texto e evidenciam a gênese de Vidas secas. Para realizar a pesquisa, servem de esteio a crítica genética e a crítica textual, com recortes específicos na paleografia e na codicologia. Na primeira parte, procura-se posicionar teoricamente esta tese e enquadrar cientificamente seus princípios e métodos, com atenção especial para a querela conceitual existente entre crítica genética e filologia, além de indicar o estado da questão no Brasil. A segunda parte traz reflexões sobre a história da gênese, buscando ao mesmo tempo retratar e relativizar as condições de produção da obra, abrindo as portas do laboratório do escritor. Nesse ponto, também é possível observar os elementos materiais, como a letra, a tinta e o suporte de escrita, abordados mais detidamente no capítulo específico de análise paleográfica. Uma vez reunidos e classificados os manuscritos, a terceira parte compreende os esforços de transcrição desses documentos autógrafos, disponibilizando-os não apenas por meio de uma edição fac-similar, mas também tornando-os acessíveis e legíveis com uma transcrição topográfica. Na quarta parte, apresenta-se a edição genética de Vidas secas com a classificação exaustiva das emendas autorais, que constituem a base operatória deste trabalho. Ao fim, após a reunião, classificação, decifração e transcrição do dossiê, é possível conhecer as práticas de escrita de Graciliano Ramos e apontar para novas hipóteses de interpretação dos dados e mesmo do romance, etapa complementar dos estudos de gênese.

Palavras-chave: Crítica genética; Crítica textual; Gênese; Graciliano Ramos; Manuscriptologia; Manuscritos; Vidas secas.

Autoria: Mario Santin Frugiuele

Orientação: Manoel Mourivaldo Santiago-Almeida

Data da defesa: 10/06/2024

As investigações sintáticas de Mattoso Camara: explorando seus papeis de trabalho a fim de suas ideias linguísticas sobre sintaxe

Auroux (2006) afirma, na perspectiva da História das Ideias Linguísticas, que as representações supõem os objetos; define, então, o domínio de objetos históricos como um conjunto qualquer de entidades suscetíveis de serem o apoio empírico do trabalho do historiador. Por sua vez Swiggers (2019) aponta a necessidade de obter mais e melhores informações sobre fontes não publicadas e vários tipos de textos-fonte "não canônicos" (trabalhos manuscritos, correspondência, rascunhos, notas preparatórias etc.). Nestas coordenadas teóricas situamos nossa investigação sobre a representação da sintaxe no pensamento linguístico de Joaquim Mattoso Camara Jr. (1904 - 1970). A partir do objetivo geral de historiar o processo de elaboração do conceito de sintaxe presente em seus escritos, traçamos os seguintes objetivos específicos: analisar o domínio de objetos acerca das especulações de Mattoso Camara sobre sintaxe a partir do aparato crítico da genética textual aplicada aos textos de linguistas (Fenóglio, 2012, 2013, 2019); analisar e historiar as ideias linguísticas que compõem o sistema de objetos da ideia de sintaxe de Mattoso Camara, a partir de um instrumental analítico próprio, com fundamento na filosofia do conhecimento de Santos (1955), na epistemologia linguística de Auroux (1998) e na filosofia da ciência de Laudan (2011); e produzir uma edição semidiplomática dos documentos, colhidos no Centro de Estudos Linguísticos Mattoso Camara da Universidade Católica de Petrópolis, que compõem o referido domínio de objetos. O sistema de objetos analisado é descrito como segue: uma teoria da frase (TF) conforma o fenômeno linguístico em apreço através de uma conceituação e de uma escolha terminológica (frase), de que emerge um objeto científico, o padrão frasal (PF) com seus elementos (vocábulos, morfemas e semantemas), cujas relações (ordem, associação e concordância) constituem os mecanismos sintáticos (MS). Este objeto enseja um campo de saber, a sintaxe (S). Os conhecimentos que o ensejam e aqueles que são nele produzidos reverberam os horizontes (H), de retrospecção e de problematização, que o fundamentam epistemologicamente. Esta tese fundamenta-se, metodologicamente, na proposta hipotético-confirmativa de Auroux (1980), que busca abordar os documentos com questões precisas a resolver, bem como no conceito de processos de historicização, adaptação do conceito de modos de historicização (AUROUX, 2021 [2006]), entendido como a maneira pela qual instrumentos, enunciados e ideias linguísticas são afetados pela temporalidade inerente à ação dos agentes sobre eles. Defendemos, assim, a tese de que Mattoso Camara empreendeu esforços para a elaboração de um tratado linguístico sobre sintaxe, com o intuito de promover um avanço teórico neste campo. Exploramos como evidência deste fato um documento datiloscrito de vinte duas folhas intitulado "Os Fundamentos da Sintaxe". Defendemos, igualmente, que os termos da contribuição que traria para a área seriam: a ideia de uma teoria integral do discurso que incluiria uma teoria da enunciação, uma teoria da frase e uma teoria da sintaxe; e a ideia de que o objeto da sintaxe são os padrões frasais de uma língua ou de um conjunto de línguas determinadas. Esta tese compõe-se de um estudo preliminar dos documentos e das ideias que conformam o projeto sintático de Mattoso Camara e da edição semidiplomática dos documentos que compõem o domínio de objetos com o qual trabalhamos. Pretendemos, também, contribuir para a história das ciências da linguagem no Brasil ao disponibilizar numa edição para historiadores, historiógrafos e estudiosos da linguagem o registro de uma faceta do pensamento linguístico de Mattoso Camara pouco divulgado, bem como o testemunho de aspectos de seu labor científico: suas escolhas terminológicas e doutrinarias; os problemas que lhe são caros e as soluções que buscou elaborar; a retórica que assumiu e as atitudes discursivas que empreendeu; o horizonte de retrospecção em que se fundamentou. Enfim, buscamos possibilitar, igualmente, a emergência de outros trabalhos de historiografia linguística sobre o tema.

Palavras-chave: História das Ideias Linguísticas; Horizonte de retrospecção; Joaquim Mattoso Camara Jr.; Linguística brasileira; Sintaxe.

Autoria: Francivaldo Lourenço da Silva

Orientação: Marli Quadros Leite

Data da defesa: 07/06/2024

“E mandaraõ fazer este termo”: edição fac-similar e semidiplomática e estudo das Atas da Câmara de Jundiaí de 1732 a 1744

Esta tese concentra- se na elaboração da edição fac-similar e semidiplomática das Atas da Câmara de Jundiaí de 1732 a 1744, bem como em seu exame e nos estudos das estruturas presentes em seu texto. O códice, parte integrante do acervo do Centro de Memória de Jundiaí, encontra-se bem preservado e documenta as práticas administrativas de uma das cidades mais antigas do estado de São Paulo, fundada no século XVII. A pesquisa apresenta, ainda, o estudo comparativo com as Atas da Câmara de Jundiaí de 1663 a 1669, procurando identificar conservações e inovações nos modelos empregados pelos escrivães ao longo dos mais de 60 anos que separam um códice do outro. Para tanto, os capítulos que compõe este trabalho abordam aspectos históricos de Jundiaí, fundamentos teóricos (Filologia, Paleografia, Codicologia, Diplomática e Modelo de Tradições Discursivas), detalhamento do processo de escolha do códice para o estudo, descrição das características materiais do códice, edição fac-similar e semidiplomática, análise das estruturas do texto e a contextualização das Atas da Câmara de Jundiaí de 1663 a 1669. Por fim, apresento minhas considerações finais, as normas de edição como Anexo, e no Apêndice, um pequeno glossário contendo termos usados nas atas do século XVIII e um quadro com informações relevantes acerca do códice do século XVII. Ao salientar a importância do trabalho filológico em documentos brasileiros, a tese visa não apenas contribuir para a compreensão de Jundiaí no contexto histórico, linguístico e cultural, mas também fornecer bases sólidas para futuras explorações e pesquisas que possam se desenvolver a partir do material e das análises aqui apresentados.

Palavras-chave: Atas; Códice; Filologia; Jundiaí; Linguística; Manuscrito; Século XVIII; Tradição Discursiva.

Autoria: Kathlin Carla de Morais

Orientação: Verena Kewitz

Data da defesa: 18/03/2024

Ex-votos brasileiros e portugueses sob a ótica da Filologia e da Linguística: edição e estudo de textos dos séculos XVIII e XIX

A presente tese visa a apresentar um corpus diacrônico que reúne ex-votos pintados brasileiros e portugueses, dos séculos XVIII e XIX. Tendo como ponto de partida a Filologia (Castro, 2004 [1992]; Cambraia, 2017; Megale, 1998) com argumentos da Paleografia (Burwanger; Leal, 2008; Lose; Souza, 2018), da Diplomática (Bellotto, 2002; Camarotto, 2007; Duranti, 2015) e da Linguística (Castilho, 2007, 2010, 2015) colocam-se os ex-votos em posição central da investigação e busca-se traçar o perfil filológico desse material de forma a reconhecê-lo como produto textual. A hipótese que subjaz o presente trabalho é a de que, além dos aspectos artísticos e pictóricos, os ex-votos, sejam eles brasileiros ou portugueses, carregam Tradições discursivas (Kabatek 2006, Oesterreicher 2001, 2012, Koch; Oesterreicher, 1990) para além do registro linguístico que apontam para a historicidade desses textos. Defende-se a tese de que a elaboração dos ex-votos é marcada por uma intencionalidade cultural que, por meio de Tradições Discursivas, combina texto verbal com texto não verbal e constrói uma narrativa multimodal que permite interpretar quais foram os motivos e as retribuições por uma graça obtida. Esta tese pretende contribuir, igualmente, com o processo de salvaguarda desses objetos de devoção popular católica que, do ponto de vista patrimonial, convergem traços materiais e imateriais. A edição conservadora das legendas e a edição fac-similar dos ex-votos apresentadas neste trabalho não apenas contribuem para esse processo de preservação, como também para o processo de divulgação, no âmbito acadêmico, mas não só, dos ex-votos.

Palavras-chave: Edição filológica; Ex-votos; Patrimônio documental; Religiosidade católica; Tradições Discursivas.

Autoria: Marcus Vinicius Pereira das Dores

Orientação: Verena Kewitz

Coorientação: Maria Filomena Gonçalves

Data da defesa: 19/02/2024

Análise da percepção da prosódia afetiva de pacientes com esquizofrenia

Esta tese baseada em um estudo quantitativo exploratório tem como objetivo verificar se a percepção das emoções através da entoação por pessoas com esquizofrenia tem características específicas que permitam ser adotadas como parâmetros auxiliares em seu diagnóstico. A esquizofrenia consiste em um transtorno mental severo sem sintomas específicos, caracterizada por um misto de sinais e sintomas disformes. O DSM V (APA, 2013) inclui a prosódia como um dos possíveis sintomas negativos da esquizofrenia, aqueles que afetam a expressão e compreensão das emoções. Especialmente, para a realização desta pesquisa, foram selecionados 3 grupos de participantes: 10 pessoas com esquizofrenia atendidos pelo Centro de Atenção Psicossocial (CAPS II "Espaço Vivo), uma das alas do Centro de Atenção Integral à Saúde Prof. Cantídio de Moura Campos (SECAISs); 10 indivíduos acometidos pela esquizofrenia que são frequentadores do Museu de Imagens do Inconsciente, serviço de saúde mental que compõe o Instituto Nise da Silveira (SEMIIs); somados a 10 sujeitos sem histórico médico anterior de transtorno mental ou doença psíquica que formaram o grupo de controles (SCs). Todos os grupos aceitaram voluntariamente participar de uma entrevista de anamnese que foi gravada com equipamento de armazenamento acústico H4 ZOOM, na qual foram coletados dados sociodemográficos e se solicitou que relatassem uma experiência feliz, uma triste e uma que lhes proporcionou raiva. Logo, na sequência, os grupos concordaram em responder a um teste perceptivo, dividido em duas fases: Familiarização e Teste Perceptivo. A Familiarização era composta por 12 estímulos, elaborados por uma atriz profissional representando três emoções (alegria, tristeza e raiva), a partir de duas frases "As células do sangue que fabricam anticorpos são individualizadas" e "As células do fígado são provavelmente iguais entre si" (Vassoler, 2011), foram apresentadas aos sujeitos em sua metade lexicalizada e a outra parte deslexicalizada. O Teste Perceptivo era composto de 48 estímulos, nos quais um ator profissional simulava três emoções (alegria, tristeza e raiva), advindo de quatro frases: "O menino já chegou? Eu preciso ver ele"; "O mais diferente de tudo eram as pessoas que passavam por aquela rua"; "Ele chegou e colocou tudo em cima da mesa, depois saiu"; "Não quero falar sobre esse assunto. Podemos conversar amanhã?", expressas em uma intensidade mais saliente (maior intensidade) e em outra mais contida (menor intensidade), metade dos estímulos foram reproduzidos para os participantes com a presença de léxico e a outra parte de maneira deslexicalizada. Foi utilizado o aplicativo TP (Teste/Treinamentos de Percepção) versão 3.1 (Rauber et al., 2012) para a realização do teste perceptivo. Esse software possui uma facilidade de configuração que pode ser feita pela própria pesquisadora e, além disso, os resultados dos testes de cada participante foram fornecidos de modo automático através de planilhas individualizadas. Com base nessas informações, foram elaboradas três planílhas contendo os dados quantitativos gerais dos grupos, uma para cada amostra (SECAISs, SEMIIs e SCs). Esses elementos foram examinados e separados conforme as suas especificidades, delineando 24 etapas de análise: emoções – geral; emoções – alegria; emoções – tristeza; emoções – raiva; lexicalizada – total; lexicalizada – alegria; lexicalizada – tristeza; lexicalizada–raiva; deslexicalizada–total; deslexicalizada–alegria; deslexicalizada–tristeza; deslexicalizada–raiva; maior intensidade–total; maior intensidade–alegria; maior intensidade–tristeza; maior intensidade–raiva; menor intensidade–total; menor intensidade–alegria; menor intensidade–tristeza; menor intensidade–raiva; lexicalizada–maior intensidade; lexicalizada–menor intensidade; deslexicalizada–maior intensidade e deslexicalizada–menor intensidade. Com base nessa proposta metodológica foi constatado que em todas etapas do Teste Perceptivo, ambos os grupos integrados de pessoas com esquizofrenia (SECAISs e SEMIIs) tiveram desempenho inferior ao dos sujeitos controles (SCs). Essa performance foi considerada significativa estatisticamente, com a aplicação do teste-t, em 13 das 24 etapas do teste perceptivo (54,17%) na pesquisa conduzida com os SECAISs e em 15 das 24 etapas (62,50%) do exame feito com os SEMIIs. As etapas que ambos os grupos evidenciaram representatividade estatística foram: emoções-geral, deslexicalizada-total, maior intensidade-total, maior intensidade-alegria, menor intensidade total, lexicalizada-maior intensidade, deslexicalizada-maior intensidade e deslexicalizada-menor intensidade. Enquanto os SECAISs mostraram mais dificuldade nas pistas acústicas que simulavam a raiva, os SEMIIs obtiveram maior embaraço nos estímulos que representavam a alegria. Ambos os grupos de pacientes com esquizofrenia evidenciaram número de acertos inferior aos SCs nas frases lexicalizada. O desempenho dos SECAISs e dos SEMIIs foram ainda mais baixos nos estímulos deslexicalizados. No que se refere à intensidade, os participantes acometidos pela esquizofrenia tiveram pior escore que os SCs nas pistas acústicas que reproduziam as emoções em maior e menor intensidade. Porém, feita a análise intracondições, foi constatado que a condição intensidade só foi representativa para os SEMIIs e para os SCs, os SECAISs não denotaram significância estatística entre os estímulos de maior e menor intensidade. As pesquisas que fundamentaram esta tese possibilitam o entendimento que os indivíduos com esquizofrenia tem dificuldades singulares na percepção e no entendimento prosódico, o que pode auxiliar na consecução de um diagnóstico e de um tratamento mais adequado para essa população.

Palavras-chave: Entoação; Esquizofrenia; Português; Prosódia; Prosódia afetiva.

Autoria: Ana Cristina Aparecida Jorge

Orientação: Waldemar Ferreira Netto

Data da defesa: 26/01/2024

 

Dissterações de Mestrado

Dia internacional da mulher em discursos presidenciais: três tempos em diálogo (2014/2017/2022)

A luta histórica em prol dos direitos da mulher tem o 8 de março como marco em países tanto do Ocidente, quanto do Oriente. Tratar da questão da mulher é um tema de política pública. A busca pela eliminação das variadas formas de desigualdade e de violência de gênero passa necessariamente pelo discurso político. O objetivo desta dissertação é discutir o posicionamento ideológico em torno da mulher e o tratamento dirigido a esse grupo no 8 de março. O enfoque dos enunciados concretos contempla três momentos sócio-históricos: o pronunciamento da ex-presidenta Dilma Rousseff (2014) em rede nacional de rádio e televisão e os discursos dos ex-presidentes Michel Temer (2017) e Jair Bolsonaro (2022) em cerimônia pública. O corpus selecionado seguiu três critérios: i) temporal: 2014 é ano de eleições, em que uma crise econômica começava no país, ao final do primeiro mandato de Dilma, a única mulher a ser presidenta do Brasil. 2017 é ano em que Temer estava recém-empossado da presidência após o impeachment de Dilma deflagrado pelo Congresso Nacional. 2022 é o ano em que Bolsonaro profere um discurso às mulheres, quando esse público o rejeita (como afirmaram as pesquisas eleitorais), devido à constante violência verbal com que se dirige a elas. ii) Espacial: discursos presidenciais proferidos no Palácio da Alvorada ou no Palácio do Planalto, sede do Governo Federal em Brasília. iii) Posicionamentos sócio-políticos: a ex-presidenta e os ex-presidentes assumem posicionamentos partidários distintos. A análise fundamenta-se em base teórico-metodológica dos conceitos bakhtinianos: i) enunciado concreto; ii) gêneros do discurso; iii) ideologia; iv) verbo-visualidade; v) discurso alheio; vi) heterodiscurso. O pronunciamento de Dilma e o discurso de Temer e de Bolsonaro se diferenciam em construção ideológica evidenciada no discurso alheio e na verbo-visualidade. Três resultados se destacam: i) Dilma Rousseff fala para a câmera, suas interlocutoras são "especialmente" as mulheres, as "queridas brasileiras", enquanto Temer saúda "indistintamente a todos" que estão na cerimônia e Bolsonaro fala para os "senhores militares" presentes; ii) Dilma aborda políticas públicas para a ascensão social da mulher de periferia, por meio de sua formação e profissionalização, de modo que ganhe independência financeira e saia do ciclo da violência doméstica; já tanto Temer, quanto Bolsonaro relacionam a mulher com ser mãe, esposa e dona de casa. Temer assume um posicionamento ideológico sexista ao atribuir as responsabilidades do cuidado somente à mulher e não ao homem, como fazer compras no supermercado e educar os filhos; Bolsonaro assume um posicionamento machista ao defender a mulher como submissa ao homem e auxiliadora dele, ou auxiliada por ele; iii) o uso do terninho na cor azul claro representa serenidade, traduzindo o tom da ex-presidenta Dilma diante da crise econômica: passar tranquilidade para as brasileiras, encorajando sua ascensão social. No discurso do ex-presidente Temer, o azul no cenário e no vestido da Primeira-Dama recupera o logotipo do governo. Quanto ao ex-presidente Bolsonaro, o uso da cor rosa no cenário, na sua gravata e na roupa das mulheres em seu redor retoma o posicionamento contrário à "ideologia de gênero" e a favor de uma única possibilidade de ser mulher: cisgênero, heterossexual, mãe, esposa.

Palavras-chave: Dia Internacional da Mulher; Discurso político; Discurso presidencial; Enunciado concreto; Ideologia.

Autoria: Larissa Vieira de Cerqueira

Orientação: Maria Inês Batista Campos

Data da defesa: 16/12/2024

A pena do condor: estudo filológico e edição de manuscritos de Castro Alves

O poeta Castro Alves é um símbolo da literatura nacional engajada, sobretudo em relação à libertação do povo escravizado, no Brasil. Exemplo da poesia e propaganda abolicionista no Brasil do final do século XIX, a obra de Castro Alves foi amplamente editada ao longo dos anos, a maior parte, postumamente. A presente dissertação reuniu, revisou, comparou e estudou sob o ponto de vista da filologia, a fim de transcrever e apresentar um conjunto de manuscritos autógrafos do poeta baiano Antônio Frederico de Castro Alves. O corpus de manuscritos autógrafos é composto por um códice, que contém as obras poéticas A Cascata de Paulo-Affonso, República de Palmares e Versos improvisados, e os manuscritos da correspondência ativa de Castro Alves. Apresentamos uma discussão sobre a multiplicidade de concepções do conceito de filologia com base nos pressupostos de Toledo Neto (2020); Ferreira (2014; 2021); Spina (1977); Cambraia (2005), Castro (1992), Silva (1994; 2002); Monte (2008; 2015). Apresentamos, neste trabalho, a contextualização histórica dos manuscritos, estudo paleográfico baseado nos postulados de Contreras (1994), Marquilhas (2000), estado de língua dos textos, estudo codicológico amparado pelos trabalhos Cambraia (2005), Monte (2008), Tuy e Paixão (2021), além dos fac-símiles dos manuscritos autógrafos originais juntos da transcrição e edições semidiplomáticas do corpus. Apresentamos os fac-símiles dos manuscritos autógrafos acompanhados da transcrição e edição semidiplomática do texto, que visou desenvolver aspectos como abreviaturas, corrigir possíveis erros de escrita, apontar rasuras nos manuscritos, mas que ainda assim conserva o texto original e proporciona uma edição fidedigna e próxima à derradeira vontade do autor. Para a preparação das edições semidiplomáticas foram feitos estudos filológicos, de crítica textual e ecdótica a fim de aproximar a edição dos manuscritos o mais próximo possível dos manuscritos autógrafos escritos por Castro Alves, preservando, assim, a derradeira vontade do autor.

Palavras-chave: Correspondência; Crítica textual; Filologia; Literatura; Manuscritos.

Autoria: Kelly Cristina Rufino

Orientação: Vanessa Martins do Monte

Data da defesa: 04/11/2024

Museu da Pessoa: lembranças e deslembranças na construção da noção de pessoa

Este trabalho investiga a construção de uma memória ao estudar o Museu da Pessoa, museu digital que coleta, armazena e apresenta histórias de vida como objetos museológicos. A motivação desta pesquisa é a de compreender a extensão do próprio nome do museu e a que realidade se refere a palavra "pessoa" na composição desse nome. Dessa pergunta, informada inicialmente pela noção de memória coletiva de Halbwachs (2003), formula-se a hipótese de que a pessoa que contribui para a construção de uma memória no museu tem a sua própria memória determinada pela memória coletiva. Para o estudo, é eleita como fundamentação teórica a Análise do Discurso francesa, consideradas as contribuições pontuais advindas da Análise Dialógica do Discurso e da Teoria da Enunciação (tanto na visão benvenistiana, quanto, sobretudo, na de Authier-Revuz). Da hipótese assim constituída, define-se o objetivo geral da pesquisa: investigar qual a noção de "pessoa" referida no próprio nome do museu. A metodologia parte da consideração do material analisado como contraponto a partir do qual a teoria é posta em ação nas análises. Portanto, para atender ao objetivo de investigar a noção de "pessoa" presente no Museu da Pessoa, partimos de uma leitura do material que, informada pela teoria, busca desemaranhar a noção de pessoa por meio de regularidades que, provenientes do material, se articulem com o tipo e a concepção do museu - por exemplo, sua natureza digital e a interação particular proposta com os visitantes - e com a história de sua formação, particularmente sua relação com a disciplina de história. Os resultados marcam a produtividade da relação entre lembrança/deslembrança, presente nas histórias de vida e na construção da noção de pessoa. As categorias linguístico-discursivas, que a metodologia faz erigir das próprias histórias, mostram que, ao lado do conhecimento manifesto de uma memória, outra dimensão social, histórica e ideológica, não (abertamente) manifesta, constitui a pessoa a que se tem acesso nas histórias de vida do Museu da Pessoa.

Palavras-chave: Deslembrança; Discurso; Lembrança; Memória; Museu da Pessoa; Pessoa.

Autoria: Leonardo Gonçalves de Lima

Orientação: Manoel Luiz Gonçalves Corrêa

Data da defesa: 10/09/2024

Edição e estudo filológico da obra Direitos das mulheres e injustiça dos homens, de Nísia Floresta

Durante muito tempo, a obra Direitos das Mulheres e Injustiça dos Homens, publicada por Nísia Floresta Brasileira Augusta pela primeira vez em 1832, na cidade do Recife, foi considerada uma tradução do texto A Vindication of the Rights of Woman (1792), de Mary Wollstonecraft. O próprio livro brasileiro conduz a essa interpretação, visto que, junto ao seu título, consta a informação "por Mistriss Godwin" – o sobrenome de casada da feminista inglesa –, além das expressões "direitos das mulheres" e "tradusido livremente do francez para portuguez". Tal interpretação, no entanto, foi parcialmente modificada quando Constância Lima Duarte publicou uma edição atualizada do texto brasileiro no ano de 1989 e afirmou que o conteúdo da obra seria predominantemente de autoria de Nísia Floresta, após constatar diferenças entre a presumida fonte textual e a tradução. Posteriormente, Pallares-Burke (1995) identificou que o texto nisiano é uma tradução integral de um panfleto originariamente inglês de 1739 intitulado Woman Not Inferior to Man, assinado pelo pseudônimo Sophia - a Person of Quality. Esse panfleto, por sua vez, é constituído de partes significativas da obra de François Poulain de La Barre intitulada De l'Égalité des Deux Sexes (1673). Alguns anos depois, Botting e Matthews (2004) descobriram que a fonte textual utilizada por Nísia Floresta para compor o seu trabalho seria um livro francês publicado por César Gardeton em 1826, cujo conteúdo apresenta uma tradução francesa do panfleto de Sophia, e cujo título é Les Droits des Femmes et l'Injustice des Hommes, par mistriss Godwin. Apesar dessas descobertas terem sido divulgadas, as informações sobre o conteúdo da obra brasileira ainda circulam de modo conflitante no espaço público. Surgiu assim a demanda de se comprovar que Nísia Floresta não traduziu Wollstonecraft, tampouco produziu um texto predominantemente autoral. Tornou-se necessário averiguar se o livro de estreia de Nísia Floresta seria uma tradução talvez única em língua portuguesa de um texto inserido na Querelle des Femmes, um longo debate originalmente literário e francês que se expande por outras partes da Europa e ganha contornos filosóficos, iniciado à época do Renascimento. Partindo dessa demanda, esta dissertação tem como objetivo oferecer uma perspectiva filológica ao estudo do livro brasileiro. Como o conceito de filologia é amplo, demarca-se que a perspectiva filológica empregada neste trabalho é a que associa a Filologia à Cultura Material, de acordo com Toledo Neto (2020), delimitando assim, em diálogo com Ferreira (2016), o labor filológico como uma curadoria textual do exemplar da 2ª edição do livro de Nísia Floresta, publicada em Porto Alegre no ano de 1833, que está salvaguardado pela Fundação Biblioteca Nacional (FBN) em seu setor de obras raras. Nesse sentido, o trabalho filológico realizado permitiu a descrição material do exemplar da FBN, por meio de postulados da disciplina filológica denominada como Bibliografia Material formulados por McKerrow (1998) e Gaskell (1999), e da disciplina histórica chamada História do Livro, de acordo com Sordet (2023), além do oferecimento de duas inéditas edições do texto brasileiro: a edição diplomática acompanhada do fac-símile e a edição semidiplomática acompanhada do original francês.

Palavras-chave: Bibliografia Material; Crítica Textual; Curadoria Textual; Direitos das Mulheres e Injustiça dos Homens; Filologia; Nísia Floresta.

Autoria: Renata Morais Mesquita

Orientação: Vanessa Martins do Monte

Data da defesa: 19/08/2024

“e declarou que ela não tinha senão natura de mulher”: edição digital e análise paleográfica de dois processos inquisitoriais portugueses de sodomia homoerótica feminina do século XVI

Clara Fernandes e Catarina Luís foram processadas pela Inquisição portuguesa, sendo acusadas de sodomia por terem se relacionado sexualmente com mulheres. Catarina o teria feito com apenas uma mulher, enquanto Clara confessou que se envolvera com quatro. Visando contribuir com o estudo do homoerotismo feminino, a presente dissertação tem como objetivo principal as edições digitais (diplomática, semidiplomática e modernizada) por meio do eDictor (Paixão de Sousa; Kepler; Faria, 2013) do "Processo de Clara Fernandes" e do "Processo de Catarina Luís", bem como a disponibilização dos mesmos online em um website elaborado para esse fim. As edições e a análise do material seguem os preceitos da Filologia e de suas disciplinas afins. Destacam-se as análises paleográficas dos processos, já que os punhos que os escreveram possuem marcas de hibridação entre as grafias Gótica e Humanística, o que foi cautelosamente descrito. Por serem os únicos processos inquisitoriais de sodomia homoerótica feminina em Portugal atualmente conhecidos e por termos acesso a poucos casos de atos sexuais entre mulheres no amplo período em que o pecado nefando foi crime para a Justiça Secular, sendo também julgado pelas Justiças Eclesiástica e Inquisitorial, as edições são um meio de tornar os processos acessíveis a pesquisadoras e pesquisadores, bem como a um público mais amplo, para renovar a compreensão da história, por meio das evidências presentes nos documentos.

Palavras-chave: Edição digital; Filologia; Homoerotismo feminino; Inquisição; Século XVI; Sodomia.

Autoria: Mariana Lourenço Sturzeneker

Orientação: Vanessa Martins do Monte

Data da defesa: 31/07/2024

Verbos-suporte como transpositores de processos: Fazendo uma análise de construções-suporte na legendagem e na dublagem para o português da série italiana Il Processo

Esta dissertação tem por objetivo descrever as construções com verbos-suporte e compreender o emprego dessas em contextos argumentativos, em especial aquelas construções-suporte com os verbos "fazer" e "dar". Com a finalidade de cumprir os objetivos postos, adota-se uma perspectiva sociocognitivista, atrelada às teorias de cunho funcionalista e cognitiva, a qual permite interpretar a linguagem como representação da mente do outro, e, simultaneamente, vincular função ou funções a estruturas da língua. As construções com verbos-suporte aqui encontradas estão inseridas em textos orais e escritos da série italiana Il Processo (2019) – seu áudio original, legendas em língua italiana, legendas em língua portuguesa e dublagem também em português. Dentro da perspectiva sociocognitivista, o objeto de estudo desta dissertação foi manejado sobretudo pelo conceito de transitividade, que expressa a representação das informações de sentenças e, consequentemente, a representação também das experiências individuais ou sociais, a ótica de quem usa a língua/linguagem. Dessa maneira, compreende-se que as construções com verbos-suporte expressam uma remodelagem de processos que, por vezes, podem ser expressos por verbos simples. Portanto, os verbos-suporte em foco, "fazer" e "dar", atuam como "transpositores" de processos, conferindo às construções maior materialização/ materialidade/ concretude. Na argumentação, as construções com verbos-suporte tendem a sustentar argumentos base, sendo, por essa razão, relevantes na condução da fala e escrita incisiva a serviço da argumentação uma vez que atribuem aos argumentos particularidades antes inacessíveis em construções com verbos simples.

Palavras-chave: Argumentação; Transitividade; Verbos-suporte.

Autoria: Grazielle dos Reis Barbosa de Souza

Orientação: Maria Célia Pereira Lima Hernandes

Data da defesa: 19/07/2024

Transmissão de Frases Feitas, de João Ribeiro: uso de ferramentas digitais para colação automática

Este trabalho tem por objetivo a identificação e classificação das variantes substantivas da obra Frases Feitas, de João Ribeiro, a fim de verificar como a transmissão do texto ao longo do tempo o modificou. A tradição dessa obra é composta por quatro edições. A primeira edição, em dois volumes, de 1908 e 1909, foi editada pela Livraria Francisco Alves. A segunda edição foi publicada em 1960 pela mesma editora, em volume único. Em 1984, a editora Sercore publicou a terceira edição, cujo texto corresponde ao primeiro volume da obra. Em 2009, a Academia Brasileira de Letras publicou outra edição, que considerou ser a terceira, baseandose na segunda edição da Livraria Francisco Alves. A primeira edição foi publicada sob a supervisão do autor, enquanto as demais, postumamente. O texto da segunda edição foi revisado pelo autor, mas publicou-se apenas vinte e seis anos após sua morte, em edição comemorativa de seu centenário, organizada por seu filho Joaquim Ribeiro. Essa edição possui vários problemas de revisão, no entanto é a redação mais acessível ao leitor, por ter sido reproduzida recentemente pela ABL em formatos físico e digital. O estudo da recepção e transmissão desse texto ampara-se no escopo teórico-metodológico da Filologia, entendida como Crítica Textual, e da Bibliografia Material, discutindo as especificidades do livro impresso como material de estudo e a necessidade de nomenclatura para a tipologia das lições variantes de textos impressos, levando em consideração suas especificidades. Para isso, discutiu-se a pertinência da tipologia proposta por Blecua (1983) para a classificação de lições variantes em textos modernos impressos. No que diz respeito à recepção da obra, explorou-se o contexto em que cada edição foi produzida. Realizou-se a colação dos testemunhos por meio do programa CollateX, que revelou 172 casos de adição na segunda edição, 57 omissões, 36 alterações de ordem e 59 reelaborações. Apesar da menor frequência, as alterações de ordem têm mais impacto na modificação do texto do que as omissões, pois estas últimas são consequências da primeira.

Palavras-chave: Frases Feitas; Bibliografia Material; Colação automática; Crítica Textual; João Ribeiro.

Autoria: Thiago de Santana Silva

Orientação: Phablo Roberto Marchis Fachin

Data da defesa: 03/07/2024

Edição e estudo filológico de cartas do Rev. Robert Reid Kalley (1842-1876)

A presente pesquisa de mestrado tem como objetivo apresentar a edição conservadora e o estudo filológico de cartas escritas em língua portuguesa pelo Reverendo Robert Kalley, escocês, entre os anos de 1842 e 1876. O Reverendo teve, com o apoio e participação de sua esposa, Sra. Sarah Poulton Kalley, a incumbência de propagar a palavra divina em solo brasileiro, acabando por assim organizar, em 1858, a Igreja Evangélica Fluminense (IEF), primeira Igreja Evangélica protestante a realizar seus cultos em língua portuguesa em território nacional. Este trabalho é orientado pela perspectiva filológica, conforme discutido em Toledo Neto (2018, 2020). O estudo filológico assenta-se, sobretudo, no exame paleográfico e na descrição material dos documentos. Para situar esta pesquisa e seu objeto de estudo, narra-se brevemente o papel de uma filóloga-documentalista em exercício num período pandêmico. A parte histórica baseia-se em autores como Porto Filho (1987), Cardoso (2005, 2022), Forsyth (2006) e Rocha (2013). Os resultados desta dissertação podem contribuir para a escrita da história do Congregacionalismo no Brasil, tendo em vista que a publicação dos documentos escritos pelo seu pioneiro em terras brasileiras constitui uma forma de preservar e divulgar essa documentação, e para pesquisas interessadas na aquisição da língua portuguesa como L2 em sincronias pretéritas.

Palavras-chave: Cartas do século XIX; Congregacionalismo; Edições filológicas; Estudo filológico; Robert Reid Kalley.

Autoria: Maria Elisa Lima de Souza

Orientação: Vanessa Martins do Monte

Data da defesa: 21/06/2024

Análise léxico-estilística de O amor dos homens avulsos, de Victor Heringer

O trabalho investiga a estilização de três temas do romance O amor dos homens avulsos, de Victor Heringer (2016) por meio de recursos léxico-semânticos empregados pelo autor. Para isso, parte das contribuições de Jakobson (2005[1960]; 1973; 1978) sobre a autonomia do código verbal nas obras literárias, o conceito de literariedade e as funções da linguagem, e da proposta de Riffaterre (1971; 1989) de aproximação estrutural do texto literário, que reorganiza e amplia os pressupostos teóricos de Jakobson (2005[1960]; 1973; 1978). A descrição da expressividade formal de recursos de estilo lexicais, morfofonológicos e morfossintáticos e a análise dos efeitos de sentido resultantes desses recursos buscou o sistema simbólico construído pelo autor na obra por meio da repetição de traços semânticos e estilísticos e da interrelação entre eles, com base nos fundamentos da Estilística Lexical e Morfológica (LAPA, 1975; CÂMARA JR., 1978; CARDOSO, 2013; 2018; 2019; MARTINS, 2012; RIFFATERRE, 1971; 1989; JAKOBSON, 2005[1960]; 1978 e VANOYE, 1991). Metodologicamente, o estudo se orientou por três etapas. Primeiro, foram selecionados trechos do romance que abordam três temas recorrentes no romance: a avulsão dos personagens centrais (Camilo e Cosme), a infância e a violência. Em seguida, foi realizada uma análise dos procedimentos estilísticos encontrados em cada trecho. Nessa etapa, examinou-se como a expressividade no texto foi obtida por meio de recursos léxico-semânticos, morfofonológicos e sintáticos, como categoria gramatical, composição e flexão das palavras, uso de sinônimos, antônimos, parônimos e linguagem figurada (metáfora, metonímia, hipérbole, eufemismo, ironia etc.). Por fim, foram identificados, em cada trecho e na comparação entre eles, movimentos estilísticos que caracterizem o romance como um todo e traços semânticos e estilísticos reiterados que funcionam como possíveis canais interpretativos para a obra. Na análise do primeiro eixo temático, observou-se que na descrição do narrador sobre si mesmo há grande uso de unidades lexicais depreciativas, vocabulário representativo do grotesco, construções hiperbólicas e campos lexicais centrados sobre as ideias de morte e fragilidade. Ao contrário, a descrição de Cosme revelou-se vinculada a campos lexicais que representam as ideias de vida, movimento e força. Na análise do segundo eixo temático, destacaram-se, como principais procedimentos estilísticos que representam uma visão de mundo infantil, a neologia, sintática e onomatopaica, e o uso de sufixos diminutivos. No terceiro eixo de análise, a violência é estilizada, sobretudo, pela mobilização de campos lexicais em oposição, que perfazem uma visão dicotômica entre o homem em estado puro, violento, e em estado castrado, obrigado a conviver em sociedade. Nesse último eixo, verificamos que o estilo resignado do narrador dá lugar à revolta num longo parágrafo que destoa estilisticamente de todo o restante da narrativa e inverte os sistemas simbólicos construídos até então na obra. Com isso, concluiu-se que o estilo da obra varia entre diferentes registros, como melancolia e ironia bem-humorada, resignação e revolta, linguagem adulta e linguagem infantil, elementos que se alinham à oscilação que funda o gesto de escrita do romance, isto é, o olhar em direção ao passado e ao futuro e os vaivéns da memória.

Palavras-chave: Estilística estrutural; Estilística léxica; Estilística morfológica; O amor dos homens avulsos; Victor Heringer.

Autoria: Isadora Lemos Gomes de Plato

Orientação: Elis de Almeida Cardoso Caretta

Data da defesa: 29/05/2024

A criatividade lexical em portais do Twitter: um estudo neológico

Este trabalho cumpre o objetivo de estudar o léxico empregado pela comunidade consumidora de portais de cultura pop, presentes na rede social Twitter, observando como os elementos dessa cultura influenciam o modo de falar desses usuários, que recorrem, principalmente, à utilização de neologismos. Sendo assim, selecionamos três portais focados em cultura pop para compor o corpus deste estudo - @bchartsnet, @siteptbr e @updatecharts -, de onde retiramos 64 lexias, publicadas entre os anos de 2016-2024. Como aspectos metodológicos, foram utilizados os dicionários Ferreira (2009) e Houaiss Eletrônico (2009), para a conferência de significado das lexias coletadas, através da percepção da palavra ou do seu significado como novas, método utilizado por Sablayrolles (2010). Para a realização deste estudo, apoiamo-nos nas teorias a respeito do processo de formações de palavras neológicas (CARVALHO, 1987; CABRÉ, 2002; ALVES, 2004; BOULANGER, 2010 etc.), que nos permitiram compreender e realizar a análise dos dados, em conjunto com os conhecimentos relativos à linguagem da internet e à cultura pop, o que possibilitou o entendimento da dinâmica que subjaz à criatividade lexical da comunidade estudada.

Palavras-chave: Léxico; Lexicologia; Neologia; Neologismo; Twitter.

Autoria: Bianca Cerqueira Pereira

Orientação: Ieda Maria Alves

Data da defesa: 23/05/2024

O corpo feminino no espaço e no tempo: uma análise comparativa de propagandas das décadas de 1970 e de 2010 no Brasil e na França

O objetivo desta dissertação é investigar as mudanças na imagem da mulher e de seu corpo em anúncios publicitários de duas línguas/culturas. Os conceitos de enunciado, signo ideológico e gênero do discurso elaborados pelo Círculo de Bakhtin guiaram a análise dos reflexos e refrações de um fenômeno social em transformação em anúncios publicitários: a imagem feminina no tempo e no espaço. Foi realizada uma análise comparativa de um corpus de vinte anúncios divididos em propagandas do Brasil e da França, das décadas de 1970 e de 2010. A comparação revelou que, na década de 1970, a mulher e seu corpo eram vistos nos anúncios de ambos os países de maneira desigual em relação ao homem, o que condiz com o contexto político e social autoritário e conservador do Brasil à época, mas contrasta com meio mais progressista e contestador da tradição presente na França no mesmo período. Na década de 2010, a inferiorização da imagem da mulher nos anúncios diminui significativamente em ambos os países, mas a França a coloca em uma posição mais transgressora do que o Brasil, o que está em consonância com o momento socio-político brasileiro, que contou com um regime de extrema direita nesta década, diferentemente do que ocorreu na França. A publicidade do corpus selecionado não pareceu acompanhar de forma intensa, em 2010, as pautas feministas em voga na mídia dessa época.

Palavras-chave: Análise comparativa; Anúncio publicitário; Brasil; Década de 1970; Década de 2010; França; Imagem da mulher.

Autoria: Letícia Thomé de Oliveira

Orientação: Sheila Vieira de Camargo Grillo

Data da defesa: 14/05/2024

Metáforas de futebol: análise crítica da metáfora e representação nos protestos em torno do impeachment de Dilma Rousseff

A partir da Análise Crítica do Discurso (FAIRCLOUGH, 2003; RAMALHO; RESENDE, 2016), esta dissertação objetiva apresentar nossa análise de como o jornal Folha de S. Paulo identifica/representa por meio de metáforas de futebol (torcedor, Copa do Mundo, Seleção Brasileira de Futebol, gol, time etc.) os manifestantes favoráveis ou contrários ao impedimento de Dilma Rousseff, participante dos principais protestos populares realizados durante a votação da abertura do processo de impeachment na Câmara dos Deputados; é objetivo dela também apresentar uma análise do uso de metáforas futebolísticas na contextualização do processo de impeachment, partindo da conceptualização metafórica da política como futebol. Além de construtos da Análise Crítica do Discurso, para a análise e a interpretação metafórica, utilizamos construtos da Teoria da Metáfora Conceptual (LAKOFF; JOHNSON, 2002 [1980]), da Análise Crítica da Metáfora (CHARTERIS-BLACK, 2004), da Teoria da Mesclagem (FAUCONNIER; TURNER, 2002) e dos estudos cognitivo-discursivos da metáfora, principalmente a concepção de metáfora situada (VEREZA, 2007; 2013; 2016). Para investigação dos efeitos retórico e argumentativo, empregamos a concepção de dimensão argumentativa do discurso (AMOSSY, 2011; 2018), a alusão como elemento criador/confirmador de comunhão (PERELMAN; OLBRECHTS-TYTECA, 2014 [1958]), além de nos guiarmos por discussões de orientação sociológica sobre o futebol no Brasil (MURAD, 2007; DAOLIO, 1998; BRINATI, 2014; BARRETO, 2014; RODRIGUES, 2002), sobretudo a identificação do Brasil e do brasileiro a partir do futebol e da Seleção Brasileira de Futebol. Constatamos no uso das metáforas futebolísticas viés ideológico, potencializando sentidos que reforçam pontos de vista particulares capazes de estabelecer e sustentar relações de poder (THOMPSON, 1995), potencialmente criadoras e mantenedoras de hegemonias, que se constituem – entre outras estratégias – de geração de consentimento (FAIRCLOUGH, 2003; 2016), culminando em um enquadramento valorativo dos manifestantes pró-impeachment, em detrimento dos manifestantes anti-impeachment.

Palavras-chave: Análise crítica do discurso; Folha de S. Paulo; Futebol; Impeachment; Metáfora.

Autoria: Ricardo Soares Dantas

Orientação: Maria Lúcia da Cunha Victório de Oliveira Andrade

Data da defesa: 08/05/2024

Disputas na terra, no prato e nas ideias: o agronegócio e a fome no Brasil (2019-2022) em perspectiva ecolinguística stibbeana

Em 2014, o Brasil protagonizou manchetes de diversos jornais por ter saído do chamado Mapa da Fome, da Organização das Nações Unidas (ONU). Apenas alguns anos depois, a própria fome é que mais uma vez assumia a centralidade das notícias. Especialmente no período de 2019 a 2022, marcado por uma gestão presidencial neoconservadora e pela pandemia global de COVID-19, os dados chegaram a indicar que 58,7% da população teria enfrentado algum tipo de insegurança alimentar. Paralelamente a isso, e diante da aparente contradição entre essas informações e os expressivos lucros do agronegócio, ideologicamente situado como a base da produção alimentícia do país, alguns discursos emergem para (I) conceituar a fome; (II) explicar as razões de sua existência; (III) propor soluções para resolver esta questão. Diante desses eixos que conduziram o debate, mobilizamos um conjunto de artigos publicados no período por portais em dois polos aparentemente distintos: do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), que perspectiva a discussão a partir da produção alimentícia agroecológica, e da seção Agro do portal G1, que tematiza a fome e a produção de alimentos sob uma ótica mais alinhada à agroindústria. Objetivamos, por meio da análise, depreender: (1) as relações de poder estabelecidas nesses discursos e (2) os recursos linguístico-discursivos adotados para a construção e para a sustentação de cada polo. Para isto, pautando criticamente o debate sobre a fome e a produção de alimentos no referido período, mobilizamos um quadro de categorias de análise que partem do arranjo metodológico da Ecolinguística (STIBBE, 2015). Partimos das categorias metáfora, com acréscimo de um instrumental mais orientado ao discurso (GONÇALVES-SEGUNDO, 2020; VEREZA, 2007), avaliação, identidade, convicção e apagamento, apreendendo a construção semântico-discursiva desses posicionamentos e articulando-os com a teoria sociológica (MARX & ENGELS, 2016; MARX, 2013; LUKÁCS, 2016; entre outros). Posteriormente, como procedimento metodológico stibbeano, valoramos o possível impacto desses discursos na realidade com base em uma ecosofia construída com base no trabalho de Saito (2021). A partir da conexão entre elementos linguísticos e sociológicos, identificamos pontos de convergência e de divergência nos discursos em questão para cada um dos eixos. No caso do eixo (I) conceituação da fome, além da indisponibilidade absoluta de alimentos, a ausência de pratos preenchidos com itens que supram as demandas nutricionais dos organismos ganha importância. Notamos a centralidade da crítica aos chamados alimentos ultraprocessados sobretudo no portal do MST, por meio da mobilização de metáforas distribuídas e situadas e da constituição de identidades conflitantes para os hipernônimos "indústria" e "agricultura familiar". Embora as mazelas ambientais e de saúde pública causadas pelo avanço cada vez maior dessas simulações industriais (NUPENS-USP) apareçam como ponto relativamente pacífico entre os portais, no G1 esse debate responsabiliza menos o modo e as determinações de produção e mais os indivíduos consumidores. Já no eixo (II) explicações para a existência da fome, identificamos justificativas centradas em fatores como produção/distribuição de alimentos e gestão político-econômica, como ausência ou desmonte de políticas públicas, além da constituição de identidades frontalmente antagônicas no tratamento dos produtores rurais nos dois portais; soma-se a isso uma explícita responsabilização de atores públicos no portal do MST, mas apagamento destes no caso do G1. Por fim, no eixo (III) soluções para o problema da fome, a discussão foi permeada por apontamentos de teor produtivista ou tecnocrata, em que os portais se posicionam em polos absolutamente contrários através da mobilização de metáforas distribuídas e apagamento de condições de produção e da natureza, práticas mais individualizadas como mecanismos de solidariedade e identidades centradas em "nós vs. eles", além do debate territorial e de poder sobre a terra, permeado também por identidades e apagamentos.

Palavras-chave: Alimentação; Ecolinguística; Fome; Marxismo.

Autoria: Amanda Guedes Mazza

Orientação: Paulo Roberto Gonçalves Segundo

Data da defesa: 02/05/2024

Diário político de Caio Prado Jr.: de arquivo pessoal a fonte documental

Essa dissertação apresenta o estudo do Diário político 1 de Caio Prado Jr., documento manuscrito localizado no arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da Universidade de São Paulo, escrito entre 1935 e 1936. O principal objetivo da pesquisa é a análise filológica do Diário, particularizado no contexto em questão, da sua escrita, da história do documento, do seu suporte e de como cada uma dessas partes contribui para o Diário ser utilizado como fonte de pesquisa documental. O Diário é apresentado em todas as suas particularidades: material, formal, de conteúdo e contexto de produção, com vistas a disponibilizá-lo como fonte fidedigna para os trabalhos sobre a vida e a obra de Caio Prado Jr. Apresentam-se a edição completa do conteúdo manuscrito - além do conteúdo impresso - as pessoas citadas e a discussão sobre sua composição. Trata-se de pesquisa em interface entre Filologia e ciências afins, entre elas, Paleografia, Diplomática, além de História, Política e Cultura Material. O documento, nesse sentido, é considerado não apenas como base de informações para levantamentos históricos e/ou biográficos, mas como próprio objeto de estudo. Conclui-se o estudo com a distinção do diário como fonte documental plena e autônoma.

Palavras-chave: Caio Prado Jr.; Diário político; Filologia; Fonte documental.

Autoria: Maria Eugenia Duque Caetano

Orientação: Phablo Roberto Marchis Fachin

Data da defesa: 30/04/2024

O sistema ideofônico da língua guineense

A dissertação em questão se concentra na descrição e análise do sistema ideofônico na língua crioula de Guiné Bissau, denominada guineense neste estudo. Este sistema é dividido em dois subsistemas: um expressivo e outro de integração gramatical. No subsistema de integração gramatical, os ideofones guineenses são analisados como elementos morfossintáticos marcadores de 'foco', revelando semelhanças com os ideofones de línguas faladas em Guiné Bissau como balanta, mandinga, papel e fula. A dissertação está dividida em cinco capítulos, além da introdução e da conclusão; cada capítulo contribui para os objetivos específicos do estudo. O segundo capítulo fornece informações sobre Guiné Bissau, seu contexto sócio-político e linguístico. Os objetivos do terceiro capítulo incluem a categorização dos ideofones e do foco conforme a literatura especializada, apresentando-se também a descrição da metodologia utilizada para a pesquisa. No quarto capítulo, atesta-se uma visão geral dos ideofones no guineense com base na definição assumida em Dingemanse (2011), apresentando ainda uma revisão de estudos sobre ideofones em guineense. O quinto capítulo detalha a proposta de descrição e análise dos ideofones guineenses subdivididos em ideofones [+ expressivos] e [+ integração gramatical]; esta subdivisão segue, em parte, o estudo de Dingemanse & Akita (2017).

Palavras-chave: Guineense; Ideofones expressividade; Ideofones integração gramatical; Marcação morfossintática de foco; Sistema ideofônico.

Autoria: João Eusébio Imbatene

Orientação: Márcia Santos Duarte de Oliveira

Data da defesa: 16/04/2024

O desenvolvimento da competência lexical no componente curricular Língua Portuguesa para os anos finais do Ensino Fundamental: documentos norteadores da Educação Básica no Brasil, livros didáticos e proposta de aplicação em sala de aula

Historicamente, o ensino do léxico em Português - Língua Materna (PLM) priorizou a análise do significado das unidades lexicais por meio de atividades com listas de palavras e suas relações semânticas, como sinonímia, antonímia e ambiguidade. Entretanto a abordagem dos aspectos semânticos, gramaticais e discursivos das unidades lexicais deveria ser o centro das atividades de ensino de vocabulário. Com base em princípios da Lexicologia e da Semântica Lexical (BIDERMAN, 1978; POLGUÈRE, 2018; ULLMANN, 1964) e dos estudos sobre ensino-aprendizagem do léxico (ANTUNES, 2012; LEFFA, 2000; NATION, 2003; RICHARDS, 1976), nesta dissertação, analisam-se os dois principais documentos norteadores da educação básica brasileira, os Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1998) e a Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2018), e dois livros didáticos de Português voltados a alunos do 9º ano: Português: conexões e usos (DELMANTO, CARVALHO, 2018) e Teláris Essencial: Português (TRINCONI, BERTIN e MARCHEZI, 2022). Complementam-se essas análises com propostas de atividades de leitura e de produção de textos para desenvolver a competência lexical dos estudantes. Nos PCN, embora se reconheça a importância do estudo do léxico para a ampliação da competência discursiva dos estudantes, ele está atrelado à categoria de "prática de análise linguística", sendo dissociado das práticas que envolvem a escuta de textos orais, a leitura de textos escritos e a produção de textos orais e escritos. De maneira semelhante, na BNCC, nos objetivos, ressalta-se a relevância da análise contextual no estudo do léxico. Todavia, o léxico não é um objeto de estudo em si, já que a referência a ele está no complemento da habilidade. Na análise das seções de leitura dos livros didáticos, observa-se que, em "Português: Conexão e Uso", há um número maior de atividades voltadas ao estudo do léxico em comparação com "Teláris Essencial: Português". Ademais, enquanto, na primeira obra, o léxico é abordado em diversos campos; em "Teláris", é tratado principalmente no campo artístico-literário. Quanto às dimensões da competência lexical, em ambos os livros didáticos analisados, é enfatizada a dimensão semântica, há pouca profundidade na abordagem da dimensão gramatical, e a discursiva é tratada superficialmente. Nas atividades de produção de textos, enfatiza-se ainda menos o léxico nas duas obras. Com essas análises, identificaram-se lacunas no que se refere ao ensino proposto para o desenvolvimento da competência lexical dos estudantes. Por isso, apresentam-se, neste trabalho, atividades com abordagem contextualizada e considerando a pluridimensionalidade do léxico. Foram elaboradas uma proposta de análise do conto Olhos dÁgua, de Conceição Evaristo, e uma de produção de um conto autobiográfico. Na dimensão semântica, enfatizam-se atividades sobre o entendimento e o emprego de metáforas e de palavras de um mesmo campo lexical. O uso de estruturas gramaticais e os significados obtidos com o emprego de determinados modos e tempos verbais são enfocados no tratamento da dimensão gramatical. A dimensão discursiva é abordada através do estudo de elementos sócio-histórico-culturais materializados nas escolhas lexicais. Espera-se que esta dissertação possa contribuir para o aperfeiçoamento dos materiais didáticos de PLM e para que os professores incrementem o trabalho com o livro didático.

Palavras-chave: Competência lexical; Ensino e aprendizagem de vocabulário; Lexicologia; Português - língua materna.

Autoria: Fernanda Rodrigues Baruel

Orientação: Beatriz Daruj Gil

Data da defesa: 04/04/2024

Fake news, desinformação e narrativas antivacina nas redes sociais durante a pandemia de Covid-19 no Brasil

A proposta deste trabalho é analisar os discursos das publicações de um grupo de médicos em suas redes sociais sobre a pandemia do coronavírus (Covid-19) e a vacinação no Brasil, bem como os comentários feitos por seguidores sobre o mesmo tema, buscando entender como a propagação dessas narrativas estão relacionadas às crenças e ao saber comum do público leitor. Para isso, analisaram-se estratégias discursivas e os elementos semióticos usados no discurso digital, levando em conta o contexto cultural, o senso comum e as ideologias presentes tanto nas narrativas dos médicos quanto nos discursos de seus seguidores. Para o cumprimento desses objetivos, é preciso responder a quatro perguntas básicas: (i) Quem é o público a que se dirige o enunciado e quais são as crenças herdadas por eles?; (ii) Como os médicos-autores constroem seus ethos discursivo de autoridade?; (iii) Como a crise de confiança nos meios de comunicação e nas instituições públicas legitimou essas narrativas?; iv) Que impacto a disseminação do discurso negacionista pode causar na sociedade e na saúde pública?. Para que essas perguntas fossem respondidas e o objeto de estudo analisado, buscou-se analisar como as crenças são formadas e passadas de geração em geração e porque alguns costumes culturais para o tratamento de doenças ainda têm mais prestígio que a medicina moderna (Ferreira Netto, 2017). Posteriormente, foram coletadas publicações de médicos em seus perfis do Instagram, analisadas a partir da definição de ethos e das estratégias discursivas (Amossy, 2005), bem como a análise semiótica dos signos presentes nos discursos e sua logicidade (Peirce, 1975) e, ainda, o método de análise da estrutura narrativa de Labov (1997). Além desses conceitos, os elementos digitais, específicos desse discurso, foram incorporados não somente na análise, mas também como itens de reconfiguração da enunciação (Paveau, 2021) e como recursos de ampliação do discurso nativo digital. Os resultados da investigação revelam que a falta de confiança na ciência, nas instituições públicas e na mídia convencional são perspectivas amplamente compartilhadas por uma considerável parcela da população brasileira, que por sua vez, sempre valorizou saberes tradicionais de gerações anteriores. Esse conjunto de fatores, então, encontrou acolhimento nos discursos médicos de alguns profissionais, o que acabou contribuindo para uma onda de discursos negacionistas e antivacina.

Palavras-chave: Covid-19; Desinformação; Discurso digital; Narrativas; Vacina.

Autoria: Marielly Marques Malagoli

Orientação: Waldemar Ferreira Netto

Data da defesa: 08/03/2024

 

 

Defesas no ano de 2023

 

Teses de Doutorado

Estudo do vocabulário do cururu em Cuiabá

Esta pesquisa tem como objetivo geral estudar o vocabulário do cururu na cidade de Cuiabá, propondo uma discussão das influências e contribuições do léxico dessa manifestação cultural. Os corpora desse trabalho são essencialmente constituídos por entrevistas (livres e controladas), produções lítero-musicais e bibliografia sobre o tema. Apoiamo-nos no referencial teórico-metodológico da sociolinguística, da geolingüística, da dialetologia, da lexicografia e da lexicologia, para a realização da pesquisa de campo, elaboração aplicação do questionário semântico-lexical. Como resultado foi possível: i) definir um glossário do cururu cuiabano; ii) desenvolver uma análise diacrônica do conteúdo desse glossário, comparando as acepções das lexias listadas às encontradas em dicionários dos séculos XVII, XVIII, XIX, XX, XXI; iii) estabelecer comparativo com o estudo sobre o cururu realizado por Brito (2013) na cidade de Piracicaba, São Paulo. A investigação permitiu realizar o registro das unidades lexicais dessa manifestação cultural e compreender seu status na cidade de Cuiabá, suscitando uma discussão sobre a tendência à manutenção, variação ou a mudança em curso dos elementos que compõem seu vocabulário. Os resultados alcançados apontam para maior reconhecimento e uso dos itens pesquisados, sendo que as lexias com tendência à manutenção representam 45,09%, contra 37,29% das que apresentaram variação e 17,64% das com tendência ao desuso. A investigação possibilitou compor um corpus linguístico para futuras pesquisas, apresentar uma mostra atual do cururu em Cuiabá, além de traçar um comparativo do cururu praticado em duas regiões do Brasil.

Palavras-chave: Cuiabá; Cururu; Léxico; Pesquisa Dialetal.

Autoria: Mariana Santiago de Brito

Orientação: Manoel Mourivaldo Santiago-Almeida

Data da defesa: 04/12/2023

Escravizados e forca: a (im)parcialidade da justiça no século XIX na perspectiva da Linguística

Esta tese tem por objetivos: (i) apresentar uma edição semidiplomática justalinear de três processos criminais ocorridos na cidade de Campinas nos anos de 1845, 1853 e 1858; (ii) apresentar uma proposta de mapeamento das estruturas de impessoalidade presentes nos processos; apresentar como as estruturas de impessoalidade e outras evidências linguísticas encontradas caracterizam ou não a imparcialidade da justiça perante réus escravizados. A leitura e edição dos documentos manuscritos foram balizadas nos conhecimentos das áreas de Filologia e Linguística Histórica. A análise pautou-se no modelo das Tradições Discursivas, com base em Koch; Oesterreicher (1990) e Kabatek (2006). A análise também levou em consideração aspectos linguísticos-discursivos propostos por Simões; Kewitz (2006, 2009) para os corpora do português brasileiro. Ao todo os três processos e suas respectivas sentenças são compostos por 210 fólios recto e verso que tratam de escravizados acusados e julgados por homicídio e levados à forca, sendo rica fonte de dados históricos, socioeconômicos e, sobretudo, linguísticos graças à variedade de enunciados e punhos que compõem esses processos. Esses processos forneceram importantes dados que ajudaram a mapear características importantes e marcantes de textos da esfera jurídica brasileira no século XIX.

Palavras-chave: Campinas; Escravizado; Filologia; Homicídio; Impessoalidade; Manuscrito; Pena de morte; Processo criminal; Século XIX; Tradições discursivas.

Autoria: Carla Regiane Dias

Orientação: Verena Kewitz

Data da defesa: 01/12/2023

Escolha lexical e ideologia em letras de canção de Anitta

O objetivo deste trabalho é fazer uma análise crítico-discursiva, de acordo com a vertente sociocognitivista do discurso, visando a demonstrar de que maneira as escolhas lexicais, organizadas em campos semânticos, permitem perceber a construção da relação homem-mulher num corpus composto por vinte letras de canção compostas e interpretadas pela cantora Anitta, abrangendo um período de produção entre 2013 e 2019. Para esta pesquisa, partimos da premissa de que todo sistema linguístico traduz a realidade de seus falantes/usuários, permitindo-nos afirmar que o léxico é um sistema aberto ligado ao acontecimento comunicativo. A expansão desse sistema se dará no instante em que determinado momento discursivo for instaurado. É a partir da seleção das lexias que o sujeito enunciador vai demonstrar a sua visão de mundo e apresentar suas experiências socioculturais por meio do discurso. Tendo em vista o caráter discursivo deste trabalho, ainda que lance mão do nível da língua e do nível da norma, o léxico será analisado no nível do discurso. A pesquisa se baseia, teoricamente, em Pottier (1973), Biderman (1978) e Ullmann (1964), para um estudo léxico-semântico das lexias; e em Van Dijk (2003, 2018) para uma análise sociocognitiva do discurso.

Palavras-chave: Campo semântico; Discurso; Letra de canção; Lexia; Léxico.

Autoria: Fabio Ferreira Pinto

Orientação: Beatriz Daruj Gil

Data da defesa: 30/11/2023

Testemunhos autobiográficos no Brasil e na Áustria: uma análise contrastiva de discursos

A presente tese compara autobiografias de testemunho que representam experiências de trauma histórico nas culturas brasileira e austríaca. Partimos do gênero discursivo autobiografia de testemunho como elemento invariável de comparação que permite a aproximação das representações sociais e dos discursos nas respectivas culturas discursivas (von Münchow, 2021). Nosso objetivo central é descrever como o discurso autobiográfico de testemunho representa o trauma histórico e interrelaciona as dimensões individual, familiar e coletiva na sua construção discursiva. Com base no problemático trabalho de memória acerca dos eventos da ditadura civil militar (Teles e Quinalha, 2020) e da Segunda Guerra Mundial (Wodak et al, 1990), observamos como os quadros político-sociais das respectivas culturas são constituídos pelos discursos extremistas que respaldaram o contexto de repressão, autoritarismo e violência. Notamos, portanto, uma expressiva recorrência de escritas de vida que transitam entre formas tradicionais e mais híbridas, seguindo a função ético-moral que constitui o discurso literário. Nossa metodologia parte do diálogo entre a teoria dialógica do discurso (Brait, 2006) e a análise de discursos contrastiva (von Münchow, 2021). Comparamos, então, as construções discursivas das seguintes autobiografias: no subcorpus brasileiro, Ainda estou aqui (2014), Volto semana que vem (2014) e Em nome dos pais (2017), dos autores Marcelo Rubens Paiva, Maria Pilla e Matheus Leitão; e no subcorpus austríaco, Die Welt von Gestern (1942) e weiter leben (1992), dos autores Stefan Zweig e Ruth Klüger. As análises se concentram em três níveis: i) os cronotopos, ii) os gêneros intercalados e iii) a transmissão do discurso alheio. O testemunho autobiográfico no subcorpus brasileiro é constituído por uma variedade de gêneros e pontos de vistas alheios que acentuam a dimensão fatual do relato e cumprem uma função denunciatória, dadas as condições da fase de memória em que as obras são produzidas. O testemunho no subcorpus austríaco, proveniente de uma tradição testemunhal-autobiográfica mais consolidada, fazem referência aos fatos pela perspectiva individual, utilizando gêneros e discursos alheios de forma a apenas ilustrar a posição analítica dominante do discurso autoral. Enquanto o subcorpus brasileiro busca maior aproximação com o contexto primário em que os fatos ocorreram, o subcorpus austríaco marca mais expressivamente a ressignificação do trauma e o presente em que o relato é produzido.

Palavras-chave: Análise de discursos contrastiva; Auschwitz; Autobiografia; Culturas discursivas; Ditadura civil-militar; Escrita de vida; Literatura austríaca; Literatura brasileira; Testemunho.

Autoria: Yuri Andrei Batista Santos

Orientação: Sheila Vieira de Camargo Grillo

Data da defesa: 09/10/2023

A gramática do português brasileiro em funcionamento nos textos produzidos por estrangeiros: uma análise da proficiência a partir da transitividade

Este trabalho analisa, pelo viés da Linguística Funcional, o funcionamento da gramática do Português em produções de textos de falantes de outras línguas que se candidataram ao Exame Celpe-Bras. O construto desse exame e seu percurso histórico é apresentado logo no início, para colaborar com a contextualização que se consolida com exemplos de tarefas e de textos produzidos nas diferentes edições. A descrição do que se analisa é feita a partir dos produtos de três edições do Exame, e com base nos parâmetros definidos por Hopper e Thompson (1980), no que se define como graus de transitividade e planos discursivos. Para verificar se há relação entre esses graus e os diferentes níveis de proficiência avaliados por meio do Exame, utilizamos como referência os conceitos dos campos discursivos "figura" e "fundo", o que também nos possibilita verificar se as diferenças entre os gêneros textuais que resultam dessa produção impactam nos níveis de proficiência medidos pelo Exame. Para analisar como se comporta o plano "fundo" na amostra de textos que compõem o corpus e mapear, nas diferentes produções do mesmo examinando, o grau de influência/produtividade de um determinado input (gênero textual) na construção de sentidos, analisamos o funcionamento dos planos discursivos na construção do discurso que deve cumprir determinados propósitos comunicativos, expressos em diferentes textos. Essa metodologia trouxe como resultado a apresentação de uma proposta de atualização dos parâmetros de avaliação dos textos. Esse recurso pode colaborar também para o aprimoramento da produção dos candidatos ao Exame, assim como para que suas produções sejam avaliadas de forma mais eficiente em relação aos potenciais criativos que conduzem a outras possibilidades de resposta, muitas vezes não consideradas pelos parâmetros atuais.

Palavras-chave: Celpe-Bras; Gramática funcional; Planos discursivos; Português como língua adicional; Proficiência linguística.

Autoria: Rosana Salvini

Orientação: Maria Célia Pereira Lima Hernandes

Coorientação: Gian Luigi de Rosa

Data da defesa: 07/08/2023

Vozes em diálogo: aproximações de práticas sociais e integração pela língua

As demandas oriundas da intensificação dos movimentos migratórios no Brasil têm gerado necessidades referentes ao aprimoramento e à humanização do acolhimento, à ampliação de espaços de pesquisa, de propostas curriculares no ensino de português para migrantes e de formação de professores na área. Nesse sentido, este trabalho, através de relatos de migrantes adultos em um contexto de aprendizagem de português, investiga representações de identidade (re)construídas no Brasil na interação social entre migrantes e brasileiros, tendo como pano de fundo suas práticas sociais. Sob a perspectiva da Linguística aplicada crítica (MOITA LOPES, 2006, 2013; RAJAGOPALAN, 2003, 2006, 2013), partimos da intrínseca relação entre a aprendizagem de língua e a construção da identidade por sujeitos sociais. Dessa forma, os objetivos específicos foram: (i) identificar as representações de aprendentes migrantes face à aprendizagem de português e às relações de interação com os brasileiros, considerando a relação afetiva e subjetiva; (ii) destacar as experiências reveladas no processo de construção de pertencimento, de identidade, de interação e do imaginário de acolhimento em relação ao Brasil e aos brasileiros, em uma relação dialógica entre falantes; (iii) analisar a importância dada à língua no processo de integração social e na vida cotidiana, a partir da perspectiva dos próprios aprendentes. Como representantes de comunidades de fala de migrantes no Brasil, frente a questões no âmbito de língua e de inserção, os desdobramentos das narrativas dos participantes podem contribuir para o aprimoramento de ações políticas linguísticas e sociais em prol da interação da população migrante e do ensino-aprendizagem de língua, a fim de romper com preconceitos e exclusões, assim como para o fortalecimento da área, que enfrenta desafios relativos à formação de professores especialistas e à oferta de cursos.

Palavras-chave: Ensino-aprendizagem; Identidade; Interação social; Língua em contexto de acolhimento; Migração.

Autoria: Ana Cristina Kerbauy Vigar

Orientação: Rosane de Sá Amado

Data da defesa: 12/07/2023

Migração circular como fator de manutenção das línguas de herança entre descendentes de japoneses

A pesquisa discute as peculiaridades da aquisição e manutenção do japonês e do português como línguas de herança (LH). São discutidas as formas de aprendizagem da linguagem até atingir o bilinguismo. Primeiramente, foi realizado um percurso histórico sobre a imigração japonesa no Brasil e, também, considerações sobre a comunidade de trabalhadores brasileiros no Japão. Observa-se que há um fluxo constante entre esses dois países de línguas, radicalmente, diferentes, com a inversão do sentido da imigração que teve início em 1908, podendo ser caracterizada como "migração circular". A chegada de imigrantes japoneses ao Brasil foi interrompida durante a Segunda Guerra Mundial e retomada em 1953. Enquanto, a partir dos anos de 1980 ocorreu o deslocamento no sentido contrário, quando brasileiros descendentes de imigrantes japoneses partiram para o Japão como trabalhadores temporários (decasséguis). Nesse contexto, foi estudada a aprendizagem do japonês e português entre a comunidade de descendentes de imigrantes japoneses no Brasil. Tendo como referência questões da aquisição de linguagem, bilinguismo e Língua de Herança num contexto multicultural, realizou-se uma pesquisa de campo sobre a situação dos descendentes de japoneses e falantes de japonês no Brasil. A metodologia tem como referência a própria vivência da pesquisadora, ao recorrer a uma abordagem autoetnográfica.

Palavras-chave: Aquisição de linguagem; Autoetnografia; Bilinguismo; Japonês no Brasil; Língua de Herança; Linguística Cognitiva; Migração circular
Português no Japão.

Autoria: Patricia Elisa Kuniko Kondo Komatsu

Orientação: Maria Célia Pereira Lima Hernandes

Data da defesa: 30/06/2023

A prosódia do guineense (kriol) e do português falado na Guiné-Bissau: análise de tipos frásicos

A Guiné-Bissau é um dos países africanos de língua oficial portuguesa. Entretanto, essa não é a língua materna e nem a segunda língua mais falada pela população. É o guineense (kriol) que detém o status de língua de identidade nacional e é falado pela maioria da população (seja como língua materna ou como uma daquelas faladas como segunda língua). Diante dessa realidade, questionamos se, do ponto de vista linguístico, podemos assumir que o português falado na Guiné-Bissau seja uma variedade (ainda que em formação) de português. Ante a essa pergunta, levantamos as seguintes hipóteses: (i) o português falado na Guiné-Bissau (doravante PGB) é uma variedade de português em formação já distinta do português europeu (adotado como a norma padrão no país), adquirida como uma segunda língua, e que apresenta traços em comum com as demais variedades ultramarinas de português, nomeadamente as variedades brasileiras e africanas; e (ii) o contato entre a língua guineense (kriol) e a língua portuguesa tem um papel importante na constituição das características prosódicas desse PGB. Para a realização desta pesquisa, utilizamos o aparato teórico da Fonologia Prosódica e da Fonologia Entoacional Autossegmental Métrica. A recolha e análise de dados foi semelhante à utilizada no projeto InAPoP, visando a comparação dos resultados encontrados com aqueles já descritos na literatura para outras variedades de língua portuguesa (variedades de português europeu, brasileiro, santomense, angolano e moçambicano), tendo como foco a descrição e análise das sentenças declarativas neutras, declarativas enumerativas, interrogativas totais neutras e interrogativas parciais dessas duas línguas (guineense e PGB). Para a obtenção de dados que correspondessem a esses tipos frásicos, tanto em PGB quanto em guineense, analisamos dados de fala controlada e fala semiespontânea. Nossos resultados demonstram que, quanto às sentenças declarativas neutras, o guineense e o PGB apresentam alta densidade tonal, alta distribuição de acentos tonais associados ao longo do contorno entoacional, sendo encontrado um acento tonal associado a praticamente todas as palavras prosódicas (PWs) cabeça de sintagma fonológico (PhP), além de um contorno com mudanças melódicas abruptas, especialmente pela configuração H* e !H* dos acentos tonais pré-nucleares, criando um comportamento de "degraus" no contorno entoacional. Os resultados das sentenças enumerativas corroboraram os resultados encontrados para as duas línguas quanto ao contorno nuclear dos sintagmas entoacionais (IPs) não finais de enunciado, além da pausa e do alongamento da sílaba tônica da PW cabeça de IP não final serem pistas relevantes para a marcação de sua fronteira. As sentenças interrogativas totais neutras apresentam comportamentos distintos: enquanto no PGB encontramos picos nas fronteiras esquerda e direita de IP e muitos acentos tonais !H* associados às PWs internas de IP, utilizando a estratégia de redução da declinação e da expansão de registro (comuns a muitas línguas africanas), o guineense utiliza preferencialmente uma estrutura que indique o tipo frásico através da cadeia segmental, além do contorno entoacional apresentar um pico em seu início e seguir num movimento descendente até o contorno nuclear descendente ou baixo, apresentando poucas pistas da distinção entre declarativas e interrogativas totais através do contorno entoacional. Em relação às outras variedades, as interrogativas totais do PGB se assemelham às das variedades africanas de português por PhP ser o domínio prosódico privilegiado para a distribuição de acentos tonais, mas se difere destas ao considerarmos a alternância entre tons altos e baixos, um dos aspectos do macro-ritmo, que é muito forte nas demais variedades africanas e fraca no PGB. Também se diferencia quanto ao contorno nuclear e à densidade tonal das variedades brasileiras (especialmente do nordeste) e das variedades de português europeu, que majoritariamente apresentam o contorno nuclear ascendente, e especialmente de SEP, cujo contorno é descrito como descendente-ascendente, mas se aproxima das variedades brasileiras de português que apresentam o contorno entoacional descendente (variedades do sudeste), embora o PGB apresente, para este tipo frásico, uma densidade tonal muito mais alta do que as variedades brasileiras e um macro-ritmo com menor alternância tonal. Sendo assim, nossos resultados indicam que a prosódia do PGB é diretamente influenciada pelas características prosódicas do guineense quanto às sentenças declarativas neutras, mas que o comportamento prosódico das sentenças interrogativas totais neutras do PGB já aponta para um caminho próprio de sua gramática entoacional, ao divergir do comportamento prosódico apresentado pelas variedades de PE, e que reflete, ao menos em parte, seu multilinguismo local, ao adotar uma estratégia comum às línguas africanas para a diferenciação do comportamento entoacional de sentenças declarativas e interrogativas.

Palavras-chave: Entoação; Fonologia; Guineense (kriol); Português falado na Guiné-Bissau; Prosódia; Variedades de português.

Autoria: Gabriela Braga da Silva

Orientação: Flaviane Romani Fernandes Svartman

Data da defesa: 21/06/2023

Contradizer as palavras: proposta para uma descrição polifônica da noção enunciativa de tensão a partir da análise de incidências do termo 'imprensa' nas lives de quinta-feira de Bolsonaro

Adotando a perspectiva da Linguística da Enunciação, mais precisamente inserida na disciplina da Pragmática Enunciativa, a presente tese tem dois objetivos específicos: identificar e classificar modos de enunciados provocarem tensão sobre concepções, e definir parâmetros de aferição da intensidade da tensão. Definiu-se a concepção de um termo T de uma língua L como tipo especial de ponto de vista, PDVCONCEPÇÃO, atribuído a uma voz coletiva, que relaciona esse termo T a um determinado predicado P, enunciável com a mobilização de outros termos T's dessa mesma língua L. Definiu-se também tensão sobre uma determinada concepção como uma ação empreendida por um enunciado na tentativa de reduzir a força de um T como "argumento em favor de" seu predicado P relacionado a T pela citada concepção. Do ponto de vista teórico, após revisão de teorias que se sucederam à Teoria da Argumentação na Língua (ADL), proposta por Anscombre e Ducrot, e à Teoria Polifônica da Enunciação (TPE), proposta por Ducrot, buscou-se apoio especialmente na Teoria dos Estereótipos (TS), proposta por Anscombre, e na Teoria Escandinava de Polifonia Linguística (ScaPoLine), proposta por Nølke, Fløttum e Norén. Como corpus, foram examinadas 120 incidências da palavra "imprensa" retiradas de 178 transmissões ao vivo por redes sociais feitas por Jair Bolsonaro, nas noites de quinta-feira, durante os quatro anos que esteve na presidência da República, entre 2019 e 2022. Como resultado, os modos de tensão foram classificamos em três agrupamento intercambiáveis entre si. No primeiro deles, constam os modos: (a) Articulação, (b) Outorga, (c) Pressuposição e (d) Rotulação. No segundo agrupamento, constam os modos: (a) Não irônico e (b) Irônico. Já no terceiro agrupamento, constam os modos: (a) Não explicitado como regra e (b) Explicitado como regra. Com relação à aferição da intensidade da tensão, definimos dois macroparâmetros: (a) Duração e (b) Escopo. A Duração foi dividida, conformes noções aspectuais inspiradas nos estudos Travaglia e também conforme questões temporais, em (a) Ilimitada e (b) Limitada, podendo a Limita ainda ser subdividida em duas dois agrupamentos. No primeiro deles, constam a categorias: (a) Estendida e (b) Pontual. No segundo, constam as categorias: (a) Situada no Passado, (b) Situada no Presente e (c) Situada no Futuro. Já o Escopo foi classificado linearmente como Baixo, Médio, Alto ou Total.

Palavras-chave: Discurso político; Jair Messias Bolsonaro; Linguística da Enunciação; Polifonia; Teoria dos Estereótipos.

Autoria: Alvaro Magalhães Pereira da Silva

Orientação: Maria Lúcia da Cunha Victório de Oliveira Andrade

Data da defesa: 13/06/2023

Gramática movimental: ontogênese da forma

Esta tese pretende ser um esboço de teoria. Como tal, imiscui-se de certo teor ensaístico, pautado numa intuição que se construiu aos poucos, a partir da verificável presença de elementos espaciais naquilo que denominamos "línguas" e que eu subsumo a "Língua" assim grafado, com maiúscula, em singular. A Língua teria sido e estaria sendo confeccionada segundo a condição do humano como ser peregrino, que ab origine se viu na possibilidade e na premência de deslocar-se através do espaço físico de um mundo que nos conduz ao deslocamento cinemático de um ponto a outro, passando por pontos contíguos e repousando em um ponto estático, ou seja, um mundo que nos in-duz e con-duz a realizar movimentos de separação, de aproximação, de perambulação e de estagnação, ora uma espécie de movimento em si mesmo, ex opposito do que é comumente entendido como "movimentar-se com mudança de espaço"; assim se configuram os movimentos de lugar de onde, de lugar para onde, de lugar por onde e de lugar onde. Nesse mesmo mundo, precisamos "dizer coisas" ao nosso semelhante, quiçá antes "formuladas" a nós mesmos, e a "formulação" tratou de formalizar-se. É naquele espaço e naqueles movimentos que, numa sorte de imitação, parece que fomos buscar a matéria-prima para representar porções de mundo e expressá-las. Antes de expressá-las e ainda antes de representá-las, precisamos entendê-las de maneira razoavelmente essencial, precisamos selecionar algo que de algum modo as essencializasse, de algum modo desenhassse seu ser e então as designasse representativamente e assim representacionalmente. Estávamos fadados à abstração. Aquelas "coisas" não eram e não são apenas coisas em si, mas, para serem, incluem suas relações e a forma como essas relações possam engendrar-se. Essa forma, segundo o que proponho, é a forma do espaço atualizado por nossos deslocamentos. Parece que enxergamos no espaço físico aquele modo de representação essencial das "coisas" e de suas relações abstratas, relações que foram subsumidas ao jogo de separação, de aproximação, de perambulação e de estagnação. A representação se deu em termos de espaço, e algo disso tudo não passou despercebido pelos modos de teorização da Língua, que, entretanto, não se têm dado conta da radicalidade que aí possa haver e que eu imprimo em minha proposição. No desenho da Língua, proponho a movimentalidade como fator fundante e por isso permanente em sua fisicalidade concretiva, porque, desde o tecido léxico até as relações sintáticas -- duas faces da mesma moeda --, é ela que continuamente irradia o mote principal para o re-desenhar da Língua, em seus desdobramentos semânticos, em suas atualizações sintáticas, (re)alimentados pelas imagens de separação, de aproximação, de perambulação e de estagnação que fazem da Língua um arsenal metafórico. Essas imagens estão arqueologicamente marcadas na etimologia, em toda a sedimentação histórica, como permanência na própria mudança, e estão ontogeneticamente indiciadas pelo que parece ser-lhes o oposto ontológico: a parataxe. Em equacionado jogo de forças, a parataxe fundamenta a própria movimentalidade e, numa espécie de segredo relacional, colabora com ela no engendro último que pude alcançar, o espaço molecular da Língua, em que, de uma a uma, as relações verdadeiramente se dão e fazem a Língua ser, um espaço somente atingível mediante uma análise que denomino ontogênica, porque, para além dos fenômenos razoavelmente visíveis a olho nu, é uma análise que procura penetrar em espaços menores, relações menores, quase invisíveis, em que talvez possa estar o germe espiritual da Língua, certo sopro original que a faz possível para nós.

Palavras-chave: Espaço; Língua; Metáfora; Parataxe.

Autoria: Clovis Luiz Alonso Júnior

Orientação: Marli Quadros Leite

Data da defesa: 06/06/2023

Crenças e atitudes linguísticas a partir da visão de docentes e não docentes sobre o Portunhol em Dionísio Cerqueira (SC) e Bernardo de Irigoyen (Argentina)

Este trabalho tem como objetivo descrever as crenças e atitudes linguísticas sobre o Portunhol, de informantes docentes e não docentes, residentes das cidades de fronteira brasileiras, Dionísio Cerqueira (SC) e Barracão (PR), e argentina, Bernardo de Irigoyen. As regiões foram escolhidas por se configurarem como fronteiras secas entre Brasil e Argentina, o que favorece uma interação multicultural e multilíngue, além do plurilinguismo. O aparato teórico-metodológico está embasado nos princípios da Dialetologia Pluridimensional de Thun (2005, 2010) e Altenhofen (2023), para a elaboração da metodologia de pesquisa e análise; da Psicologia social de Lambert e Lambert (1967, 1972), López Morales (1993), Moreno-Fernández (2009) e Silva-Poreli & Aguilera (2011), para a definição dos conceitos de crenças e atitudes linguísticas e suas interlocuções com a sociolinguística, que determinaram o questionário originalmente desenvolvido; e Krug (2013), Oushiro (2015) e Kusy (2019), para a elaboração desse questionário pluridimensional estruturado. O corpus de análise se compõe de entrevistas realizadas com 16 informantes, sendo oito docentes, que compõem a classe alta (Ca), e oito não docentes que compõem a classe baixa (Cb), caracterizando a dimensão diastrática de análise; e divididos também em dois grupos com base na faixa etária, a geração mais velha (GII), de 47 anos em diante, e a geração mais nova (G1), de 18 a 45 anos, o que compõe a dimensão diageracional. Além disso, há divisão equânime de informantes homens e mulheres, compondo assim a dimensão diassexual de análise. A pesquisa apresenta abordagem qualitativa, de natureza aplicada, com objetivo descritivo, pois investiga as respostas subjetivas dos entrevistados e, a partir de análises indutivas, busca descrever as crenças e atitudes linguísticas dos falantes da região de fronteira seca, para então contribuir com as discussões sobre o reconhecimento do portunhol como uma língua identitária da região de fronteira, sobretudo por professores. Os informantes responderam a perguntas de um questionário com questões estruturadas, que foram transcritas de forma grafemática e tabuladas conforme a metodologia da Dialetologia Pluridimensional e relacional e analisadas por meio de inferências. Dentre as hipóteses aventadas, estão a de que os falantes dessa região de fronteira reconhecem o Portunhol como uma língua identitária da região, portanto, com atribuição de prestígio a essa variedade, ainda que resguardem o Português e o Espanhol nos contextos oficiais de cada país. Além disso, a de que os docentes atribuem certo valor de prestígio ao portunhol, reconhecendo-o como língua, identitária de uma região com contexto bilingue da qual ele faz parte, ainda que prezem pelo ensino da língua oficial. Os resultados apontam para a confirmação dessas hipóteses.

Palavras-chave: Crenças e atitudes linguísticas; Docentes; Fronteira; Línguas em contato; Portunhol.

Autoria: Claudia Bergamini

Orientação: Manoel Mourivaldo Santiago-Almeida

Data da defesa: 19/05/2023

O corpo fala antes que emerjam as palavras: estudo longitudinal do processo de aquisição da linguagem de uma criança com TEA

A ontogenia humana é uma área ainda pouco explorada pelas ciências linguísticas, especialmente se consideradas as abordagens funcionalistas da linguagem. Compreendê-la é, no entanto, de imensurável importância para a compreensão integral dos processos cognitivos envolvidos na comunicação humana. Esta tese, portanto, se debruça sobre os processos motores e cognitivos que acompanham a aquisição da linguagem de uma criança humana desde seu nascimento até a idade de 3 anos, momento em que a produção sintática deve estar em plena atividade e a experiência discursiva deve começar a figurar em suas interações comunicativas. A hipótese inicial sobre esse processo pairava sobre o papel do corporeamento na maturação das habilidades cognitivas prévias para a aquisição de língua. Dois, portanto, são os objetos de investigação no projeto original desta tese, um teórico e um analítico. Os achados da investigação, contudo, ainda no processo longitudinal de recolha de material, revelaram que a criança observada estava apresentando um desenvolvimento atípico, o que culminou em um diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA). O estudo desenvolvido, portanto, não se propõe a fazer uma análise quantitativa de dados, pois o que se buscou provar é a implicatura de conceitos cognitivos mais concretos na aquisição de conceitos mais abstratos na ontogênese, neurotípica ou atípica. Ademais, os marcos do desenvolvimento, como ocorrem em momentos diferentes no desenvolvimento atípico, foram considerados apenas a fim de estabelecer uma relação entre habilidades, independentemente da idade em que elas aconteciam. A análise de dados proposta, é, assim, qualitativa, uma vez que considerou não a quantidade ou os períodos de produção linguística, mas os scaffoldings motores e cognitivos de habilidades anteriores, mais concretas, para a aquisição de habilidades posteriores, mais abstratas, no desenvolvimento humano, como é o caso da linguagem. O material analisado é composto por um diário com anotações de todos os eventos sociais e linguísticos protagonizados pelo bebê em observação ao longo de 3 anos, além de vídeos em ambiente controlado nos quais é possível analisar interações triádicas e seus efeitos na socialização e linguagem do bebê a partir dos seus 9 meses de idade. Apliquei, então, aos dados a escala de Denver II, para observar a relação entre as áreas do desenvolvimento, e analisei-os à luz dos postulados teóricos de Heine et alii (1991) e Lima-Hernandes (2010; 2021), que dissertam sobre categorias cognitivas, e de Tomasello (2007), que analisa a aquisição da linguagem sob uma perspectiva baseada no uso. Os resultados encontrados revelam uma relação intrínseca entre a maturação de habilidades sociais e de habilidades linguísticas, ilustrada pela habilidade de atenção compartilhada declarativa funcionando como um verdadeiro scaffold cognitivo para a aquisição da competência interlocutória e, por fim, discursiva.

Palavras-chave: Aquisição da linguagem; Categorias cognitivas; Corporeamento; Espaço de atenção conjunta; Transtorno do espectro autista.

Autoria: Anna Karolina Miranda Oliveira

Orientação: Maria Célia Pereira Lima Hernandes

Data da defesa: 24/02/2023

 

Dissertações de Mestrado

Onomástica literária e representação espacial como ancoragem de memória: topônimos na obra Baú de ossos, de Pedro Nava

Em franco crescimento no Brasil, os estudos onomásticos representam, por excelência, a interdisciplinaridade. São duas as disciplinas mais representativas: a Toponímia, disciplina onomástica que se dedica a analisar a complexidade do nome de lugar desde sua formação linguística até suas múltiplas relações extralinguísticas, tem sido o ramo que deu mais frutos na academia brasileira até o momento; e a Antroponímia, o outro ramo de relevo da Onomástica que tem por objeto os nomes de pessoas e todas as relações implicadas com o linguístico e o extralinguístico. No mundo, a conectividade proporcionada pela comunicação globalizada conduziu ao surgimento de novas perspectivas em Onomástica, entre elas a Onomástica Literária. Embora, em sua maioria, as pesquisas em Onomástica Literária tenham por objeto o nome das personagens em obras literárias, é possível encontrar alguns trabalhos sobre os nomes dos lugares. No Brasil, há pouquíssimos cujo objeto é o topônimo e esta dissertação pretende contribuir para a ampliação desse cenário. Em obras literárias, podemos considerar o nome de como uma representação do real, importante actante na construção da narrativa. Nosso objetivo específico é olhar, com as peculiaridades críticas e teóricas da Onomástica Literária, para alguns topônimos do livro Baú de ossos, de Pedro Nava. Nele, o autor apoia-se no topônimo para preencher o espaço do entorno com suas memórias. Durante a infância, dois lugares marcaram a primeira década do século XX: a Rua Direita em Juiz de Fora; a Rua Aristides Lobo no Rio de Janeiro. Em cada cidade, um topônimo serve de ancoragem e o fio da memória vai, lentamente, cosendo essa representação do real, a juntar o topônimo às memórias de tais espaços para compor uma imensa "colcha de retalhos". Os resultados dessa dissertação apontam o topônimo como objeto de ancoragem de memória, seja em textos ficcionais ou não ficcionais.

Palavras-chave: Literatura memorialística; Onomástica Literária; Pedro Nava; Toponímia.

Autoria: Antonio Rafael Marçal da Silva

Orientação: Patricia Carvalhinhos

Data da defesa: 22/11/2023

Entre a diversão e o aprendizado: entrecruzamentos dos movimentos da didatização e do humor em enunciados do gênero videoaula

Nessa pesquisa, nosso objetivo central foi analisar os entrecruzamentos entre os movimentos de humor e didatização em todos os níveis de composição de enunciados de videoaula. Desse objetivo, desdobraram-se dois objetivos específicos: descrever e caracterizar o gênero videoaula; e descrever e analisar elementos verbivocovisuais que materializam, nos enunciados de videoaula selecionados, uma intenção de didaticidade e, por outro lado, de elementos apropriados de enunciados e gêneros humorísticos para gerar um efeito humorístico. Partiu-se da hipótese de que a inter-relação entre tais movimentos seria característica e constitutiva desse gênero e, portanto, seria encontrada em todos os níveis da construção das videoaulas analisadas, mais especificamente: no conteúdo temático, na construção composicional e no estilo. A relevância desse tema relaciona-se ao contexto da pandemia de COVID-19, bem como da pós-pandemia, a partir do qual acentua-se a necessidade de melhor compreender e analisar as novas formas discursivas que a esfera da educação toma ao penetrar no meio digital e, a partir disso, (res)situar as práticas sociais, culturais e discursivas da instituição escolar em seu formato presencial. Para tanto, o corpus compôs-se de duas videoaulas do programa Hora do ENEM, cujo caráter recente, oficial, público e de grande circulação justificou a seleção. Ainda, escolheu-se trabalhar com dois enunciados para adotar um enfoque mais pormenorizado na análise, com vistas a detectar a materialização do movimento do humor e da didatização em cada aspecto das videoaulas e, assim, comprovar a existência de um imbricamento entre os movimentos e destes com a própria composição dos enunciados. A metodologia selecionada foi a Metalinguística de Bakhtin, a qual permitiu a compreensão das relações dialógicas entre os movimentos da didatização e do humor presentes nos enunciados selecionados, dado que esses manifestam distintas posições ideológicas, intenções discursivas, avaliações sociais, que convivem e dialogam dentro do gênero videoaula. A análise dos enunciados identificou a presença dos movimentos do humor e da didatização em todos os níveis de sua composição, havendo diferenças na materialização desses movimentos entre as duas videoaulas. Concluiu-se que há de fato entrecruzamentos complexos entre os movimentos de humor e didatização que perpassam todos os níveis de construção dos enunciados analisados e que estão relacionados a aspectos fundamentais do gênero videoaula. Ainda, concluiu-se que o movimento do humor identificado nas videoaulas não possui o caráter revolucionário e ambivalente do riso carnavalesco proposto por Bakhtin, uma vez que seu emprego nos enunciados está relacionado a objetivos discursivos pragmáticos do sujeito-autor, como a obtenção do engajamento do aluno-interlocutor pela captação de seu interesse e atenção. Contudo, identificamos que os resquícios da força carnavalesca que restam no humor contemporâneo enquanto forma reduzida do riso cômico medieval permitem entrever possibilidades do emprego do humor entrelaçado à didatização que possam questionar imposições institucionais da esfera educacional e propor uma alternativa revolucionária e ambivalente.

Palavras-chave: Análise do Discurso; Didatização; Humor; Videoaula; YouTube.

Autoria: Beatriz Amorim de Azevedo e Silva

Orientação: Sheila Vieira de Camargo Grillo

Data da defesa: 17/11/2023

Correspondências passivas de Francisco Xavier de Mendonça Furtado – Governador Geral do Estado do Grão-Pará e Maranhão (1751-1759): um estudo filológico

A presente dissertação apresenta o estudo filológico de correspondências que fazem parte da administração colonial da América Portuguesa no início da segunda metade do século XVIII, entre 1751-1757. Por meio da edição semidiplomática, apresenta-se um conjunto de trinta e três cartas enviadas a Francisco Xavier de Mendonça Furtado, governador geral dos estados do Grão- Pará e Maranhão. As cartas estão localizadas na Biblioteca Nacional de Portugal - BNP, catalogadas na coleção José António Moniz. Para apresentar essa produção documental do século XVIII, dividiram-se as cartas em dois grupos. No primeiro grupo de cartas enviadas, encontram-se missivas de padres, bispos e pessoas comuns envolvidas direta ou indiretamente com a administração colonial. O grupo é identificado na dissertação como "Autores variados" (AV) e é composto por 16 cartas. O segundo grupo são cartas enviadas por Gonçalo Pereira Lobato e Sousa (GPLS), identificado com o mesmo nome e composto por 17 cartas. O estudo proposto parte de uma contextualização histórica sobre o século XVIII e os administradores coloniais Francisco Xavier de Mendonça Furtado e Gonçalo Pereira Lobato e Sousa e o atual Norte do Brasil. A prática epistolar e os conceitos paleográficos e diplomáticos também são estabelecidos na primeira parte. Na segunda parte, apresentam-se a edição semidiplomática, uma ementa detalhada sobre os assuntos tratados nas cartas e descrições linguísticas e paleográficas. Por fim, estabelece-se um estudo sobre o registro de consoantes sibilantes surdas e sonoras em contexto intervocálico. Observase que a produção documental no século XVIII possibilita estudos que desafiam não só o contexto histórico-social, mas também os aspectos relacionados ao estabelecimento de uma tradição gráfica setecentista, sendo, portanto, objeto de estudo considerável para compor a perspectiva do desenvolvimento linguístico e social do Brasil, especificamente o território que ainda fazia parte do que era denominado América Portuguesa. Busca-se, portanto, reforçar a importância dos estudos filológicos de documentos da administração colonial e contribuir para a ampliação dos estudos sobre a história da língua portuguesa.

Palavras-chave: Administração colonial; América Portuguesa; Edição semidiplomática; Filologia; Grão-Pará e Maranhão; Sibilantes.

Autoria: Marina Pessoa Silva

Orientação: Phablo Roberto Marchis Fachin

Data da defesa: 17/11/2023

As mudanças nos topônimos amazônicos na Era Pombalina: um olhar para além da motivação saudosa

Esta dissertação propõe uma análise toponímica diferenciada de alguns espaços pertencentes ao território da extinta capitania do Grão-Pará (1616-1821). Por meio da toponímia, em perspectiva diacrônica, nota-se que houve substituição em massa nos nomes de vilas e aldeamentos. Nomes nativos foram substituídos por topônimos portugueses, com objetivos puramente estratégicos, políticos e ideológicos, pois a Coroa Portuguesa precisava afirmar-se categoricamente como proprietária do território, evitando, simultaneamente, a cisão entre metrópole e colônia e uma indesejada reclamação territorial por parte da Coroa Espanhola, já que os topônimos nativos, dentro de sua complexidade dialetológica, ocupavam homogeneamente toda a América do Sul. Tal panorama evidencia que as substituições não foram fruto de saudade da terra natal e que não basta uma tradicional análise toponímica por campos semânticos (DICK, 1980), mas que de acordo com a peculiaridade de certos corpora precisa-se recorrer a novas abordagens técnicas de cunho sócio onomástico, tal como a Toponímia Crítica (ROSE-REDWOOD; ALDERMAN; AZARYAHU, 2009). Desta forma, olhando para as particularidades da área, em conjunto com outras disciplinas, o presente trabalho busca trazer contribuições para a criação de uma toponímia crítica, que se proponha decolonial. Utilizando um aparato teórico-crítico mais recente (toponímia crítica), os resultados poderão demonstrar de modo mais contundente que a saudade não é motivação de topônimos naquela área (como já alertava Antenor Nascentes, 1960), mas sim que os nomes de lugares possuem importância geopolítica vital.

Palavras-chave: Dominação ideológica; Grão-Pará; Toponímia Crítica; Toponímia Indígena.

Autoria: Clara Beatriz Haag

Orientação: Patricia Carvalhinhos

Data da defesa: 08/11/2023

O trovador e o jogral nas cantigas de amigo: a desinência -des na poética de Dom Dinis e Juião Bolseiro

A presente dissertação apresenta ao leitor a história da língua galego-portuguesa e seus processos históricos. O galego-português era uma língua utilizada por diversos trovadores de diferentes regiões da Península Ibérica que escreviam cantigas. Não devemos esquecer-nos de que as cantigas trovadorescas são um símbolo artístico da Idade Média, pois elas apresentavam as relações humanas desse período histórico. Apresentaremos as cantigas e suas estruturas e detalharemos suas principais características por meio das notas. Discorreremos sobre a tradição dos mais indispensáveis manuscritos do trovadorismo: o Cancioneiro da Ajuda, o Cancioneiro da Biblioteca Nacional e o Cancioneiro da Vaticana. O texto abordará também as teorias da origem da poesia lírica profana. Um aspecto essencial da pesquisa são os poetas das cantigas, o trovador D. Dinis e o jogral Juião Bolseiro - o primeiro foi rei de Portugal e o segundo, um bardo popular das classes não aristocráticas. Comentaremos as hipóteses da razão do verbo ouúades estar somente no cancioneiro da Vaticana e não no cancioneiro da Biblioteca Nacional. Discutiremos a hipótese de Ismael Coutinho sobre o surgimento da desinência des e a queda do d- no século XV. Mostraremos também os tempos verbais do verbo na segunda pessoa do plural e apresentaremos a investigação da desinência des, como ela continuou no galego, e o processo da síncope do d- no português, além dos pontos de vista científicos de Clarinda Maia, Edwin B. Williams e Leite de Vasconcelos. Por fim, também é feita uma análise da desinência verbal -des na cantiga Buscades m ay amigo muyto mal.

Palavras-chave: Cancioneiro; Cantigas; Galego-português; Jogral; Trovador.

Autoria: Geandro Silva Santos

Orientação: Valéria Gil Condé

Data da defesa: 25/10/2023

Viagem ao céu, de Monteiro Lobato: notas sobre a filologia autoral

Esta dissertação tem como objetivo investigar as etapas de gênese e estabelecimento da obra Viagem ao céu, de Monteiro Lobato, com a finalidade de identificar, descrever e analisar as alterações atribuídas ao autor ao longo dos anos. O corpus é constituído por 10 testemunhos, publicados entre 1932 e 1948. Partindo dos princípios norteadores da Crítica Genética e da Filologia do Autor, realizam-se, portanto, a recensão de testemunhos e o exame das variantes textuais encontradas. Realiza-se, também, a descrição dos testemunhos de acordo com as determinações da Bibliografia Material. Ao examinar as lições variantes de cada testemunho do texto, foi possível identificar alguns padrões, relacionados à sua classificação e à sua frequência. Identificam-se casos de variação por adição, alteração de ordem, omissão e substituição, além de mudanças na paragrafação e reelaboração textual.

Palavras-chave: Bibliografia material; Crítica genética; Monteiro Lobato; Viagem ao céu.

Autoria: Deborah Quintal Vieira

Orientação: Sílvio de Almeida Toledo Neto

Data da defesa: 20/10/2023

Memórias da Paisagem: cotidiano e espacialidade dos comerciantes de tropas do rio Ribeira de Iguape por meio da recuperação toponímica

O tema desta pesquisa é a toponímia do Vale do Rio Ribeira de Iguape, território localizado ao Sul do Estado de São Paulo, na fronteira com o Estado do Paraná. O objetivo é o resgate dos condicionantes históricos que o processo de investigação toponímica alcança, uma vez que dados linguísticos costumam corresponder aos dados históricos de formação de uma região. Trata-se de um território habitado inicialmente por povos nativos de origem Tupi, que na metade dos séculos XVI foi porta de entrada de exploradores europeus à procura de metais preciosos, provocando o surgimento de diversos arraiais de mineração e originando o primeiro ciclo econômico, o do ouro. Avançando serra acima, exploradores rumaram ao Planalto do Paranapanema, por meio dos vales dos rios e de antigas trilhas indígenas, estabelecendo rotas terrestres e fluviais que abarcavam uma malha de caminhos interligados aos portos da Planície Litorânea. Esta dissertação ainda descortina, por meio dos topônimos, um segundo ciclo econômico, o tropeirismo. Em um percurso metodológico e teórico que comprova a complexidade com a qual o toponimista se depara constantemente, também ele pesquisador com formação que se deseja complexa e interdisciplinar, coletamos 4.355 topônimos em diversas fontes primárias e secundárias, cartográficas e textuais (datados de 1869 a 1998). Não afastando a pesquisa tradicional, esta dissertação dialoga com a história, a geografia e sobretudo a etimologia para a composição de seu escopo teórico. Após a coleta e filtragem do corpus, deliberamos analisar não cada topônimo, mas reuni-los sob mecanismos de nomeação e motivações. Os procedimentos metodológicos, não exatamente canônicos para esta disciplina onomástica, consistiram na criação de um instrumento capaz de manusear dados contidos nos topônimos e suas variáveis de forma mais eficiente. Tais procedimentos permitem complementar estudos de leitura da paisagem por meio de resultados quantitativos dos topônimos, derivados de programação matemática e interpretação de gráficos. Como resultados, apresentamos uma identificação sistematizada de padrões tais como concentração, dispersão, recorrência, intersecção e variações de motivações ao longo do tempo e espaço, contribuindo para conservar e revelar valores históricos, culturais e linguísticos da sociedade que viveu, sobreviveu e nos legou sua visão de mundo, interesses, conflitos e imaginário por meio dos nomes de lugares do Vale do Ribeira.

Palavras-chave: Canoas; Eldorado; Iporanga; Ouro; Toponímia; Tropas; Vale do Ribeira.

Autoria: Arlete Aparecida Nestlehner Cardoso de Almeida

Orientação: Patricia Carvalhinhos

Data da defesa: 16/10/2023

Representações culturais brasileiras em dois livros didáticos de PLA: uma análise dos campos léxico-semânticos

Com o objetivo de investigar como se dá a representação cultural do Brasil nos materiais didáticos de Português como Língua Adicional (PLA), foram elaborados e analisados campos léxico-semânticos criados a partir das lexias presentes em dois livros didáticos: Pode entrar: Português do Brasil para refugiadas e refugiados (ACNUR, 2015) e Novo Avenida Brasil: curso básico de português para estrangeiros (LIMA et al., 2008). Isso ocorreu mediante o uso da metodologia da Linguística de Corpus (doravante LC) (BERBER SARDINHA, 2004; TAGNIN, 2015), constituindo-se um corpus e utilizando-se de algumas ferramentas da LC, como a elaboração de listas de palavras, para se verificar a frequência, de listas de palavras-chave e de concordâncias, geradas pelo programa AntConc, para uma análise quantitativa e qualitativa. Com os dados coletados, para uma análise qualitativa, foi essencial recorrer aos estudos lexicais (ABBADE, 2012; BIDERMAN, 2001; COSERIU, 1977; HENRIQUES, 2018; POLGUÈRE, 2018; POTTIER, 1972; VILELLA, 1979), para a constituição dos campos léxico-semânticos. Além disso, utilizou-se também, como fundamentação teórica, os estudos de Kramsch (2013) sobre o ensino de língua estrangeira e cultura, Amado (2011; 2014) e Lisboa (2021), acerca do ensino de Português como Língua de Acolhimento. Também, para uma análise interpretativa, cotejaram-se os resultados dos campos léxico-semânticos com ensaios antropológicos de DaMatta (1976), Ortiz (1985), Ribeiro (2015) e Holanda (1995). Como resultados finais, verificou-se que, como esperado, tendo em vista os diferentes públicos-alvo, os aspectos da cultura brasileira abordados nos livros são bastante diferentes. Se no livro destinado a estrangeiros em geral, a ênfase é colocada em aspectos culturais relacionados ao turismo, como o acolhimento em hotéis, a alimentação e as atividades de lazer e de negócios, no livro direcionado ao contexto de refúgio a abordagem concentra-se em temas culturais relacionados ao cotidiano dos brasileiros e a sua cidadania, evidenciando questões referentes à legislação brasileira e seus aspectos sociais, como a família e a religião. Além disso, a utilização da Linguística de Corpus, como procedimento metodológico, permitiu verificar o que se mostra nos livros didáticos de forma mais frequente e relevante. Os resultados obtidos por meio dessa metodologia evidenciaram que, embora em algumas unidades dos livros didáticos analisados haja referência a festas típicas, músicas regionais e alguns esportes, estes elementos não aparecem, no geral, como palavras-chave dos corpora, não consistindo em imagens e representações culturais que se repetem ao longo dos textos. Esta pesquisa abre margem a outros estudos que analisem livros didáticos diferentes e que permitam refletir sobre o Brasil que se revela aos falantes de outras línguas. Cada material didático representa uma subárea da grande área de estudos de Português Língua Adicional, portanto pesquisas que focalizem essas e outras subáreas são desejáveis, a fim de colaborar com a expansão do PLA no Brasil e o aprimoramento de seus recursos de ensino-aprendizagem.

Palavras-chave: Brasil; Campo léxico-semântico; Cultura; Léxico; Livro didático; Português como Língua Adicional.

Autoria: Lizandra Belarmino de Moura

Orientação: Mariângela de Araújo

Data da defesa: 12/09/2023

Entre as orações e o texto: subordinadas adverbiais em materiais didáticos do novo ensino médio

Nesta dissertação, investiga-se a abordagem das orações subordinadas adverbiais em dois livros didáticos do novo ensino médio aprovados pelo Programa Nacional do Livro Didático de Língua Portuguesa/PNLD (2021). Os manuais aprovados seguem as diretrizes apontadas pela Base Nacional Comum Curricular/BNCC (2018) para o ensino médio que aponta, no trabalho com a gramática, as práticas de análise linguística geraldiana (2004 [1984]). De forma a atingir esse objetivo, três perguntas são norteadoras: (1) Considerando-se o ensino a partir do texto/dos gêneros, como articular a gramática com a leitura e a produção de textos?; (2) Como o ensino da sintaxe, algo tão estrutural da língua, está encaminhado para o estudante nos materiais didáticos aprovado pelo INEP?; (3) O ensino das orações subordinadas adverbiais nas propostas didáticas de língua em uso nos manuais Multiversos: língua portuguesa (CAMPOS; ODA, 2020) e Linguagens em interação: língua portuguesa (CHINAGLIA, 2020) visa o incremento da leitura e produção textual do aluno ou o trabalho com a metalinguagem? A concepção sociológica e dialógica da língua/linguagem de Bakhtin e o Círculo (VOLÓCHINOV, 2018 [1929], 2019 [1930]; BAKHTIN, 2008 [1963] e os conceitos bakhtiniano de estilística (BAKHTIN, 2013 [1940]) e de gêneros do discurso (MEDVIÉDEV, 2019 [1928]); BAKHTIN, 2019 [1952/53]) fundamentaram teórico-metodologicamente esta dissertação. Desse modo, examinam-se as propostas de ensino das orações subordinadas adverbiais nos livros didáticos selecionados, a fim de verificar se em tais obras prioriza-se a compreensão do uso dessas orações no discurso, isto é, de modo articulado à leitura e a produção textual do aluno, ou o estudo metalinguístico de sua estrutura gramatical isolada. Os resultados indicam que o trabalho com a leitura e compreensão dos textos aproxima-se da abordagem da análise linguística, o ensino das orações subordinadas adverbiais, por sua vez, ocorre nos limites da oração, desconsiderando a relação estilo-gramática e texto-gramática, não contribuindo com a compreensão do estudante acerca do papel dessas orações subordinadas adverbiais e seus efeitos de sentido nos textos.

Palavras-chave: Análise linguística; Bakhtin; Base Nacional Comum Curricular (BNCC); Ensino médio; Orações subordinadas adverbiais.

Autoria: Diego Bello Doze

Orientação: Maria Inês Batista Campos

Data da defesa: 31/07/2023

A maldição e a cura

Este trabalho faz parte do projeto "Bruxas Paulistas: Edição Filológica de Documentação sobre Feitiçaria" que desenvolve pesquisas relacionadas à documentação contida no Arquivo da Cúria Metropolitana de São Paulo acerca de autos inquisitoriais e de denúncia para casos de crime de feitiçaria ocorridos na província durante o século XVIII. Tal projeto está ligado ao Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da USP. Essa dissertação tem como proposta editar autos coletados no Arquivo e analisa-los à luz da filologia de forma a reconhecer as mentalidades presentes nas comunidades que produziram e por onde circularam tais documentos, de forma a identificar as leituras construidas sobre os grupos sociais presentes, desvendando os preconceitos explicitados nas tipificações dos que praticavam os crimes de feitiçaria, assim como daqueles que serviam de testemunhas para as investigações. Da mesma forma a investigação aqui praticada pretende reconhecer na seleção de palavras para se fazer as acusações ou defesas dos denunciados, que elementos tornam os atos tolerados ou não, assim como a seleção de silenciamentos sobre determinadas características dos envolvidos nos autos. Assim, esse trabalho objetiva mostrar que o reconhecimento de minorias sociais, como bastardos, mestiços e mulheres, como ameaças à ordem social estabeleceu uma visão preconceituosa sobre tais grupos, tornando-os bodes expiatórios, cuja perseguição reestabelece a ordem.

Palavras-chave: Brasil colonial; Bruxaria; Curanderia; Filologia; Inquisição.

Autoria: Fábio Garcia Dias

Orientação: Marcelo Módolo

Data da defesa: 21/07/2023

A tradição documental do relato de viagem do Conde da Azambuja (1751): implicações históricas e filológicas

Esta dissertação enquadra-se no contexto de duas grandes áreas: a Filologia e a História. Filologicamente, por meio do estudo dos textos que compõem o corpus do trabalho, sua trajetória, manuscrita e impressa, sua forma de transmissão e escrita. Historicamente, pela verificação de como a compreensão de sua trajetória textual pode contribuir para quem lê a obra depois de três séculos de sua versão original e como a historiografia tem usado os seus testemunhos para dar a conhecer os acontecimentos relacionados. O corpus do trabalho é composto por testemunhos de um documento intitulado Relaçaõ da Viagem, que fez O Conde da Azambuja Da cidade de S. Paulo Para a Villa do Cuyabá No anno de 1751. Com atribuição de autoria a Antonio Rolim de Moura e endereçamento a seu primo, o Conde de Val de Reys, narra-se uma viagem em contexto monçoeiro. Representa assim uma importante fonte histórica do período das monções cuiabanas e sobre a expansão dos domínios da Coroa portuguesa na América do Sul. Tendo em vista o estudo da tradição da Relação e a sua importância para a História do Brasil, objetivou-se fazer um levantamento dos seus testemunhos manuscritos, estabelecer a ligação entre eles e produzir uma edição fidedigna com vistas à produção de fontes para estudos históricos e linguísticos. A edição do documento foi feita considerando três versões da Relação de Viagem, o que dará margem a uma futura edição crítica. Compõem ainda as atividades da pesquisa a identificação das datações tópicas e cronológicas do texto e a discussão de aspectos relacionados a sua autoria, tendo em vista o seu contexto de produção.

Palavras-chave: Filologia; História; Monções cuiabanas; Relação de Viagem.

Autoria: Mariane Soares Torres de Abreu

Orientação: Phablo Roberto Marchis Fachin

Data da defesa: 19/07/2023

Língua e norma: um estudo das ideias linguísticas presentes nas polêmicas de Cândido de Figueiredo

Nesta dissertação analisamos o pensamento linguístico de Cândido de Figueiredo, muitas vezes rigoroso e normativo, na abordagem descritiva de diferentes fenômenos gramaticais. Para nossa reflexão, tomamos por base duas polêmicas linguísticas: a primeira travada entre Cândido de Figueiredo e Paulino de Brito, versa sobre a colocação dos pronomes clíticos, numa perspectiva comparativa entre o português brasileiro e o português europeu; a segunda, a qual se desenrola entre Cândido de Figueiredo e Heráclito Graça, abrange questões sobre morfologia e sintaxe, novamente dentro de um crivo normativo que aponta como erros certos usos inovativos na escrita literária de autores brasileiros. Nosso objetivo é o de examinar os discursos de Cândido de Figueiredo e inseri-los no contexto histórico, social e cultural de sua época, de modo a tornar possível uma avaliação mais precisa de suas ideias conservadoras. O material que nos serviu de base é composto por dez livros, sendo oito deles escritos pelo próprio Cândido de Figueiredo, um de Paulino de Brito e um de Heráclito Graça. Esta dissertação está inserida na área da Historiografia Linguística, dentro do plano da História das Ideias Linguísticas, com base na proposta teórico-metodológica de Sylvain Auroux.

Palavras-chave: Cândido de Figueiredo; Heráclito Graça; Paulino de Brito; Português brasileiro; Português europeu.

Autoria: Rafael Sicoli Pacheco

Orientação: Maria Aparecida Corrêa Ribeiro Torres Morais

Data da defesa: 12/06/2023

"Essa língua também é minha": imigrantes nas escolas paulistanas como neofalantes de português brasileiro

Neste trabalho propõe-se que a terminologia neofalante (Ramallo, 2013; 2020; Smith-Christmas et al., 2018) seja aplicada para descrever estudantes que falam uma língua que não é sua língua materna. O conceito de neofalante, no contexto paulistano, refere-se a alunos migrantes aprendendo o português, assim como brasileiros que aprendem a norma-padrão através da escola. Seu uso tem como propósito aproximá-los em uma abordagem de ensino de língua portuguesa que contemple semelhanças e diferenças que ambos os grupos possuem em relação à norma-padrão. O conceito de neofalante vai além da descrição do status de falante do aluno, permitindo que políticas e abordagens pedagógicas sejam desenvolvidas na sala de aula para facilitar a inclusão linguística, bem como o sucesso acadêmico e social do aluno. A partir da diversidade linguística presente em sala de aula, o trabalho propõe uma discussão teórica, um estudo de caso sobre o uso do conceito de neofalante em uma escola secundária em Burela (Galiza, Espanha), Modelo Burela (2005 - presente), e a aplicação de uma sequência didática (Dolz, Noverraz, Schneuwly, 2004) que utiliza o conceito, adotada em uma turma de 9º ano do Ensino Fundamental - Anos Finais na cidade de São Paulo. A sequência tem como resultado a produção de um podcast de entrevistas com temas relacionados à migração, como cultura e histórias de deslocamento. A atividade proporcionou a integração entre alunos de diferentes origens e línguas-maternas, e possibilidades de aprendizado e uso do gênero textual entrevista sem que houvesse distinções hierárquicas entre falantes. O objetivo da pesquisa é verificar se a abordagem dos alunos migrantes como neofalantes do português brasileiro facilita o desenvolvimento de habilidades na língua portuguesa e a integração aluno-escola. Consideramos que esta abordagem pode ser incorporada ao ensino de migrantes na cidade de São Paulo, a fim de evitar que a dicotomia entre língua padrão e oralidade seja sinônimo de exclusão social e fornecer aos professores uma ferramenta para inclusão em sala de aula.

Palavras-chave: Ensino-aprendizagem; Língua não-materna; Migração; Neofalantes; Novos falantes.

Autoria: Priscila Vasconcelos Silva

Orientação: Valéria Gil Condé

Data da defesa: 05/06/2023

Para além deles e nós - a construção de identidades dos falantes de japonês como língua de herança e seus reflexos na paisagem linguística de Suzano

Na presente dissertação, apresenta-se como objetivo principal a análise da influência do Japonês como Língua de Herança sobre seus falantes e sobre o espaço que ocupam, a partir da qual se tenciona estabelecer a relação entre a construção identitária desses falantes e a paisagem linguística do locus da pesquisa, a cidade de Suzano. Parte-se da relação entre memória, indivíduo, identidade e sociedade, na qual a Língua de Herança atua como elemento norteador para as análises. Observa-se o modo como os falantes interagem com essa Língua de Herança e seus diversos elementos; com a língua portuguesa e com os aspectos da sociocultura brasileira; os possíveis processos identitários que podem ocorrer, tais quais: mudança, alternância, verificação de identidades e manifestação de múltiplas identidades, além do papel das memórias, coletiva e individual. Assume-se que a identidade incorpora uma construção linguística, portanto, as manifestações dessas construções nos discursos desses falantes também foram alvo de análise. Para a análise das paisagens linguísticas, consideraram-se diferentes gêneros, sob uma perspectiva multimodal, assumido que a linguagem está presente em diferentes elementos da arquitetura e da geografia de um local. Posto que também há relação entre memória coletiva e individual e que ambas relacionam-se ainda com identidades e espaços, propôs-se a aplicação de questionários a uma rede familiar de imigrantes japoneses e seus descendentes residentes no município para a criação de genograma familiar, pesquisa documental e realização de entrevistas para observar, a partir da evocação das memórias desses indivíduos, a relação entre falante, língua e marcas identitárias, além de pesquisa de campo para investigação de elementos icônicos da cultura japonesa presentes na paisagem linguística da cidade. A análise de dados baseou-se nos princípios da Sociolinguística Interacional, no conceito de memória coletiva e individual, dos domínios apontados pela Multidimensional Ecosystemic Comparative Approach - MECA e da Linguistic Landscape. Os dados apontaram para a alternância entre as identidades "brasileiro" e "japonês" dos falantes em alguns casos, além de situações em que ambas foram negadas ou manifestadas simultaneamente. Linguisticamente, essas características materializaram-se principalmente através dos termos "eles" e "nós", embora as formas de estruturação dos discursos indiquem também um "entre-lugar" ou um "não-lugar". Outra manifestação encontrada foi o uso do codeswitching para o estabelecimento de um espaço de atenção conjunta entre os interlocutores e reforço da identidade japonesa. Na paisagem linguística local, foi possível notar a influência da comunidade nikkei e de sua língua ancestral e, especificamente, a ação de certos membros da rede familiar estudada. Notou-se também características dessas identidades não fixas e fluidas na paisagem analisada, indiciando um caráter agentivo e a participação desses falantes no espaço em que vivem. Os resultados obtidos indicam que o japonês como Língua de Herança influencia tanto a construção de identidades dos indivíduos quanto as paisagens linguísticas com que interagem, e evidencia um processo dinâmico, ou seja, não-estático, que não ocorre de maneira uniforme em todos os indivíduos devido à sua interação com diferentes aspectos pessoais e sociais. Essa dinâmica permite, portanto, a manifestação da superdiversidade ao longo das gerações familiares e na paisagem linguística referida.

Palavras-chave: Construção identitária; Japonês como Língua de Herança; Memória e identidade; Paisagem linguística.

Autoria: Andréia Hiromi Mano

Orientação: Maria Célia Pereira Lima Hernandes

Data da defesa: 24/05/2023

Análise das políticas de internacionalização da Universidade de São Paulo e da realidade linguística dos estudantes estrangeiros: quais imagens de língua circulam nos espaços acadêmicos?

A presente dissertação analisa as políticas de internacionalização da Universidade de São Paulo, discutindo as implicações que elas trazem para a realidade acadêmica. Examinamos qual é a língua constituída em documentos oficiais da USP sobre internacionalização, observando as políticas linguísticas que a universidade fomenta e propaga. Analisamos as imagens de língua presentes nos textos e nos discursos dos estudantes estrangeiros, coletadas em entrevistas semiestruturadas. Também investigamos quais imagens são construídas em dois materiais didáticos de ensino de português para imigrantes. Dessa maneira, debatemos as tensões e as diferentes imagens que circulam nas instâncias argumentadoras Estado, Universidade e Comunidade, buscando uma relação entre elas. O objetivo geral desta dissertação é descrever e analisar as imagens de língua que circulam nos espaços acadêmicos da USP. As metodologias empregadas na pesquisa foram análise do discurso de linha francesa, análise documental, estudos de caso; para as transcrições das entrevistas, nos baseamos nas orientações de Marcuschi (2006), e para as transcrições dos textos, nos fundamentamos nos princípios da Paleografia e da Crítica Textual, por meio da apresentação de edição fac-similar dos textos e da transcrição diplomática, presentes em Castro (1997), Berwanger e Leal (2008), e Spina (1994). Os referenciais teóricos da pesquisa foram Bourdieu (2008), que desenvolve os conceitos de silenciamento, expropriação linguística e capital cultural e linguístico; Foucault (2000), que apresenta o conceito de língua binária e de invisibilização; Rama (2015), que aborda a noção de cidade letrada; Pêcheux, que discorre acerca das condições de produção do discurso e conceitua a noção de formações imaginárias; também Osakabe (1999), que retoma algumas questões propostas por Pêcheux, das quais o locutor deve levar em conta a imagem que faz do referente.

Palavras-chave: Ensino de Português; Estudantes Estrangeiros; Imagem de Língua; Internacionalização; Mobilidade Acadêmica.

Autoria: Selma Regina Olla Paes de Almeida

Orientação: Valdir Heitor Barzotto

Data da defesa: 17/05/2023

Sândi externo no Português do Libolo

Este estudo visa à investigação dos processos de sândi externo, especificamente no que diz respeito ao comportamento de fricativas alveolares e pós-alveolares em final de palavra e aos casos de sândi vocálico externo, no português falado no município do Libolo (doravante, PLB) em Angola. Dado que em outras variedades de português - a saber, o português europeu (PE) (FROTA, 2000; CRUZ, 2013; PAULINO, 2016), o português brasileiro (PB) (TENANI, 2002) e o português santomense (PST) (BALDUINO, 2022; BALDUINO; ARAUJO, 2023) - os processos de sândi externo são condicionados por restrições prosódicas, como fronteiras de domínios prosódicos, nossa hipótese é que o condicionamento a essas restrições também possa ser verificado na variedade de português falada no Libolo. Assim, propomo-nos a investigar quais são os domínios prosódicos relevantes na ocorrência de fenômenos de sândi externo para o PLB. Para o alcance de nosso objetivo e para a investigação de nossa hipótese, foram realizadas as seguintes tarefas: (i) a transcrição de áudios e a segmentação em palavras, por meio dos softwares ELAN (HELLWIG; GEERTS, 2013) e PRAAT (BOERSMA; WEENINK, 2018), de dois corpora de fala espontânea do português do Libolo; (ii) a análise perceptual e acústica das ocorrências de vozeamento de fricativas alveolares e pós-alveolares em fronteira de palavra e de sândi vocálico externo; (iii) a investigação dos domínios prosódicos nos quais houve a ocorrência ou impedimento dos referidos fenômenos; e (iv) a comparação dos resultados obtidos para o PLB com os resultados descritos na literatura sobre os mesmos fenômenos para outras variedades de português, como o PB, o PE e o PST. Os resultados apontam que as fricativas envolvidas no processo de vozeamento em fronteira de palavra no PLB possuem restrições prosódicas semelhantes às variedades estudadas para o PE (FROTA, 2000; CRUZ, 2013). No entanto, no que diz respeito aos casos de sândi vocálico externo, há maior semelhança com o PB (TENANI, 2002) e o PST (BALDUINO, 2022; BALDUINO; ARAUJO, 2023), já que esse processo não tem um domínio específico de aplicação no PLB, assim como ocorre nestas variedades de português.

Palavras-chave: Domínios Prosódicos; Fonologia; Português do Libolo; Sândi Externo.

Autoria: Denise Rocha Santos

Orientação: Flaviane Romani Fernandes Svartman

Data da defesa: 10/05/2023

Corpo, língua e voz em manuais e vídeos instrucionais no campo da oratória

A presente dissertação tem como objetivo responder às seguintes questões: o que se diz e como se diz sobre o corpo, a língua e a voz humana e como são formulados os enunciados a seu respeito a partir da abordagem de Bakhtin e do Círculo? Para responder a essas questões selecionamos um corpus: constituído de dois manuais instrucionais: Curso de oratória moderno, de Alfeu Gomes Pepes (1984); Vença o medo de falar em público, de Reinaldo Polito (1995); e dois vídeos veiculados ao Youtube: Como Aprendi a Falar Bem em Público, de Mario Sergio Cortella (2018); Técnica Relâmpago Como perder o Medo de falar em Público, de Luciano Coppini (2014). A partir de nossas análises depreendemos os discursos acerca das práticas de fala pública nesses enunciados. Essas práticas indicam tanto a materialização de tendências ideológicas quanto os meios de comunicação e as tecnologias utilizadas em cada época. É nas relações dialógicas que se constituem os critérios e os padrões do que é falar bem em público. Em nossas análises, nos valemos de alguns pressupostos teórico-metodológicos postulados pelos autores do Círculo de Bakhtin, presentes nas obras O método formal nos estudos literários: uma introdução crítica a uma poética sociológica, de Medviédev (2012 [1928]); Marxismo e Filosofia da Linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem de Volóchinov ([1929] 2017) e Os gêneros do discurso, de Bakhtin (2016 [1952-1953]).

Palavras-chave: Círculo de Bakhtin; Manuais; Oratória; Vídeos.

Autoria: Cássia dos Santos

Orientação: Sheila Vieira de Camargo Grillo

Data da defesa: 04/05/2023

"Por quais estátuas os sinos do nosso luto dobram?":construindo o argumentário do dissenso em torno de monumentos racistas e colonialistas no Brasil

Em 2020, George Floyd, um ex-segurança negro, foi morto em uma abordagem policial violenta e sem apresentar qualquer resistência. As imagens se espalharam pelas mídias digitais causando indignação, revolta e mobilizando milhares de pessoas às ruas de diversas cidades ao redor do mundo. Tais protestos, permeados por reivindicações antirracistas e anticolonialistas, aconteceram a despeito das restrições impostas pela crise sanitária de Covid-19 e logo se voltaram contra símbolos presentes no espaço público que, em maior ou menor grau, e materializavam discursos ligados à supremacia racial e colonial. Um marco desse movimento fora a derrubada da estátua de Edward Colston, em Bristol, na Inglaterra, por sua associação com o tráfico de pessoas negras para trabalharem em regime de escravidão. No Brasil, um dos principais desdobramentos dessas mobilizações foram as intensas discussões sobre o espaço público ocorridas tanto nas mídias tradicionais quanto nas mídias digitais. Frente à proporção dos protestos e da relevância social de tal debate, buscamos a partir da análise de dez artigos de opinião publicados na Folha de S.Paulo em junho de 2020, mês no qual os protestos estavam no auge mapear e construir o argumentário das distintas posições instanciadas a partir da questão prática que nucleia a disputa: O que fazer com monumentos ligados ao racismo e ao colonialismo que ocupam o espaço público? Para alcançarmos tal objetivo, partimos (i) da identificação das questões que emergiam no debate (PLANTIN, 2008), considerando a distinção entre argumentação prática e epistêmica debatida por Macagno (2015), Walton e Macagno (2015, 2019) e Gonçalves-Segundo (2020b, 2021d); (ii) da reconstrução de argumentos práticos e epistêmicos a partir da teoria dos esquemas argumentativos segundo a proposta de Macagno (2015) e Walton e Macagno (2015, 2019), em diálogo com as discussões realizadas no Brasil por Gonçalves-Segundo (2021a, 2021b, 2021c, 2022), Gonçalves-Segundo e Isola-Lanzoni (2021) e da Silva (2022); (iii) da detecção dos focos de acordo e desacordo na discussão, a partir das teorizações de Perelman e Olbrechts-Tyteca (2006 [1958]), Reboul (2004) e Fogelin (2005); (iv) da construção gráfica do argumentário a partir das considerações de Gonçalves-Segundo (2021b). Como resultado, pudemos identificar que a discussão se sustenta em um eixo pró e contra a manutenção (da forma como está) de monumentos ligados ao racismo e ao colonialismo no espaço público. Enquanto o lado pró-manutenção sustenta suas argumentações especialmente com base no direito à memória e na defesa do patrimônio público, o lado anti-manutenção parte da desigualdade na representação de minorias sociais, em especial da população negra e dos povos indígenas, não apenas no tocante a homenagens no espaço público, mas também no desequilíbrio de poder que ainda se desdobra na continuidade da violência histórica contra essa parcela da população brasileira. Em termos dos esquemas argumentativos privilegiados, destacamos que o lado pró-manutenção se vale especialmente de argumentos epistêmicos por exemplificação, analogia e sinal, o que evidencia uma argumentação de caráter mais reativo, ao passo que o lado anti-manutenção se vale principalmente de argumentos práticos, com destaque aos argumentos de raciocínio prático instrumental, por consequências negativas e por valor. Ademais, observamos que há desacordos epistêmicos relevantes entre os lados, como o que envolve o conceito de revisionismo histórico, mas também há acordos importantes, como a defesa da preservação do Monumento às Bandeiras na capital paulista, lastreada no compartilhamento da importância do valor artístico (estético) para decisões relativas à manutenção de monumentos no espaço público.

Palavras-chave: Argumentação; Colonialismo; Esquemas argumentativos; Polêmica; Racismo.

Autoria: Thabata Dias Haynal

Orientação: Paulo Roberto Gonçalves Segundo

Data da defesa: 28/03/2023

Subsídio voluntário: diplomática contemporânea e a contextualização de documentos setecentistas de Minas Gerais

O códice registrado no Arquivo do Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo como AL014, formado por documentos diplomáticos setecentistas, corpus desta pesquisa, é analisado com base no caminho percorrido desde a sua produção, em sedes administrativas, até o seu uso como objeto de estudo científico, social e cultural, nos arquivos permanentes. O objetivo, na primeira parte, consiste na apresentação do códice e dos manuscritos, da sua história e materialidade e da análise formal desses documentos diplomáticos de arquivo, considerados individualmente, pela metodologia da Diplomática, a partir da identificação dos elementos externos, intermediários e internos que os constituem, de maneira a obter-se, como resultado, a demonstração da compatibilidade entre sua estrutura formal e sua natureza jurídica. Na segunda parte desta dissertação, aborda-se o segundo testemunho dos documentos, abrigado no Arquivo Histórico Ultramarino, sob a perspectiva do conceito conhecido como archival bond, definido como a rede de relações que cada registro possui com os registros do mesmo fundo documental. Neste trabalho, utiliza-se da metodologia da análise tipológica, ou Diplomática contemporânea, para verificar sua autenticidade em relação ao contexto orgânico em que os documentos estão inseridos, para demonstrar, como resultado, a narração inédita dos trâmites realizados desde a metrópole, para o estabelecimento do subsídio voluntário nas Capitanias do Brasil, mais especificamente na Capitania de Minas Gerais e na Vila Real de Sabará, de onde parte a Representação de 1777, que reivindica o fim da cobrança desse imposto.

Palavras-chave: Diplomática contemporânea; Subsídio voluntário; Testemunhos manuscritos setecentistas; Vila Real de Sabará; Vínculo arquivístico.

Autoria: Maria de Fatima Nunes Madeira

Orientação: Marcelo Módolo

Data da defesa: 24/03/2023

Mulher meretriz, escandalosa e de baixa esfera: estudo filológico e edição do Sumário contra Antônia Maria de Almeida por desacato ao Santíssimo Sacramento

O Sumário de Antônia Maria reúne denúncias, interrogatórios, diligências, os termos de juramento e encerramento que envolvem os interrogatórios e a sentença do caso de Antônia Maria de Almeida, acusada por conhecidos de ter em sua posse uma partícula de hóstia consagrada. O caso ocorre na Capitania de Minas Gerais, nos últimos anos do século XVIII. Entre idas e vindas entre a colônia portuguesa e o Reino, as investigações duram aproximadamente quatro anos. Salvaguardado atualmente no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, o Sumário nos fornece material tanto para estudos históricos quanto filológicos. Na primeira parte, apresentamos uma contextualização histórica da Capitania de Minas Gerais no século XVIII. A seguir, contextualiza-se o Tribunal do Santo Ofício e sua atuação a partir do Regimento de 1774, influenciado pelo Iluminismo e significativo para mudanças em seu funcionamento. Ao final da primeira parte nos concentramos na denunciada, Antônia Maria, e no caráter de seus supostos crimes, verificando como eles expressam uma religiosidade característica da época e do lugar onde ela vivia. Na segunda parte, apresentamos as edições fac-similar e semidiplomática do Sumário. Segue-se a análise paleográfica do punho de seus principais autores, José Teixeira Camargo, vigário da Vara de Pitangui, e seu escrivão João Pereira Guimarães, e o notário do Santo Ofício, Miguel Martins de Azevedo. Por fim, apresentamos uma análise diplomática das partes que compõem o Sumário e breves comentários codicológicos sobre o manuscrito. Pretendeu-se, no presente estudo, contribuir tanto para a pesquisa linguística, na medida em que se publica uma edição conservadora do documento, quanto para a história das Minas Gerais colonial, tendo como perspectiva de olhar sobre o texto a Filologia e as disciplinas por ela abarcadas, consideradas indispensáveis ao fazer histórico. Além disso, os resultados das análises paleográfica e diplomática podem auxiliar na composição de um panorama sobre as práticas de escrita e de leitura na América Portuguesa, ainda em elaboração

Palavras-chave: Filologia; História; Inquisição moderna; Minas Gerais; Século XVIII.

Autoria: Nicólli de Lima Garcia

Orientação: Vanessa Martins do Monte

Data da defesa: 08/03/2023

Punho de mulher: um estudo filológico sobre cartas de mulheres na América Portuguesa (1737-1821)

Quando nos referimos ao período da colonização portuguesa no Brasil, tratamos de um contexto em que a alfabetização e a escolarização feminina eram quase inexistentes. Consequentemente, são bastantes raras as fontes primárias escritas por um punho de mulher, sobretudo as que sobreviveram ao tempo e chegaram aos dias atuais. Partindo dessa premissa, a presente dissertação tem como objetivo reunir, editar e estudar um conjunto de 37 cartas escritas por mulheres na América Portuguesa, entre os anos de 1737 a 1821. Os estudos desenvolvidos tiveram como motivações principais entender quem foram as autoras dessas missivas, qual a habilidade de escrita elas possuíam e como essas remetentes construíram seus manuscritos; para isso, usaram-se métodos da codicologia, da paleografia e da diplomática. Com o estudo codicológico, buscou-se descrever os tipos de papel utilizados e como eles foram aproveitados. Já em relação à paleografia, tivemos como objetivos estabelecer os alfabetos das remetentes, sistematizar as abreviaturas empregadas, analisar as assinaturas e investigar os documentos a partir dos critérios definidos por Marquilhas (2000) e Santiago (2019) como característicos de mãos inábeis. Por fim, a análise diplomática se preocupou em estudar os padrões estruturais empregados nas cartas e como eles se aproximam ou se distanciam dos modelos descritos na bibliografia consultada, sobretudo em Bellotto (2002) e Monte (2015). Em relação às edições, prepararam-se dois tipos de apresentação, ambas acompanhadas dos fac-símiles: edições semidiplomáticas, presentes nesta dissertação, e edições virtuais, publicadas online. O levantamento sócio-histórico a respeito das autoras do corpus mostrou que a maioria delas ocupava posições de privilégio na sociedade colonial, o que justifica o fato dessas mulheres terem aprendido a ler e a escrever. Esse conhecimento da escrita reflete os resultados obtidos nas análises realizadas: quando tratamos das remetentes que redigiram os manuscritos estamos nos referindo, majoritariamente, a mãos hábeis e que possuíam conhecimento das estruturas composicionais das missivas. A partir da pesquisa desenvolvida, obtivemos dados que podem trazer informações importantes para o estudo das cartas e da história das mulheres na América Portuguesa. Além disso, há a contribuição trazida pelos manuscritos em si mesmos e pelas edições, uma vez que o labor filológico, aliado às humanidades digitais, possibilita que mais pessoas tenham acesso às palavras de mulheres que ficaram registradas nos fólios.

Palavras-chave: América Portuguesa; Cartas; Filologia; História das mulheres; Humanidades digitais.

Autoria: Beatriz de Freitas Cardenete

Orientação: Vanessa Martins do Monte

Data da defesa: 27/01/2023

 

 

Defesas no ano de 2022

 

Teses de Doutorado

O léxico caipira: tesouro da língua às margens do Anhembi
Resumo: Esta pesquisa tem como objetivo discutir pontos de convergência semântico-lexicais, através de um estudo comparativo entre as unidades lexicais encontradas nas falas de indivíduos do interior do Estado de São Paulo, região Médio Tietê, e as lexias do Galego, estas fornecidas pelo Atlas Linguístico do Galego, volume V, campo semântico "O ser humano". Pretendeu-se, sobretudo, responder às seguintes questões: que fatores externos estariam influenciando o uso de certas formas em um determinado grupo de falantes? Os falantes idosos usariam lexias mais próximas ao Galego? As unidades lexicais listadas no ALGA1 seriam recorrentes no Brasil? Teriam elas tendência à manutenção ou ao desuso? Para responder a estas questões, como aporte teórico-metodológico, utilizaram-se os pressupostos da Dialetologia, Lexicologia e Sociolinguística Variacionista, por meio dos quais foi possível constituir um corpus atualizado do dialeto caipira falado no interior do Estado de São Paulo e coletado em Tietê, Santana de Parnaíba, Itu, Sorocaba, Porto Feliz, Pirapora do Bom Jesus, Capivari e Piracicaba, cidades historicamente vinculadas ao movimento das Bandeiras Paulistas. Em sua caminhada rumo a Cuiabá para desbravar terras, os bandeirantes saiam da capital paulista e seguiam a rota do rio Tietê (Anhembi). Nesse trajeto, os desbravadores levavam sua Língua Falada - o dialeto caipira - e sua cultura para o interior, eventos sócio-históricos relevantes para esta pesquisa. Emergiram, ainda, outros aspectos significantes, como a possibilidade de ineditismo deste estudo e a necessidade de se desenvolverem mais pesquisas comparativas entre o léxico do Português do Brasil e o do Galego. Os resultados apontaram semelhanças semânticas entre os corpora na razão de 82,4%, e também a tendência ao desuso de lexias convergentes, fatos que comprovaram estarem os jovens utilizando menos as formas próximas ao Galego e as mulheres tendendo a conservar e inovar as lexias. A investigação possibilitou compor um corpus linguístico para futuras pesquisas, traçar um percurso histórico inverso, durante o qual se observou o estágio de língua atual, identificar semelhanças entre o Português Brasileiro falado no interior de São Paulo e o Galego, e vislumbrar uma origem comum para ambas as línguas.
Palavras-chave: Atlas Linguístico do Galego; Convergência semântico-lexical; Português Brasileiro; Questionário Semântico Lexical; Unidades lexicais.
 
Data da defesa: 21/02/2022
Entre o revelar e o ocultar: análise e modernização do discurso das Antunes no "Livro das Reconciliações e Confissões" (1591 1592)
Resumo: O objetivo deste trabalho é propor uma metodologia de análise para a modernização de documentos, alinhando a Análise Crítica do Discurso (FAIRCLOUGH, 2001, 2003) - doravante ACD - e a Teoria da Avaliatividade (MARTIN; WHITE, 2005) à Filologia. O corpus consiste nas confissões de seis mulheres da família Antunes editadas por Mota (2016) e registradas no Primeiro Livro das Reconciliações e Confissões (1591- 1592), doravante LRC. São elas: Ana Rodrigues, Beatriz Antunes, Dona Leonor, Dona Custódia, Isabel Antunes e Ana Alcoforado. Estes documentos foram produzidos em 1591, durante a passagem do Santo Ofício pela Bahia, momento em que mulheres cristãs novas foram perseguidas e acusadas da heresia de praticar o judaísmo. Diante dos procedimentos da Inquisição, a única possibilidade de salvar-se era confessando aquilo que o Santo Ofício desejava ouvir. Em consequência, suas vozes aparentavam ser mecânicas nos documentos, visto que se silenciam em um jogo de ocultar e revelar informações. As confissões foram redigidas em Português Médio e apresentam uma rígida estrutura documental, pois tinham grande valor jurídico para o Tribunal do Santo Ofício. Foram registradas sob o discurso indireto do notário aparentando imparcialidade, mas eram compostas pelo cruzamento de três vozes: notário, visitador e depoentes. O notário por meio do discurso indireto controla o enquadramento da perspectiva entre as vozes. Mesmo considerando estes aspectos, faz-se necessário buscar para além dos silêncios registrados nesses documentos. Desse modo, os desafios deste trabalho consistiram em identificar, dentro da rígida estrutura composicional, as vozes do notário, do visitador e das depoentes, bem como depreender as entrelinhas dos discursos das Antunes e fazê-las transparecer nas modernizações. Para uma melhor interpretação das vozes das Antunes foi utilizada a teoria da Análise Crítica do Discurso (FAIRCLOUGH, 2001, 2003), bem como a Teoria da Avaliatividade (MARTIN; WHITE, 2005). Como suporte teórico para orientar os critérios de modernização e uniformização das confissões recorreu-se à Cambraia (2005), Castro e Ramos (1981), bem como à Motta e Monte (2019). A metodologia utilizada consiste na elaboração de mapas composicionais das confissões. Nos mapas composicionais sobrepõe-se o efeito de cruzamento, enquadramento das vozes e a estrutura composicional das confissões analisados sob a perspectiva da ACD (FAIRCLOUGH, 2001, 2003) - às relações entre as vozes, aos tipos e à intensidade dos sentimentos expressos nos pressupostos sistematizados com base na Teoria da Avaliatividade (MARTIN; WHITE, 2005). Os mapas viabilizam uma leitura sistemática e profunda das confissões, revelando detalhes e nuances que, por fim, transparecem nas modernizações por meio das escolhas na grafia, no vocabulário e no gênero discursivo. Assim, a leitura realizada sob a ótica das análises discursivas é aliada às edições diplomáticas realizadas por Mota (2016) e permite uma melhor identificação das nuances das vozes das depoentes que são preservadas e evidenciadas na modernização. Portanto, esta tese contribui com uma metodologia de análise e modernização de documentos, alinhando a Filologia a teorias como a Análise Crítica do Discurso (FAIRCLOUGH, 2001, 2003) e a Teoria da Avaliatividade (MARTIN; WHITE, 2005).
Palavras-chave: Análise Crítica do Discurso; Cristãs novas; Edição filológica modernizada; Mapas Composicionais; Primeiro Livro das Reconciliações e Confissões (1591- 1592).
 
Data da defesa: 07/04/2022
Evidências socioculturais e implicações identitárias na Paisagem Linguística do Chinês como Língua de Herança no Brasil
Resumo: Esta tese tem como objetivo pesquisar as socioculturas evidenciadas no contexto do Chinês como Língua de Herança no Brasil, convencionalmente concebido como Huayu, que tem sido ensinado, desenvolvido e herdado na comunidade imigrante chinesa no território brasileiro, especialmente na cidade de São Paulo, bem como as implicações identitárias, sob as perspectivas de Paisagem Linguística (LANDRY; BOURHIS, 1997; GORTER, 2006; GORTER; CENOZ, 2007; SHOHAMY; GORTER, 2009; JAWORSKI; THURLOW, 2010; BLOMMAERT, 2013; MELO-PFEIFER; LIMAHERNANDES, 2020), superdiversidade (VERTOVEC, 2007; BLOMMAERT; RAMPTON 2011) e as premissas cognitivo-funcionais (GIVÓN, 1995, 2005). Utilizei métodos de coleta de dados variados, tais como questionário, entrevista e desenho de árvore genealógica, a partir dos quais alguns filhos de imigrantes chineses que estão estudando chinês nas huaxiao (escolas comunitárias chinesas) em São Paulo, e os dados coligidos foram analisados de forma quantitativa e qualitativa, de modo a evidenciar que a Paisagem Linguística do Chinês como Língua de Herança no Brasil constitui-se marcada pela superdiversidade sociocultural, evidenciada pelos seus falantes de herança num continuum que envolve alguns critérios relevantes: família chinesa, huaxiao, e até nomes desses sino-brasileiros. As implicações de identidades são refletidas pela hibridez paralelamente verificada no nome pessoal e no grau de pertencimento cultural à nação chinesa.
Palavras-chave: Chinês como Língua de Herança; Hibridez; Iconicidade; Identidades; Paisagem Linguística; Paradoxos; Sociocultura; Superdiversidade.
 
Autoria: Xiang Zhang
Data da defesa: 18/04/2022
Entre termos e atas: produção documental na Câmara de Santana de Parnaíba (1679-1839)
Resumo: Esta tese se realiza a partir de um corpus formado por 12 livros manuscritos oriundos da Câmara de Santana de Parnaíba, Brasil, datados entre 1679 e 1839. Nas capas e nas lombadas desses códices, são encontradas etiquetas de identificação nas quais lemos "Livro de Atas". No entanto, seu conteúdo, até abril de 1829, é composto por documentos intitulados como "termo". O objetivo do trabalho é, portanto, apurar as razões que levaram à etiquetagem que aponta, nesses livros, para uma espécie documental diferente daquela que eles realmente abrigam. Tendo em vista a natureza jurídico-administrativa dos documentos e o fato de o problema detectado residir na divergência entre sua denominação original (termo) e a sua identificação tardia materializada por etiquetas (ata), adotamos, dentre as chamadas "disciplinas filológicas", o referencial teórico-metodológico da Diplomática. Analisamos, assim, os elementos internos das referidas espécies documentais a fim de estabelecermos pontos de aproximação e de distanciamento entre elas. Em seguida, sob a luz de princípios e conceitos arquivísticos, examinamos as camadas de informação observadas nas etiquetas para compreendermos fatores de sua produção e afixação nos livros. Os resultados mostram que, do ponto de vista interno, os termos passam por alterações estruturais reveladoras de uma mudança no grau de sua representatividade jurídica, a qual os equipara as atas que os substituem. Já com relação aos elementos externos, os diferentes processos de etiquetagem podem ser datados entre meados dos Oitocentos e as primeiras décadas do século XX. Concluímos que a referida divergência entre denominações é, por um lado, consequência da similaridade entre termos e atas, e, por outro, causa do apagamento do primeiro na produção científica relativa às Câmaras.
Palavras-chave:Câmaras municipais; Diplomática; Espécies documentais; Filologia.
 
Data da defesa: 20/04/2022
Fonologia do português de São Tomé e Príncipe
Resumo: O objetivo desta tese é descrever e analisar a fonologia de duas macrovariedades que emergiram e são faladas em São Tomé e Príncipe (stp): o português de São Tomé (pst) e o português do Príncipe (pp). O surgimento dessas variedades, no arquipélago, remonta ao estabelecimento colonial do português em um ambiente plurilíngue, bem como ao seu desenvolvimento inicial como segunda língua, e, posteriormente, como língua materna adquirida pelos nativos. Nos últimos anos, a língua portuguesa se consolidou como majoritária em stp em detrimento às línguas autóctones e demais línguas locais. Após 1975, o português foi transmitido pelas gerações mais velhas, tornando-se a língua materna da maior parte da população de stp - fato que possibilitou a emergência de variedades singulares do português. Considerando esse cenário, buscamos como propósitos específicos: (i) propor uma fonologia unificada para o pst e para o pp; (ii) elencar alguns aspectos fonéticos que possam diferenciar tais variedades; (iii) analisar fenômenos vocálicos como alçamento, harmonia e nasalização vocálica; (iv) examinar fenômenos consonantais que atingem as líquidas da coda, tais como o apagamento do rótico e da lateral e a vocalização e velarização de /l/ e, por fim, (v) estudar processos de sândi vocálico externo como a degeminação, elisão e ditongação. Para tanto, compilamos os fenômenos fonológicos nas variedades em foco, a partir de dados de fala espontânea coletados in loco a partir de entrevistas conduzidas com sujeitos falantes nativos de língua portuguesa de diferentes sexos e idades. Posteriormente, aplicamos testes, como elicitação de dados com auxílio de imagens, assim como repetição da frase-veículo "Eu falo X baixinho" de modo a ampliarmos o corpus. A primeira etapa nos auxiliou na identificação dos fenômenos analisados e das possíveis variáveis linguísticas envolvidas nos processos. Já a segunda fase foi essencial para examinarmos e testarmos as hipóteses preliminares mediante a implementação de modelos de regressão linear e logísticas realizados no Rbrul. Todos os dados foram, além disso, analisados no Praat para delimitarmos, acusticamente, a ocorrência ou não dos fenômenos analisados considerando diferentes parâmetros fonéticos. Isso feito, propomos uma análise fonológica aos dados norteados por uma perspectiva analítica, sobretudo, não-linear. Os modelos teóricos adotados foram: a fonologia autossegmental; a geometria de traços; a fonologia prosódica e a teoria da sílaba. A análise dos dados com o auxílio de métodos fonéticos e dos modelos supracitados nos permitiu descrever diferentes aspectos estruturais sonoros do português de São Tomé e Príncipe (pstp), como as consoantes e vogais que compõem seu quadro fonológico, a estrutura silábica, o acento, entre outros fatores diretamente relacionados aos fenômenos fonológicos em foco. A descrição fonotática geral do pst e do pp, incluindo os processos fonológicos vocálicos e consonantais, permite, assim, uma compreensão mais ampla das macrovariedades de stp, demarcando as características inerentes do pstp, bem como aspectos compartilhados com outras variedades da língua portuguesa.
Palavras-chave: Fonética, Processos Fonológicos; Fonologia; Português de Príncipe; Português de São Tomé.
 
Data da defesa: 29/04/2022
O discurso infantil em ditaduras nacionalistas: as relações de poder entre criança e adulto no Estado Novo e na Alemanha Nazista
Resumo: O presente trabalho busca propor uma metodologia de análise discursiva para investigar a maneira como contextos políticos de ditaduras nacionalistas são apreendidos, organizados e constituídos cognitiva e linguisticamente em discursos midiáticos voltados ao público infantil. Visamos defender a tese de que produções midiáticas veiculadas durante um governo totalitário têm seus discursos fortemente enviesados, no que se refere à apreensão, construção e organização do contexto sociopolítico em que foram publicados. Para isso, pautamo-nos, sobretudo, na hipótese de que há uma diferença entre a representação discursiva de crianças e adultos nesses textos, a qual pode ser aferida estatisticamente com base em estudos da Linguística Cognitiva, Linguística Sistêmico-Funcional e estudos discursivos. Para tanto, selecionamos textos de autoria atribuída a crianças e jovens, localizados em dois periódicos - "Hilf mit!", jornal alemão de leitura obrigatória nas escolas no período do regime nazista; e "O Tico-Tico", revista infantil que circulou no Brasil no período do Estado Novo. Buscamos observar, nesses discursos, que papéis discursivos são construídos entre crianças e adultos a partir da seleção dos sistemas de transitividade em tais textos. Para isso, tomamos como aparato teórico, os conceitos de Linguística Cognitiva de Taylor (2002), Morato (1996, 2016) e Marcuschi (2002, 2007), e de Filosofia da Linguagem, como Humboldt (2006 [1807]) e Milani (2000,2007); em relação aos estudos de Contexto e Discurso, buscamos respaldo em autores da Linguística Sociocognitiva no Brasil, como Marcuschi (1999, 2002, 2005, 2007), Aquino (1997) e da Análise Crítica do Discurso como van Dijk (2006) e seus seguidores. No que se refere aos estudos de Linguística Sistêmico-Funcional e sua relação com a Linguística Cognitiva, este trabalho se baseia nas pesquisas de Halliday e Matthiessen (2004), Langacker (2008), Lavid, Arús e Zamorano-Mansilla (2010) e Gonçalves-Segundo (2015). Visando alcançar nosso objetivo, procedemos à análise do sistema de transitividade dos textos, tendo em vista gerarmos um banco de dados. Os métodos quali-quanti foram utilizados para sustentação da análise comparativa entre os dois corpora. Os resultados evidenciados em nossa análise apontam para a presença de uma correlação entre o papel social exercido pelos participantes e seu respectivo Potencial de Transformação, indicando uma hierarquização entre crianças e adultos no periódico alemão, ao passo que, na revista brasileira, tal correlação de hierarquia não foi observada.
Palavras-chave:Contexto; Discurso Infantil; Estado Novo; Metodologia; Nazismo.
 
Data da defesa: 29/04/2022
A descortesia nos atos de fala no romance Meu Destino é Pecar, de Nelson Rodrigues
Resumo: A pesquisa parte da hipótese de que as emoções negativas provocam outras emoções, fazendo com que alguns falantes tenham poder absoluto durante os atos de fala. Nesse sentido, a descortesia faz parte dos discursos dos personagens que desejam obter poder em suas falas, ameaçando a imagem de outros (GOFFMAN, 1970). Dessa maneira, este trabalho tem por objetivo verificar de que forma os efeitos de descortesia são causados nos interlocutores, diante de enunciados proferidos pelos personagens do meio familiar. Busca-se analisar enunciados de personagens masculinas e femininas do romance Meu Destino é Pecar, de Nelson Rodrigues, a fim de mostrar as estratégias e táticas de descortesia empregadas pelos falantes, bem como analisar se houve descortesia interpretada e qual é o efeito dela de acordo com o contexto de interação.Com o auxílio do contexto histórico e do contexto específico, foi possível traçar características dos personagens e entender as táticas utilizadas para expressar descortesia, a fim de obter e manter poder e status social, como também forma de acentuar o patriarcado da época. Quanto ao aparato teórico, partimos dos conceitos de contexto descrito por Van Dijk (2012), e da teoria dos atos de fala Austin (1965). Para mostrar o efeito e a intensificação da descortesia, apoiamos nos aportes teóricos de Culpeper (2011) e de Kaul de Marlangeon (2012), de quem falamos das tipologias da descortesia por fustigação e da sonegação de cortesia esperada pelo ouvinte para análise do corpus. Assim sendo, a pesquisa tem contribuição para os enunciados descorteses, bem como as estratégias e táticas de descortesia com o objetivo de reforçar o patriarcado da época e o dano psíquico ao outro. Procurou-se também mostrar os dados quantitativos dos tipos de descortesia mais empregados pelos falantes, além da interpretação e da reação do ouvinte que contribuíram para analisar os efeitos mais descorteses de acordo com a cultura da época.
Palavras-chave: Descortesia; Imagem; Imagem social; Interação; Patriarcado.
 
Orientação: Luiz Antonio da Silva
Data da defesa: 16/05/2022
O Nheengatu de São Paulo (Língua Geral ou Língua Brasílica): para uma Reconstrução da Área Linguística das Capitanias de São Vicente e de São Paulo
Resumo: Nesta tese, a partir de um dicionário manuscrito (MOTTA, 1972), que é editado na segunda parte do trabalho, argumenta-se que a Língua Geral de São Paulo - denominada de Nheengatu de São Paulo a partir do título do manuscrito (MOTTA, 1972) - seja uma língua formada por contato linguístico. A fim de que o termo "Nheengatu de São Paulo" apreendido em Motta (1972) pudesse ser cimentado, parte da pesquisa foi ancorada em trabalhos de historiadores, geógrafos, sociólogos e arqueólogos como atestam os capítulos 1, 2 e 3 da tese em que são apresentados respectivamente: (i) um panorama sócio-histórico etnográfico da região chamada "Capitania de São Paulo"; (ii) uma proposta de reconstrução da área linguística: Capitanias de São Vicente e de São Paulo; (iii) uma resenha da literatura sobre o termo Nheengatu de São Paulo (Língua Geral ou Língua Brasílica). Embora a questão da interdisciplinaridade tenha sido levada em conta para o fortalecimento da tese sobre o Nheengatu de São Paulo, é importante mencionar que a pesquisa se centrou na linguística. Assim, no capítulo quatro da tese, tendo como base as áreas nucleares da linguística: fonologia, morfossintaxe, semântica e pragmática e de uma breve abordagem sobre a linguística de contato, buscou-se: (i) a explicitação de alguns fenômenos linguísticos do Nheengatu de São Paulo; (ii) corroborar a inserção do Nheengatu de São Paulo, em conjunto com outras seis línguas no contexto das línguas ameríndias de contato da costa brasileira. No capítulo cinco, evidenciam-se três territórios de português caipira com base em trabalhos linguísticos; o foco do capítulo insere-se no território de português caipira denominado de território I. Assim, resenhas de dois trabalhos diretamente relacionados à tese são apresentadas; o enfoque desses trabalhos baseia-se em dois fenômenos linguísticos do português caipira: (i) o /r/ retroflexo e (ii) o modo irrealis que são vistos como evidências da "interferência" do Nheengatu de São Paulo no português caipira.
Palavras-chave: Nheengatu de São Paulo; Nheengatu de São Paulo como língua de Contato; Português Caipira.
 
Data da defesa: 23/06/2022
Na vitória e na derrota, padrões linguísticos de técnicos de futebol
Resumo: Este trabalho visa a apresentar uma análise sobre o padrão linguístico de cento e trinta e sete textos que transcrevem entrevistas de vinte e seis técnicos de futebol, após um jogo, seja da seleção brasileira na Copa do Mundo e na Copa América, seja de clubes da elite do futebol brasileiro nos campeonatos estaduais, na Copa do Brasil, no Campeonato Brasileiro, na Copa Sul-americana, na Copa Libertadores, no Mundial de Clubes, quando esses profissionais do futebol expõem seus pensamentos em contextos antagônicos, isto é, quando sua equipe vence ou quando ela perde o jogo recém encerrado. Para tanto, são elaborados onze critérios linguísticos, norteados no sistema sociossemântico desenvolvido a partir da linguística sistêmico-funcional de Halliday. Em planilhas apartadas de Excel, realizam-se o cadastramento e a divisão em orações do texto analisado, quando cada tópico e cada subtópico dos critérios linguísticos estabelecidos são identificados e contabilizados. Por meio da ilustração com tabelas comparativas e da farta exemplificação com orações do corpus, demonstra-se, critério por critério, se há igual ou diferente padrão linguístico em cada elemento linguístico cotejado. Por fim, apresenta-se, de modo panorâmico e de maneira detalhada, cada um dos padrões linguísticos, obtidos pela ocorrência ou pela não ocorrência de diferença estatisticamente relevante de cada tópico dos critérios linguísticos estabelecidos. Do resultado deste estudo, pode-se verificar que há diferença estatisticamente significativa na investigação comparativa dessas entrevistas, após resultado esportivo oposto, quanto ao emprego da metafunção experiencial, da polaridade da oração, da voz verbal, do tempo e do modo verbal, da pessoa do discurso, da classificação semântica do verbo modal, da classificação das ideias empregadas no Tema, do tipo de Tema marcado da oração. Contudo, no que se refere à quantificação do número de palavras da oração, à existência de conectivo oracional e à presença de ideia nova, não há diferença estatisticamente relevante em nenhuma das situações analisadas. Dessa forma, observa-se que ocorre variação estatisticamente relevante em 73% dos critérios analisados em entrevistas após derrotas.
Palavras-chave: Entrevista coletiva; Futebol; Linguística; Padrão linguístico.
 
Orientação: Marcelo Módolo
Data da defesa: 16/11/2022

Dissertações de Mestrado

Marcação de plural: um estudo semântico de classe nominal do pepel
Resumo: Pretende-se com esse estudo descrever e analisar prefixos de plural no sistema de categorização nominal do pepel. O pepel pertence ao subgrupo Bak da subfamília Atlântica do tronco Níger-Congo. Nesse sistema, as línguas apresentam morfemas de classe, isto é, afixos que determinam o gênero a que pertencem o nome e a sua concordância com os demais elementos da frase. Como grupo Bak faz parte dessa família, seu sistema também se comporta dessa maneira. Buscamos apoio teórico em Ndao (2011; 2015) que fez a descrição da fonologia, da morfologia e da sintaxe do pepel; e nos trabalhos dos autores que descreveram o sistema de classificação nominal das línguas em geral e em particular das africanas, principalmente da família Níger- Congo em que está inserido o ramo Atlântico. Entre esses autores destacam-se Pozniakov (2013), Aikhenvald (2000) e Creissels (2015). A metodologia é qualitativa exploratória com base na pesquisa bibliográfica. A análise dos dados apoia-se nos modelos de protótipo de categoria dos cognitivistas, principalmente, de Lakoff (1986, 1987), entre outros.
Palavras-chave: Classe nominal; Gênero; Guiné-Bissau; Língua pepel; Níger-Congo.
 
Data da defesa: 03/03/2022
Emoldurando experiências: gerúndio como construção de tempos e de espaços em variedades do Português
Resumo: Na presente dissertação, descrevem-se os usos do gerúndio em três variedades do Português falado: PB (Português brasileiro), PM (Português Macaense) e PP (Português de Portugal), em termos de formas, funções e motivações. Tem-se como objetivo principal, portanto, investigar descrevendo e explanando os usos do gerúndio no Português falado, de modo a verificar se estes se alteram de acordo com motivações cognitivas e comunicativas e com a variedade (PB, PM, PP). Adota-se a uma perspectiva funcionalista cognitivista, por considerar-se que toda fala e escrita voluntária é revestida de funções cognitivas, portanto, as construções são descritas em termos de estrutura sintática, bem como os sentidos adjacentes a tais estruturas, e quais motivações cognitivas e comunicativas atuam em cada tipo de construção gerundial. Para isso, o corpus selecionado consiste em entrevistas extraídas de três rádios virtuais (TDM, TSF e UNESP), transcritas e agrupadas em padrões funcionais. Observa-se que o gerúndio é utilizado para codificar nuances de tempo e espaço que pode ser físico ou também mental como é o caso de um de nossos padrões funcionais, em que construções oracionais circunstanciais são utilizadas para criar um espaço de conhecimento comum entre os participantes da interação, em que são delineadas bases para o estabelecimento de referências. As construções mais abstratas descobertas foram as quais nomeamos de gerúndio como atos cooperativos, que emergem como uma abstratização do gesto de apontar. Nestes usos, atua o princípio funcionalista de iconicidade, no qual informações conhecidas e, portanto, rotinizadas, não precisam ser mencionadas, e categorias cognitivas mais abstratas englobam as mais básicas.
Palavras-chave: Abstratização; Funcionalismo; Gerúndio; Iconicidade; Variedades do português.
 
Data da defesa: 25/03/2022
A entrevista de Jair Bolsonaro ao Roda Viva: uma análise dialógica do discurso
Resumo: O objetivo desta dissertação é analisar, pelos conceitos de ideologia e de gêneros do discurso, como desenvolvidos pelo Círculo de Bakhtin, a entrevista de Jair Bolsonaro no programa Roda Viva de 30 de julho de 2018, a fim de revelar as matrizes ideológicas nos discursos do então deputado federal e candidato à presidência. Considerando que a entrevista em questão constitui um enunciado de um gênero discursivo que integra um contexto sócio-histórico-ideológico, objetiva-se identificar de que modo esse enunciado específico reflete e refrata as ideologias circulantes na sociedade brasileira. A partir da transcrição das falas, é possível identificar e analisar as matrizes ideológicas ali presentes, atentando-se para a expansão neoliberal, que leva a transformações na forma como o trabalho é organizado no Brasil, bem como ao contexto político de 2018. Uma vez que os enunciados são elos na cadeia discursiva, a metodologia refere-se a qualquer criação ideológica enquanto fato social, posicionado entre indivíduos sociais - o que permite a abordagem da linguagem enquanto objetiva, material e sígnica e, consequentemente, ideológica, coletivamente organizada e concreta. É também pelo método sociológico que procura-se ancorar as ideologias presentes no discurso do candidato ao seu contexto de produção, considerando-se seu desenvolvimento histórico, a divisão entre classes e a relação entre língua e ideologia, e o ideológico enquanto histórico. A análise metalinguística foi dividida entre a forma - os elementos estáveis do gênero - e os conteúdos temáticos abordados pelo entrevistado. Concluiu-se que o candidato transgride o gênero em seu estilo, mas mantém os temas tipicamente conservadores de oposição a movimentos sociais, militarização e manutenção da dominação de classe, matrizes ideológicas predominantes em seu discurso.
Palavras-chave: Análise dialógica do discurso; Bolsonaro; Círculo de Bakhtin; Ideologia; Roda Viva.
 
Data da defesa: 07/04/2022
O diagnostico do mal na obra de Chuck Palahniuk: o léxico do grotesco como fio transgressor - uma análise estilística sociológica
Resumo: Assombro: um romance de histórias foi originalmente publicado em 2005 pelo autor estadunidense Chuck Palahniuk (1962-). A obra possui uma complexa estrutura narrativa que parodia o Decameron, de Giovanni Boccaccio, Os contos da Cantuária, de Geoffrey Chaucer, e os 120 dias de Sodoma, de Marquês de Sade. Ao emular os três autores, Palahniuk constrói sua narrativa no momento e no contexto em que nós, sujeitos da contemporaneidade, vivemos: pautados por um sistema capitalista neoliberal de consumo. Trata-se de um autor com uma produção artística polêmica, mas que, para além de chocar, tem um intuito maior: o de expor a ferida e diagnosticar o mal social a partir do que ele denomina Ficção Transgressiva. E Assombro seria uma das obras que mais representa esse diagnóstico, dada sua diversidade temática riquíssima. Para a análise do romance, optamos pelos escritos teóricos do Círculo de Bakhtin, com maior destaque para a sua Teoria do romance (2015, 2018, 2019) na qual o teórico busca apresentar uma estilística do romance, tomando-o pelo que é: um gênero literário com um discurso poético que o pesquisador deve analisar partindo de seu especificum, pois para o teórico o romance é um heterodiscurso social artisticamente organizado -- e sendo ele como um todo verbalizado é um fenômeno pluriestilístico, heterodiscursivo e heterovocal. O objetivo é analisar o objeto aos olhos de uma poética sociológica, em que não se separam forma e conteúdo, já que são indivisas no discurso quando este é concebido como fenômeno social - social em todos os campos de sua vida e em todos os seus elementos. Sob esse prisma sociológico buscamos demonstrar, num primeiro momento, como o autor-criador constrói os discursos dentro do romance para mostrarmos que 1) o discurso dos personagens é a representação artística do discurso de um sujeito neoliberalizado; 2) a voz do narrador, pelos discursos indireto e indireto livre, cumpre a função de minar, por meio da parodização, esse discurso neoliberal, corroendo-o de dentro para fora de forma ambivalente. Em um segundo momento, tendo em mente que a transgressão é um dos elementos da produção artística do autor, estando ela presente na sua temática, no seu conteúdo e, principalmente, em sua estrutura linguística, passamos a analisar como o autor faz uso do campo léxico-semântico do âmbito do grotesco para fins estéticos específicos, sendo esse léxico um dos fios que tecem o que denominamos nesta pesquisa de véu transgressor.
Palavras-chave: Assombro; Campos Léxico-semânticos; Chuck Palahniuk. Romance; Estilística Lexical; Estilística Sociológica; Ficção Transgressiva; Grotesco. Círculo de Bakhtin; Heterodiscurso.
 
Data da defesa: 27/04/2022
O discurso social do desenvolvimento sustentável de empresas de alimentos e bebidas: uma análise crítico-discursiva das propagandas institucionais nas redes sociais
Resumo: O discurso social do desenvolvimento sustentável tem sido cada vez mais abordado pelo setor econômico da agroindústria, tornando-se uma importante estratégia de marketing social das empresas, inclusive nas redes sociais. É nesse sentido que consideramos essencial investigar as estratégias discursivas que as empresas do setor de alimentos e de bebidas utilizam ao instanciarem esse discurso. Assim, propomo-nos a analisar propagandas institucionais divulgadas no Instagram das companhias Unilever e da Coca-Cola e suas respectivas marcas, no período de janeiro de 2019 a julho de 2020, com foco nas temáticas LGBTQIA+ (dezessete postagens) e Racismo (onze postagens). Nossos objetivos, neste estudo, foram i. investigar a constituição do discurso social do desenvolvimento sustentável no âmbito de postagens de propaganda institucional das referidas empresas; ii. depreender os recortes discursivos calcados na definição geral do pilar social do desenvolvimento sustentável (BRUNDTLAND, 1991) e da Agenda 2030 (ONU, 2022), ambos da Organização das Nações Unidas (ONU), que as companhias reproduzem; iii. discernir o estatuto ideológico dos textos e as estratégias mobilizadas para a sua consolidação; e iv. discutir o caráter autopromocional dos textos e seus reflexos em termos do ethos das marcas. Para tanto, recorremos a um diálogo multidisciplinar que reuniu a Análise Crítica do Discurso (FAIRCLOUGH, 2003; WODAK, 2004; MELO, 2011; GONÇALVES-SEGUNDO, 2014a; BARROS, 2018; GONÇALVES-SEGUNDO, 2018); a Linguística Sistêmico-Funcional (HALLIDAY, 2004) no que diz respeito ao sistema de TRANSITIVIDADE (HALLIDAY, 2004; FUZER e CABRAL, 2014) e ao subsistema de atitude do sistema de AVALIATIVIDADE (HALLIDAY, 2004; MARTIN e WHITE, 2005; CRUZ, 2012; GONÇALVES-SEGUNDO, 2016a); a Linguística Cognitiva (LANGACKER, 2008) no que tange ao estudo de Metáforas (VEREZA, 2007; FERRARI, 2011; VEREZA, 2013; GONÇALVES-SEGUNDO e ZELIC, 2016b) e Metonímias (FORCEVILLE, 2009; FERRARI, 2011; MOYA, 2011; VILLACAÑAS e WHITE, 2013; SILVA, 2014; SOBRINO, 2017; GONÇALVES-SEGUNDO, 2020); e a Semiótica Social, a partir de conceitos da Gramática do Design Visual, de Kress & Van Leuween (2006), e da Coesão Verbo-imagética, de IsolaLanzoni (2020). Concluímos que as empresas ensaiam um posicionamento semelhante ao do desenvolvimento sustentável desenvolvido pela ONU e acabam por estender sua definição. Ademais, ditam e definem o que é o Consumidor Responsável, instanciando três tipos: i. não tem tanto conhecimento e engajamento nessas causas; ii. tem um certo conhecimento; e iii. é bastante envolvido nas causas e exige engajamento das marcas em ações e movimentos, como o Black Lives Matter. Por fim, representam-se como militantes, engajadas, sensíveis às desigualdades, indignadas com as injustiças etc., autolegitimando-se como intermediárias das causas abordadas, mas essas mesmas empresas não apresentam práticas sociais realmente substanciais e, por isso, podem estar instanciando um discurso que meramente reproduz Diversitywashing.
Palavras-chave: Análise Crítica do Discurso; Desenvolvimento Sustentável; LGBTQIA+; Racismo; Redes Sociais.
 
Data da defesa: 05/05/2022
Explorando o argumentário: uma análise lógico-discursiva do debate público sobre o Escola Sem Partido
Resumo: Ao longo dos anos 2000 e 2010, tornou-se saliente a discussão acerca da educação na esfera pública. Em meio a debates tais, o Movimento Escola Sem Partido passou a integrar essa rede de perspectivações por meio da defesa de uma posição que entende a educação no Brasil como defasada e que a razão para isso consistiria em uma suposta hegemonia esquerdista nos sistemas de ensino. Partindo de tais premissas, em 2016, o Movimento passou a carregar o estatuto de Projeto de Lei, objetivando intervir no ambiente da escola sob a justificativa de tornar explícitos os marcos supostamente já estabelecidos na Constituição. À medida que ganhava tração midiática, tornou-se explícito o desacordo quanto a tal proposta, de modo a fazer com que distintos atores passassem a apresentar seus pontos de vista enquanto argumentadores, alimentando uma rede argumentativa de posicionamentos em conflito. Tendo esse cenário em vista, essa dissertação ancora-se na necessidade de discutir, no âmbito de tal polêmica, como são legitimados os distintos pontos de vista sobre a realidade educacional brasileira e como, por meio da argumentação, se mobilizam posições favoráveis e contrárias à implementação do Projeto de Lei "Escola Sem Partido", posições essas que se encontram ancoradas em distintas discursividades e raciocínios argumentativos. Em outros termos, voltamo-nos à proposta de construção de um argumentário. Para fazer isso, partimos (i) de um corpus composto por artigos de opinião e editoriais, publicados em mídia digital entre os anos de 2014 e 2019, entendendo que o jornalismo é uma esfera capaz de aglutinar um conjunto bastante heterogêneo de posicionamentos que circulam sobre uma dada questão no espaço público; e (ii) de uma perspectiva lógico-discursiva sobre o argumento, que compreende que os raciocínios argumentativos reiteradamente instanciados por diferentes argumentadores consistem em materializações enunciativamente diversas de argumentos abstratos que compõem um argumentário (GONÇALVES-SEGUNDO, 2021b; GOODWIN, 2020; GRÁCIO, 2013; PLANTIN, 2008[2005]). A fim de empreendermos, dessa forma, uma investigação que propusesse um método para a construção de argumentários, partimos da hipótese de que a teoria dos esquemas argumentativos forneceria subsídios produtivos para tal em uma perspectiva lógico-discursiva do raciocínio argumentativo. Para discutir essa hipótese, valemo-nos das contribuições de Grácio (2010) e Plantin (2008[2005]) quanto a questões argumentativas; de Gonçalves-Segundo (2019; 2020a) e Gonçalves-Segundo; Isola-Lanzoni (2019) quanto a problemas epistêmico e prático; de Walton; Macagno (2016), Macagno (2015), Toulmin; Rieke; Janik (1984[1978]) e Fairclough; Fairclough (2012) quanto a argumentações epistêmica e prática; e de van Eemeren; Houtlosser; Snoeck Henkemans (2007) quanto a estrutura do argumento. Partindo de tais pressupostos, bem como da hipótese de que uma polêmica, como a do Escola Sem Partido, gera uma rede de argumentários que estrutura respostas a questões distintas, buscamos aplicar a proposta de construção de argumentário ao corpus selecionado, de modo a identificar as potencialidades e limitações do instrumento. A partir disso, pudemos depreender como que distintas coalizões identitárias perspectivam a questão em disputa, de modo a mapearmos quais são as questões que circulam ao longo da polêmica, quais os raciocínios mais comumente recrutados e como essas perspectivas interagem por meio de desacordos sobre formas de enquadrar a realidade, manifestadas por meio de refutações. Nesse sentido, tornou-se evidente uma concordância quanto às Circunstâncias Motivadoras entre os atores favoráveis ao Escola Sem Partido, com predominância de argumentos instrumentais de raciocínio prático, ao passo que, entre os contrários, foi possível identificarmos tanto um desacordo epistêmico em relação a essas mesmas Circunstâncias do exogrupo quanto uma argumentação refutativa externa por excelência por meio de argumentos pragmáticos. Nessa dinâmica, também foram relevantes as disputas acerca de determinados objetos de discurso, categorias por meio das quais argumentadores se veem, muitas vezes, motivados a argumentar por reconhecer na doxa a discordância quanto a tais categorias. Reconhecemos, dessa forma, uma disputa altamente ancorada nos valores que calcam a perspectivação dos argumentadores e nas presunções por meio das quais se veem legitimados a empreender determinados movimentos argumentativos, de modo a recorrer a distintas perspectivações do que se entende por "liberdade", "intervenção estatal", "ideologia", dentre outras. Com isso, consideramos produtivo o modelo de construção do argumentário para mapear a rede de argumentos que pode ser mobilizada para a depreensão de padrões recorrentes de raciocínio em uma disputa de interesse coletivo.
Palavras-chave: Argumentação epistêmica; Argumentação prática; Argumentário; Escola Sem Partido; Esquema argumentativo.
 
Data da defesa: 16/08/2022

 

Defesas no ano de 2021

 

Teses de Doutorado

"Essa música me faz lembrar..." A 'consciência linguística' que emerge da música: idosos com Alzheimer no Brasil e em Portugal

Resumo: Esta tese aborda a Consciência Linguística em idosos com Doença de Alzheimer (DA) no Brasil e em Portugal, submetidos à audição musical. Nesses países, foi constatada a tendência ao crescimento do número de pessoas idosas e da demência, apesar do inusitado e impactante transtorno epidemiológico mundial deste século vinte e um, causado pelo vírus Sars-Cov-2 na população acima de sessenta anos. O envelhecimento é um processo natural, cultural e social, caracterizado por alterações estruturais na anatomia humana e na identidade pessoal. É um processo tão profundo quanto degenerativo. Contudo, o organismo idoso é marcado pela plasticidade, conforme atestam descobertas recentes da Neurolinguística, da Psicolinguística e da Linguística Cognitiva, cujos postulados teóricos foram fundamentais ao presente estudo, de modo que revelaram o quão exemplar é a capacidade de adaptação cerebral, especialmente quando se trata de emoção e de cognição, sobretudo, estando submetido a determinados tratamentos. Estudos atuais reconhecem reações cerebrais compensatórias em contextos de aplicação da música e da consequente produção de oxitocina, oferecendo subsídios para este novo problema investigativo: a noção de adaptação neurológica admitiria refletir a existência de uma Consciência Linguística em idosos com DA? Por conseguinte, finalidades específicas apresentam-se à análise, pois cabe desenvolver o perfil demográfico dos idosos com Alzheimer, situados nos espaços de aplicação da pesquisa, de acordo com as implicações da pirâmide etária da doença, bem como compreender a reação dos idosos com Alzheimer à música para evidenciar a Consciência Linguística subjacente. Análises comparativas dos aspectos formais da Língua Portuguesa atrelados à percepção das reações afetivas e sociais são possíveis para além do status quo da literatura, que se detém à generalização da deterioração, em detrimento da adaptação neurolinguística. A revisão da literatura ultrapassou os limites disciplinares da Linguística, nesta proposta investigativa, com a introdução de elementos empíricos oferecidos por cinco instrumentos metodológicos para a coleta e a codificação dos dados, a saber: Questionário Sociodemográfico, Comportamental e Clínico (QSCC), Questionário - Informante sobre Declínio Cognitivo em Idosos (IQCODE), Mini Exame do Estado Mental (MEEM), Teste de Consciência Linguística em Idosos (TCLI) e Roteiro de Perguntas Temáticas (RPT), dentre os quais, os dois últimos foram aplicados em contextos interativos de comunicação, envolvendo a música. A validação dos resultados desses procedimentos foi realizada pela constituição de um grupo-controle, composto por idosos típicos, submetidos a idênticos experimentos. Os Procedimentos metodológicos facultaram a confirmação da existência de Consciência Linguística em idosos com DA, verificável com a exposição dos participantes à música, seja no tocante a alguns aspectos metalinguísticos da consciência ou a discursos aferidos na capacidade autobiográfica dos entrevistados, considerando a relação cognitivo-funcional e psicolinguística dos quadros da referida patologia. Porquanto é válida a hipótese de que os idosos com DA reagem positivamente à música, porque existe Consciência Linguística nos diferentes estágios da enfermidade, proporcional às condições neurológicas e psíquicas de cada fase da vida humana.

Palavras-chave: Alzheimer; Consciência Linguística; Linguagem; Música; Oxitocina.

Autoria: Mônica Maria Soares Santos

Orientação: Maria Célia Lima-Hernandes

Data da defesa: 29/04/2021

Os compostos neológicos S+S no português brasileiro contemporâneo: um estudo cognitivo do significado

Resumo: O presente trabalho se propõe a analisar a construção semântica de compostos neológicos de tipo S+S no português brasileiro contemporâneo. Para isso, utilizaremos como referencial teórico conceitos desenvolvidos no âmbito dos estudos de Linguística Cognitiva, especialmente a Teoria da Mesclagem Conceptual, ou Blending, de Fauconnier & Turner (2002; 2003) e a Morfologia Construcional, de Booij (2005; 2007; 2010), desenvolvida no Brasil por Gonçalves (2016b). Acolhemos como hipótese de trabalho, que procuraremos desenvolver na análise, a ideia de que as chamadas composições nominais formadas por dois substantivos em justaposição são, em essência, materializações linguísticas de processos cognitivos gerais, como a capacidade de operar com domínios cognitivos diferentes, mesclando-os em estruturas esquemáticas de conhecimento, as quais, por sua vez, promovem a criação lexical. Finalmente, defenderemos também que, a partir do surgimento dessas criações neológicas, elas passam a servir, a seu turno, como modelos para novas criações. Isso tudo ocorre, a nosso ver, impulsionado pela capacidade cognitiva humana de operar por analogias. A fim de nos guiar na análise das composições neológicas nominais S+S, basear-nos-emos em questionamentos semasiológicos - quais são os significados possíveis para o neologismo em análise e quais os recursos utilizados pelos falantes para interpretá-los corretamente? - e onomasiológicos - por que o falante utilizou o recurso da composição, e não outro, para expressar o conceito que tinha em mente? Os neologismos compostos foram encontrados em textos publicados, no ano de 2014, em 89 blogues jornalísticos veiculados pela Folha de S. Paulo, revista Veja e Portal UOL, acrescidos de textos publicados entre 2015 e 2017 em blogues políticos da revista IstoÉ. Os candidatos a neologismos foram recolhidos de modo semiautomático por meio do software Extrator de Neologismos (FFLCH-USP/NILC-USP São Carlos) e atestados pela verificação nos dicionários Houaiss eletrônico, Aurélio e Michaelis.

Palavras-chave: Blending; Composição; Lexicologia; Linguística Cognitiva; Neologia.
 
Orientação: Ieda Maria Alves
Data da defesa: 27/05/2021
A relação entre imagem e atenuação pragmática na análise de livros didáticos de Português para estrangeiros (PLE)

Resumo: A pesquisa parte do pressuposto de que os livros didáticos de PLE não contemplam aspectos do uso da língua centradas nas relações de interação entre os interlocutores apresentados nos diálogos das unidades de ensino desses manuais e que também negligenciam as questões de imagem (GOFFMAN, 1970); da pragmática sociocultural (BRAVO, 2004), e da atenuação pragmática (BRIZ, 2005, 2014). Portanto, o objeto da pesquisa centra-se, a partir da Pragmática, no tópico sobre a atenuação pragmática e apresenta como objetivo geral examinar como as particularidades do uso da língua, sob a luz dos estudos da atenuação pragmática, estão presentes ou não nos discursos dos livros didáticos de PLE; mostrar que os conhecimentos da pragmática sociocultural, da cortesia e da atenuação pragmática podem revelar novos caminhos para o entendimento da língua no processo de ensino e, revelar novos, e necessários, processos de ensino-aprendizagem, uma vez que a atenuação pragmática pode ser mais um elemento para a compreensão do uso da língua estrangeira. Para embasar o estudo, apresentamos nosso posicionamento sobre a Pragmática e focamos o tema "atenuação" mostrando como esse assunto tem se desenvolvido nos estudos da linguagem; destacamos a diferenciação entre cortesia e atenuação e ressaltamos o seu caráter argumentativo, conforme estabelecem Briz (2005), Albelda (2017); detalhamos conceitos como "imagem" e "trabalho de imagem" a partir de Goffman (1967), Arundale (2013); reforçamos a importância de conscientizar sobre um ensino da competência pragmática, conforme postula o Quadro Europeu Comum de Referência para as Línguas (QECR) e, apresentamos o livro didático, como ferramenta pedagógica, que contribui para o ensino/aprendizagem da língua estrangeira. Também, concentramo-nos em evidenciar como as situações comunicativas são (re)produzidas, tomando como base o "Princípio da Cooperação" proposto por Grice. Para desenvolver a tese, adotamos o método analítico-descritivo, com pesquisa quantitativa e qualitativa para coletar, categorizar e analisar os dados, com base na descrição da "Ficha metodológica" elaborada pelo projeto Es.Por.Atenuação no qual detalhamos suas particularidades e esclarecemos as adaptações desse instrumento de análise para o uso no presente estudo. O corpus é constituído por livros didáticos de PLE - delimitados pelos critérios de mercado editorial e recorrência comum das temáticas -, definido em seis obras que possuem cinco eixos temáticos comuns ("Restaurante", "Saúde", "Ao telefone", "Moradia" e "Compras"), totalizando 26 situações comunicativas que foram submetidas à análise quantitativa e qualitativa. Com o levantamento dos dados sobre os procedimentos e as funções, determinamos os recursos mais utilizados que foram sistematizados nas respectivas categorias. De posse desses resultados, refletimos como a relação entre atenuação e imagem se configura nas obras didáticas e de que modo os manuais veiculam essa representação (re)produzida pelo uso (ou não) da atenuação pragmática. Dessa forma, após o desenvolvimento das análises e categorizações, nas "Considerações finais", chegamos à conclusão de que os LDs revelam um trabalho de imagem expresso pelos procedimentos linguísticos e que esses aspectos necessitam ser melhor detalhados para que os/as aprendentes possam ter consciência sobre esse fenômeno pragmático no uso da linguagem.

Palavras-chave: Atenuação; Função; Imagem; Livro didático; Procedimentos; Trabalho de imagem.
 
Orientação: Luiz Antonio da Silva
Data da defesa: 28/05/2021
Articulações entre o ensino-aprendizagem de argumentação e de literatura: caminhos retórico-interacionistas a partir do Auto da Compadecida

Resumo: Situada na dimensão das práticas sociais, a argumentação é uma atividade humana não coersiva que se enquadra no domínio da controvérsia, da polêmica e conserva o diálogo como sua matriz relacional. Seu ensino amplia a competência argumentativa do discente, composta pelas capacidades de dialogar, pensar, optar e comprometer-se, essenciais à formação do cidadão, segundo Grácio (2016). O espaço escolar torna-se, em vista disso, apropriado à promoção de práticas docentes esteadas em conhecimentos teórico-práticos que favoreçam o planejamento de aulas voltadas a esse fim. A problematização da pesquisa, que se instala, portanto, nesse contexto, consiste em responder como a análise retórico-interacionista de uma obra literária, tal como Auto da Compadecida, pode ser mobilizada em sala de aula para criar situações de ensino-aprendizagem que possibilitem ampliar a competência argumentativa dos discentes no ensino básico. O objetivo geral é, por conseguinte, construir um instrumento de análise retórico- interacionista do éthos, ancorado nos indícios do lógos, aplicável a distintas práticas argumentativas, dentre elas as que se dão no âmbito de obras literárias, de forma a embasar um trabalho didático orientado a esse fim. A obra Auto da Compadecida é apropriada a tal intento porque João Grilo corporifica o poder do discurso persuasivo: constrói-se como orador/argumentador perante um auditório/argumentador heterogêneo e passa de "amarelinho safado", no primeiro ato, a porta voz do grupo, símbolo da esperança, no terceiro. Essa transformação etótica deve-se a sua competência argumentativa revelada ao longo das cenas teatrais. Observar, portanto, como ocorre tal construção nas diversas situações argumentativas presentes na obra abre caminhos para apresentar uma proposta didática de cunho retórico-interacionista que visa desenvolver as habilidades performativas inerentes ao argumentar. Para realizar esse propósito, a pesquisa foi concebida sob as bases teóricas de Aristóteles (2012), Perelman (1993; 2004), Perelman e Olbrechts-Tyteca (2005), Grácio (2013;2016; 2019), Meyer (2007), Plantin (2008), autores que serviram para fundamentar o instrumento retórico-interacionista aplicado.Quanto às demais áreas, utilizaram-se os estudos de Candido (2011), Lajolo (1982; 1993), Zilberman (2012), Cosson (2006), Compagnon (2009), Leahy- Dios (2000), Chiappini (1983) e os de Azevedo (2013), Leitão (2011; 2012), Ribeiro (2009), Leal, Brandão, Correia e Guerra (2010) para compor um quadro crítico do ensino-aprendizagem de Literatura e Argumentação, tendo em vista os potenciais e limitações vigentes. A fim de desenvolver as dimensões epistemológicas que recobrem essa pesquisa - Retórica, Interacionismo, Literatura e Didática -, aplicou-se uma metodologia de abordagem qualitativa, de natureza aplicada, com objetivos exploratórios e procedimentos bibliográficos, conforme Lakatos e Marconi (2003). O instrumento retórico-interacionista desenvolvido mostrou-se propício à elaboração de "questões motivadoras" que nortearam a proposta didática. Orientada à discussão da construção etótica de João Grilo, a proposta traça um percurso investigativo que parte da imagem "pré-construída" pelos discentes a respeito do personagem, à imagem (re)construída após análise e discussão da obra. Contemplada a dimensão interativa da argumentação, gera-se espaço para que, ao ensinar a argumentar, o docente assuma também uma postura argumentativa, aberta à interrogação, à crítica, ao diálogo, a fim de que sua prática seja, a tal ponto, exemplo da teoria, que os discentes se tornem capazes de expandir os conhecimentos curriculares fora dos muros da escola.

Palavras-chave: Argumentação; Ensino; Interação; Literatura; Retórica.
 
Data da defesa: 09/06/2021
Os datiloscritos de O ano da morte de Ricardo Reis, de José Saramago: um caso de emendas silenciosas na passagem a limpo

Resumo: Os datiloscritos com emendas autógrafas do romance O ano da morte de Ricardo Reis (1984), do escritor português José Saramago (1922-2010), constituem-se uma etapa avançada do processo de composição da obra, próxima da versão do texto publicada, e são uma grande oportunidade para o estudo do método de criação do autor à luz da Crítica Genética. Por meio do levantamento, organização e interpretação tanto das marcas de edição deixadas no documento quanto das variantes ocultas -- as chamadas "emendas silenciosas" -- introduzidas pelos testemunhos, é possível entrar em contato com o processo editorial que deu origem à obra. A partir do método de edição crítico genético, a leitura das emendas dos datiloscritos da Biblioteca Nacional de Portugal e da Fundação José Saramago -- em comparação com o texto estabelecido pela primeira edição da Editorial Caminho (1984) --, mostra que nem todas as emendas dos datiloscritos foram aproveitadas, ao passo que algumas variantes anteriormente abandonadas foram recuperadas no decorrer do processo, marcado por uma tensão entre emendas criativas e erros de cópia na altura da passagem a limpo.

Palavras-chave: Crítica Genética; Crítica Literária; Crítica Textual; Filologia; Literatura; Literatura Portuguesa.
 
Data da defesa: 14/06/2021
A construção do sentido de expressões idiomáticas no contexto discursivo: variações, relações e implicações

Resumo: A presente tese tem como objetivo investigar a construção do sentido das Expressões Idiomáticas (EI) e as eventuais relações e implicações que decorrem da aplicação dessas estruturas complexas no contexto discursivo. Assim, considerando um constructo teórico, apresentado na primeira parte da pesquisa, apoiado especialmente na Lexicologia, Semântica e Teorias do Discurso, será analisado um corpus composto por 6 (seis) grupos de EI, desdobrados em 4 (quatro) ocorrências, totalizando 24 (vinte e quatro) registros de EI em textos escritos, publicados na internet e pertencentes a diferentes gêneros discursivos. Desse modo, todas as EI puderam ser examinadas em uso, isto é, aplicadas em um contexto discursivo. Tendo em vista o objetivo, propõe-se um modelo experimental de análise que (co)relaciona as partes, o todo não composicional, as (possíveis) variantes decorrentes do discurso, o entorno discursivo e as implicações desse processo na formulação do sentido que se constitui no e pelo contexto discursivo. A concepção que norteia esta pesquisa centra-se na hipótese de que, embora as EI sejam estruturas (relativamente) fixas, a flexibilidade a que são passíveis - ainda que limitadas a parâmetros de difícil delimitação - não se relacionam meramente às adequações número-pessoais, modo-temporais, mas também - e de modo bastante determinante - às circunstâncias impostas pelo contexto discursivo que, a seu turno, contribuem com e atribuem uma penúltima camada na estrutura de significação e de sentido desse tipo de composição fraseológica complexa. Com base nas investigações, pôde-se identificar e propor a classificação de três tipos principais de ocorrências de EI em uso: EI referência, variante frequente e variante ocasional. Ademais, a despeito da premissa de que o significado de uma EI não decorre da soma dos significados individuais das partes que a constituem, é possível estabelecer graus de ligação entre as partes e o todo em um continuum que vai da maior à menor proximidade entre o sentido literal das partes e o sentido figurado da EI.

Palavras-chave: Discurso; Expressões idiomáticas; Léxico; Semântica; Significado e sentido.
 
Data da defesa: 03/09/2021
A edição didática pelo prisma filológico: as crônicas de Rubem Braga em livros didáticos de língua portuguesa
Resumo: O objetivo principal empreendido nesta tese foi analisar, pelo viés filológico, o processo de transmissão das crônicas de Rubem Braga em livros didáticos de Língua Portuguesa. Para tanto, ancorou-se nos parâmetros metodológicos da Crítica Textual, realizando adaptações tendo em vista as idiossincrasias do material analisado. O corpus é composto por 14 crônicas selecionadas em livros didáticos de Língua Portuguesa, aprovados pelo Programa Nacional do Livro Didático dos anos de 1999, 2002 e 2005, das quatro séries do Ensino Fundamental II. A partir do exercício de cotejo entre testemunhos, realizou-se o levantamento das variantes, as classificando de acordo com a tipologia aristotélica - a saber: omissão, adição, substituição e alteração da ordem. Através da análise dos casos, relacionando com o contexto de produção, publicação e circulação do corpus, buscou-se levantar as prováveis motivações para as variantes encontradas e refletir acerca de suas naturezas e das interferências que possam exercer numa análise crítico-literária. Constatou-se, então, que o contexto discursivo do livro didático de Português como um todo contribui para a existência de variantes textuais e a análise empreendida gerou como resultado a percepção de que existem diversas motivações para a produção dessas variantes, o que justifica o uso da expressão Edição Didática para definir textos de terceiros transcritos em materiais que visem o ensino.
 
Palavras-chave: Crítica Textual; Crônicas; Livro didático; Rubem Braga.
 
Data da defesa: 17/12/2021

Dissertações de Mestrado

Elucidário de africanismos: resultados de um garimpo no arquivo pessoal de Nelson Coelho de Senna
Resumo: O intelectual mineiro Nelson Coelho de Senna (1876-1952) é conhecido por sua atuação política como parlamentar e por sua pesquisa etnográfica sobre a contribuição dos índios e dos negros africanos na formação do povo e cultura brasileira. A mais extensa pesquisa - tanto no que se refere ao tamanho quanto ao tempo dedicado aos estudos - de Nelson de Senna sobre os afronegrismos é o Elucidário de africanismos: vocabulário de africanismos e afronegrismos usados no Brasil e na África colonial lusitana. Trata-se de documento, salvaguardado no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte (APCBH), em parte manuscrito e em parte datiloscrito, datado de 1938, composto por verbetes que contemplam as letras de A a Z e apresentado em folhas avulsas. Entretanto, acredita-se que o autor dedicou muitos anos à escrita deste elucidário, pois em um de seus documentos Nelson de Senna deixou uma anotação manuscrita, dirigida a seus filhos, pedindo que seu trabalho, de mais de 50 anos de pesquisas e estudos sobre a língua portuguesa falada no Brasil, fosse editado e publicado. Há ainda no seu arquivo pessoal outros três documentos relativos ao Elucidário que testemunham o processo de elaboração do trabalho lexicográfico do autor: são notas, bibliografia das obras consultadas para a escrita do Elucidário e lista dos verbetes em ordem alfabética - um acervo que chega a mais de 2.500 páginas. Todas as páginas do Elucidário, sem exceção, contêm "incidentes redacionais", usuais de reescrita, como acréscimos de informação, arrependimentos sumários, correções de palavras e organização alfabética dos verbetes. Estudar a obra de Nelson de Senna na perspectiva crítico-genética, visando à organização material e formal do texto para publicação, nos leva a conhecer o processo de construção do texto na sua intimidade, com suas hesitações e afirmações. Além disso, o estudo da documentação constituída em torno da obra do autor permite, na perspectiva filológica e histórica, ampliar a dimensão do patrimônio linguístico preservado ao longo do processo editorial. A pesquisa de Nelson de Senna na área linguística é pouco conhecida em Minas Gerais, bem como no Brasil, e ainda são raros os estudos dedicados ao registro dos aportes culturais africanos ao acervo de Minas. Seus documentos guardados no Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte continuam inéditos, em especial seus manuscritos sobre as heranças linguísticas afro-indígenas de Minas. Assim, o estudo do Elucidário de africanismos representa uma preciosa fonte de pesquisa para linguistas e certamente contribuirão para o reconhecimento da presença africana no léxico e na cultura brasileira, principalmente mineira.
 
Palavras-chave: Afronegrismos; Edição crítico-genética; Elucidário de africanismos; Nelson de Senna.
 
Data da defesa: 22/02/2021
A argumentação prática no Ensino Básico: uma jornada didática rumo à competência argumentativa
Resumo: Destinada à aplicação em sala de aula, esta pesquisa se concretiza sustentada em dois pilares: teórico e prático. Apoiados no modelo de argumentação prática proposto por Fairclough e Fairclough (2012) e em desdobramentos desenvolvidos por Gonçalves-Segundo (2019), nosso objetivo é discutir e oferecer ao docente ferramentas produtivas para que o ensino-aprendizagem da argumentação possa ser construído de modo significativo no Ensino Básico. Isto posto, este trabalho divide-se em quatro capítulos. No primeiro, discutimos o espaço da argumentação na sala de aula. Para tanto, analisamos os documentos educacionais oficiais, como, por exemplo, a BNCC, bem como lançamos olhar para as especificidades das práticas pedagógicas. No segundo capítulo, apresentamos e discutimos o quadro teórico dos estudos argumentativos através do tempo, tendo, contudo, foco naqueles que contribuem diretamente ao nosso propósito. As duas primeiras partes são basilares para que possamos, numa espécie de rota ou trajeto, empreender uma proposta de sequência didática designada jornada didática (doravante JD). Levando isso em conta, no terceiro capítulo, apoiados, sobretudo, em Bacich e Moran (2018), Dolz et al. (2004) e Lerner (2007), explicitamos as opções metodológicas que adotamos como base para organizar nossa JD. Sem perder de vista a factibilidade das atividades sugeridas ao professor, na quarta e última parte do trabalho, apresentamos, de maneira detalhada, as cinco etapas de nossa sequência didática orientada ao trabalho com argumentação prática: (i) Introdução aos estudos da argumentação; (ii) Defesa de pontos de vista; (iii) Identificação dos constituintes da argumentação prática; (iv) Argumentação prática e os gêneros textuais reivindicatórios; e (v) Aplicação de conceitos em um projeto estudantil coletivo. Direcionadas ao nono (9o) ano do Ensino Fundamental - Anos Finais, mas adaptáveis às séries posteriores, as atividades propostas abordam diferentes temáticas e distintos gêneros discursivos, tanto em termos de leitura quanto de produção textual, que envolvem a prática argumentativa de crítica a e defesa de Propostas de Ação. Visamos, assim, que, ao término da jornada, o estudante esteja apto a aplicar, em outros contextos, o que foi aprendido ao longo de todo o percurso.
Palavras-chave: Argumentação; Argumentação prática; Educação; Ensino-aprendizagem; Jornada didática; Língua Portuguesa; Produção textual; Sequência didática.
 
Data da defesa: 02/03/2021
Esforços individuais multiplicados progressivamente: colação e edição de testemunhos da obra Poemas e Canções, de Vicente de Carvalho
Resumo: Esta dissertação visa à colação e à edição dos testemunhos das cinco primeiras publicações da obra Poemas e Canções (1908), de Vicente de Carvalho, cuja tradição é composta por 17 versões - entre reedições e reimpressões. As cinco primeiras foram publicadas durante a vida de seu autor, o que originou um grande número de variantes autorais. Em cada nota explicativa, ao final do exemplar, o escritor santista defendeu mudanças como o uso de vocabulário inteligível, adição de novos trechos (a fim de complementar aqueles preexistentes) e ainda o acréscimo de poemas relegados em seleções anteriores. Carvalho atuou de maneira relevante na vida pública paulista nos anos que correspondem à passagem do século XIX para o XX, tanto na política quanto por meio de seus escritos. Sucessor de Artur Azevedo a ocupar a cadeira 29 da Academia Brasileira de Letras, o poeta destacou-se na cena parnasiana pelo texto diferenciado em tema (caracterizado pela ode à natureza e ao amor) e em forma, pois valorizava a compreensão acima da extrema erudição linguística. De tal modo, tornou-se popular para os leitores de sua época (vide as inúmeras edições e reimpressões de sua obra) e respeitado pela crítica, ao receber análises de nomes como Otto Maria Carpeaux (2012) e Alfredo Bosi (2013). A partir dessas características, valor artístico e processo criativo em constante revisão - atentando-se para as diferentes origens de cada poema, ou seja, os caminhos da criação - obtém-se rico material filológico a ser lapidado seguindo as diretrizes da Crítica Textual. Nesta dissertação, apresentamos o levantamento da tradição da obra, sua história e relações. Além disso, a edição da última versão em vida do autor, acompanhada de notas de rodapé com variantes encontradas nas publicações de 1908 e 1917, e uma edição sinóptica das três edições em questão.
Palavras-chave: Crítica Textual; Filologia; Literatura Brasileira; Poemas e canções; Vicente de Carvalho.
 
Data da defesa: 25/03/2021
O que há por trás do item trás: uma análise da semanticização das construções com o item trás no português séculos XVI a XXI
Resumo: Esta dissertação tem por objetivo principal analisar as propriedades semânticas do item trás e de suas construções: atrás (de), detrás (de), por detrás (de), para trás (de) e por trás (de) nos documentos dos séculos XVI a XXI. Levando em consideração aquilo que já foi estudado acerca do item e das construções em gramáticas de base descritiva, normativa e histórica, assim como diferentes estudos mais aprofundados, busca-se analisar o uso do item trás e das construções, adotando a perspectiva multissistêmica da língua (Castilho 2010), aliada à Linguística Cognitiva, principalmente os diferentes usos metafóricos propostos por Lakoff; Johnson (1980). A análise da semanticização do item trás e das construções parte do sentido prototípico de localização espacial que, além de atuar na localização objetos, seres e entidades no espaço, também atua como domínio fonte para diferentes usos metafóricos. Os esquemas propostos por Teixeira (2001) e Tyler; Evans (2003) servem de base para a identificação dos sentidos espaciais de trás e suas construções no português, esquemas estes que podem ser depreendidos nas diversas metáforas analisadas, como TEMPO É ESPAÇO, RUIM É ESTAR ATRÁS etc.
Palavras-chave: Construções atrás, detrás; Esquemas Imagéticos; Metáforas; Multissistêmica; Para trás; Por detrás; Por trás; Português; Semântica; Trás.
 
Orientação: Verena Kewitz
Data da defesa: 30/03/2021
Interface entre Filologia e Fonologia Prosódica: um estudo de manuscritos holandeses dos Séculos XVII e XVIII
Resumo: O relato do assalto sofrido pelo comerciante de diamantes David Curiel, e supostamente escrito por ele mesmo, é um manuscrito do século XVII conservado em Amsterdã, no acervo Ets Haim. No mesmo acervo encontram-se outras duas cópias do relato, uma de autoria desconhecida e outra de um tataraneto de David Curiel. Esse corpus é a base para uma análise e caracterização da escrita em documentos dos séculos XVII e XVIII na comunidade portuguesa sefardita de Amsterdã. O enfoque do trabalho está no diálogo entre a Filologia e a Fonologia Prosódica, baseando-se na fronteira entre as palavras. Dessa maneira, a Filologia oferece uma transcrição fidedigna dos manuscritos, tendo em vista conceitos paleográficos. A Fonologia Prosódica baseia-se no estudo da segmentação convencional e não convencional no grupo clítico (C) da hierarquia prosódica. A ausência de espaço em branco entre as palavras, a hipossegmentação, é frequente entre um clítico e seu hospedeiro fonológico nos documentos que compõem o corpus. O trabalho busca compreender as causas dessa hipossegmentação, a partir dos elementos gráficos dos documentos.
Palavras-chave: David Curiel; Filologia; Fonologia Prosódica; Grupo Clítico; Paleografia.
 
Data da defesa: 31/03/2021
A ética protestante e a contribuição da Escola Americana e do Mackenzie College para a formação da norma culta da língua portuguesa em São Paulo
Resumo: Nesta dissertação, analisamos orações infinitivas preposicionadas (OIP's) produzidas pela Escola Americana / Mackenzie College de São Paulo entre os anos de 1889 e 1923, observando a posição dos clíticos pronominais e comparando-a com aquela usada por outras comunidades linguísticas. O objetivo desta análise é conferir de qual norma de colocação pronominal a comunidade Mackenzie, recém- instaurada no Brasil, se aproximava, a saber, as normas linguísticas do português europeu (PE), do português vernacular brasileiro (PVB), do português republicano (PEPR) ou do português literário brasileiro (PLB) em uso por outros grupos já existentes nessa cidade. A partir de preceitos teóricos de áreas como a história social da língua portuguesa, da sociolinguística variacionista e da sociolinguística histórica, analisamos a predominância da ênclise em OIP's nos documentos produzidos pelo Mackenzie, dado que esse tipo de colocação pronominal era considerado prestigiado pela elite letrada brasileira na virada do século XIX para o XX. Além disso, foi imprescindível construir um panorama histórico, social e cultural que envolvesse tanto a comunidade Mackenzie quanto o contexto no qual ela estava inserida, assim como suas origens para verificarmos como seus ideais religiosos e políticos influenciavam suas escolhas linguísticas. Partimos, pois, da Reforma protestante do século XVI, passando pela Contrarreforma, Protestantismo estadunidense, Catolicismo brasileiro, inserção do protestantismo no Brasil, para chegarmos na constituição do ethos mackenzista, através de alguns processos de referenciação e estratégias argumentativas verificados em seus escritos. Finalmente, concluímos que o padrão de colocação dos clíticos pronominais em OIP's se assemelha ao dos literatos brasileiros (PLB), demonstrando que o projeto mackenzista optou por um modelo de língua local e atual, sobretudo para compor o cânone escolar e para constituir a norma culta da língua portuguesa paulistana de então.
Palavras-chave: Clíticos; História social; Mackenzie College; Primeira república.
 
Orientação: Marilza de Oliveira
Data da defesa: 19/05/2021
Etimologia de Substantivos Indicativos de Sentimentos e Estados de Tristeza, no Português
Resumo: Propõe-se um estudo etimológico de uma lista de palavras, classificadas como substantivos abstratos, por meio de conceitos e metodologias da Etimologia. O recorte das palavras estudadas realizou-se por verbetes de dicionários de língua portuguesa em cuja microestrutura houvesse a informação de o campo semântico ser um sentimento negativo ou estado de tristeza. A partir dessa lista de palavras constituída sob o hiperônimo "tristeza", identificaram-se a origem e o étimo latinos ou houve um aprofundamento quando estes ocorreram em outras línguas. A pesquisa foi desenvolvida com o auxílio da Filologia, da Gramática Histórica, da Paleografia e da Codicologia, da Lexicologia e Lexicografia, e se desenvolveu no escopo das Humanidades Digitais, em virtude de buscar ocorrências das palavras estudadas em corpora digitais disponíveis na Internet, a fim de constituir provas científicas da existência das formas pretéritas propostas. Com isso, permitiu-se, ainda, para o português, propor uma datação mais exata, confirmar a que é conhecida ou até mesmo indicar uma retrodatação para as primeiras ocorrências conhecidas das palavras até o momento. Foi possível, também, a partir da identificação de sua origem, demonstrar as motivações concretas das palavras pesquisadas.
Palavras-chave: Datação; Etimologia; Humanidades Digitais; Lexicologia; Sentimentos de tristeza.
 
Orientação: Mário Eduardo Viaro
Data da defesa: 20/05/2021
Filologia e Direito na edição e análise de um processo judicial de execução entre partes de 1821 com penhora de escravizados: encontros
Resumo: Os processos judiciais atestam variados aspectos da vida cotidiana do período em que tramitaram. Formada a relação processual entre as partes e o juiz, trazem o verdadeiro Direito aplicado, ou, segundo Poveda Velasco (2007) o "Direito vivo" de determinado período de nossa História, além de informações aptas a nos revelar muito do que se passava nas relações sociais, na economia e na política. Temos, portanto, que analisar filologicamente um processo judicial tem o condão de transformá-lo em fonte histórica, capaz de revelar o que fomos, abrindo caminhos e espaços para estudos das mais diversas áreas do saber. Nesse compasso, unir essas duas ciências - Filologia e Direito - nos permitirá responder, com clareza e fidedignidade, como as leis eram aplicadas no Brasil e em Portugal, como se davam as relações entre a colônia e a metrópole, os cargos pertencentes à estrutura judicial-administrativa e as pessoas que os compunham. O corpus deste trabalho é constituído de uma Ação de Execução entre Partes, datada de 1821, proposta pelo Capitão Antônio da Silva Prado, Socio Caixa dos Contractos do Novo Imposto da Meia Sisa dos escravizados ladinos, em face do Sargento-mor Ignacio de Araujo Ferraz, pelo não repasse da arrecadação que este último fez do tributo em Villa Bella da Princeza, na província de São Paulo, incidente sobre as transações mercantis de escravizados ladinos. A presente dissertação traz a análise destes autos de processo sob o viés do Direito e da Filologia, que convergiram no sentido de nos mostrar, além do conteúdo do texto, a província de São Paulo à época de tramitação dos autos, sua circulação e a questão dos escravizados, que foram penhorados e leiloados para o pagamento da dívida contraída pelo réu. Para que tais análises fossem realizadas na presente dissertação, elaboramos uma edição semidiplomática de todo o documento, acompanhado de seu fac-símile. Além disso, trouxemos um glossário com alguns termos jurídicos presentes nos autos, contextualizando-os. Por fim, tratamos da Filologia, considerando este processo judicial em sua unidade, mas também pertecente a um acervo judicial público, como curadora de textos históricos. Pretendeu-se, portanto, com o presente trabalho, contribuir para a formação da história do Direito e do Judiciário Brasileiro, já que muitos estudos jurídicos foram feitos com base na simples análise da legislação e jurisprudência vigentes à época, e não diretamente sobre um processo judicial, que seria uma fonte confiável da efetiva aplicação do Direito. Dessa forma, o labor filológico realizado nos autos tornou-se uma forma de preservação dessa espécie documental, tornando-o mais acessível a quem quiser compulsá-lo.
Palavras-chave: Escravizados; Execução Cível entre partes; Filologia; História do Direito; Processo Judicial.
 
Data da defesa: 10/06/2021
O letramento na sala de aula de português língua de acolhimento: a escrita como ferramenta de inclusão
Resumo: Esta dissertação tem como objetivo geral a proposta de buscar entender os mecanismos presentes no processo de ensino de leitura e escrita a estudantes imigrantes que frequentam o curso de Língua Portuguesa como acolhimento na Instituição Missão Paz para alcançar os resultados de se trabalhar o Letramento crítico na aula de PLAc. Parte da análise foi realizada através do emprego de material utilizado nessas aulas, que visavam desenvolver as práticas de letramento através de estratégias de produção textual aplicadas na aula de PLAc (Português Língua de Acolhimento) da Instituição Missão Paz. Para tanto, foi necessário observar e adaptar as situações comunicativas que simulam situações cotidianas presentes na apostila criada para o curso de português da Missão, de maneira que se desenvolvessem competências linguísticas nos processos de aquisição da escrita. Como objetivo específico o intuito é promover uma compreensão formativa em minha trajetória como professora de PLAc sobre o impacto do letramento e as possibilidades de se trabalhar a escrita como parte importante do aprendizado deste público. Utilizei como referências de ensino de línguas os estudos de pós método (KUMARAVADIVELU, 2003), juntamente com a Linguística aplicada, conforme apontados por Kleiman (2013), além das pesquisas sobre interculturalidade de Santiago, Akkari e Marques (2013). Para aplicar os exercícios da escrita, empreguei os estudos de produção textual e do Letramento crítico de Street (2014) e Soares (2004), aplicados através de atividades com gêneros textuais, com base nos ensinamentos contidos nos textos de Marcuschi (2008) e Antunes (2004, 2008 e 2010). O resultado apresentado é uma reflexão sobre as práticas de ensino no ambiente de PLAc, assim como uma amostra de algumas das possibilidades de se trabalhar a escrita neste contexto.
Palavras-chave: Ensino de PLAc; Imigração e refúgio; Leitura e escrita de Língua Portuguesa.
 
Orientação: Rosane de Sá Amado
Data da defesa: 20/08/2021
Monotongação de ditongos orais no português brasileiro: uma revisão sistemática da literatura
Resumo: Este estudo apresenta uma revisão sistemática da monotongação de ditongos orais no português brasileiro (PB). Um ditongo pode ser entendido como o encontro tautossilábico entre uma vogal e um glide - um elemento que não constitui pico de sonoridade na sílaba. Assim, a monotongação é a redução do ditongo a uma vogal simples por meio do apagamento do glide. Neste estudo utilizamos o método Cochrane, cuja metodologia consiste em aplicar métodos explícitos e sistematizados para identificar e selecionar estudos relevantes, denominados estudos primários, bem como, coletar, avaliar a validade e analisar os dados dos estudos selecionados. A aplicação integral desse método é pioneira em estudos de fonologia do português. Os estudos primários são dissertações de mestrado e teses de doutorado que, a partir dos pressupostos teórico-metodológicos da Sociolinguística Variacionista, estudam o fenômeno da monotongação de ditongos orais no PB. Cada um desses estudos descreve e analisa uma variedade local do PB e os resultados não são relacionados, sistematicamente, a resultados de outros estudos. Portanto, não apresentam uma visão completa a respeito do fenômeno da monotongação no PB. Isto posto, esta revisão sistemática visa (i) apresentar e aplicar o método de análise da revisão sistemática, nomeadamente, o método Cochrane; (ii) unificar informações que estão dispersas em vários trabalhos com o objetivo de fornecer uma visão panorâmica da monotongação de ditongos orais no PB e (iii) discutir a aplicação da metodologia da Sociolinguística Quantitativa nos estudos primários. Para tanto, discorremos sobre cada etapa da metodologia da Sociolinguística, apresentando, inclusive, conceitos e fundamentos básicos de estatística empregados nas análises quantitativas. Na análise, os dados foram agrupados de acordo com o ditongo analisado: [aj], [ej] e [ow]. Os resultados demonstram que a monotongação de [aj] é condicionada pelo contexto fonológico seguinte [∫]. Essa mesma variável, Contexto fonológico seguinte, mostrou-se a mais relevante para a monotongação de [ej], cujos índices de ocorrência do fenômeno indicam uma variação diatópica, sendo que as maiores taxas percentuais de aplicação da regra de monotongação foram verificadas na região norte do país. A monotongação de [ow] é categórica em vários contextos e quase categórica outros. Finalmente, a variável Nível de escolaridade do informante foi significativa para a monotongação de [ej] e [ow]. Desse modo, a monotongação de ditongos orais, no PB, é influenciada por variáveis previsoras linguísticas e sociais, evidenciando a pertinência da utilização dos pressupostos da Sociolinguística em análises desse fenômeno.
Palavras-chave: Ditongos orais; Método Cochrane; Português brasileiro; Revisão Sistemática da literatura; Sociolinguística Quantitativa.
 
Data da defesa: 08/10/2021
Descrição e análise dos processos de formação de palavras por reduplicação no crioulo guineense (Guiné-Bissau)
Resumo: Este estudo descreve e analisa, do ponto de vista fonológico, morfológico e sintático, os processos de formação de palavras por reduplicação no crioulo guineense, uma língua de base lexical portuguesa falada na Guiné-Bissau e pela sua comunidade na diáspora. A reduplicação é um processo de formação de palavras no qual uma parte ou o todo de uma palavra é copiada, resultando em uma nova informação morfológica. A investigação teve como hipótese inicial a possibilidade de palavras verbais, nominais, adverbiais, numerais e adjetivais serem alvos do processo de reduplicação, o qual varia consoante a classe da palavra, permitindo especiação e criação nominal de um lado, a funções intensificadoras, distributivas, iterativas, de outro. O corpus consistiu em 132 palavras reduplicadas, foi coletado com base na competência de falantes nativos do guineense, através de pesquisa de campo, e permitiu descrever e analisar as restrições responsáveis pela forma das palavras reduplicadas e a sua função gramatical, tendo como suporte a literatura sobre a reduplicação em línguas de tipologias distintas. O estudo, centralizado nos casos da reduplicação verdadeira e total, entretanto, não negligenciando os da reduplicação falsa, conclui que a reduplicação é um fenômeno difuso no guineense, possui uma natureza essencialmente verbal (66,7% de ocorrência no corpus analisado), e é utilizado para expressar o aspecto iterativo/repetitivo. As categorias formas variadas (20,5%), adjetivo (4,5%), advérbio (3,0%), numeral (3,0%) e nome (2,3%), completam, nessa ordem, a classificação.
Palavras-chave: Crioulo da Guiné-Bissau; Fonologia; Guineense; Morfologia; Morfologia verbal; Reduplicação.
 
Data da defesa: 26/11/2021
Comunicação em prosa moderna: um estudo sobre parágrafo e argumentação
Resumo: Os manuais de redação de língua portuguesa são um símbolo das aulas de português de várias gerações, influenciados por renovações no discurso acadêmico e pedagógico, além de ser adaptado a diversos programas oficiais. Tais obras são importantes fontes de recuperação da memória linguístico-discursiva e, como vetor de língua e valores, um importante fator político, devido à circulação de posicionamentos ideológicos. O objetivo desta dissertação é analisar as formas de apresentação do parágrafo e da argumentação, em Comunicação em prosa moderna: aprenda a escrever, aprendendo a pensar (GARCIA, 2010 [1967]), publicado no período da ditadura militar. Entre as décadas de 1960 e 1970, a concepção teórica subjacente a atividades e propostas de redação era compreender a língua como código de modo a permitir a comunicação, sem ruídos, da mensagem desejada. Esse manual abriu muitas perspectivas linguísticas do final do século XX, de modo que tomamos como ponto de partida alguns conceitos linguísticos. Assim, para analisar essa obra, utilizamos alguns conceitos da Teoria dialógica do discurso, como enunciado concreto (BAKHTIN, 2016; VOLÓCHINOV, 2017), heterodiscurso (BAKHTIN, 2015; VOLÓCHINOV, 2017; 2019a) e, também, princípios da retórica (FERREIRA, 2010), com a finalidade de analisar os conceitos de parágrafo e argumentação na obra de Othon Garcia. A relação entre os enunciados e o trabalho realizado na materialidade linguística é o foco do nosso trabalho. Para tanto, os objetivos específicos são: (i) descrever e analisar a construção composicional e os textos-moldura de forma a identificar permanências e mudanças nas décadas de 1960 e 1970; (ii) reconhecer como o heterodiscurso é apresentado nas seções em análise; e (iii) compreender e interpretar os conceitos de parágrafo e argumentação empregados nas propostas do manual, a fim de identificar as diferentes fontes e orientações teórico-metodológicas que a eles estão subjacentes. Em Comunicação em prosa moderna, o autor parte da distinção entre dissertação e argumentação, uma vez que a primeira tem por função expor e/ou explanar ideias e a segunda persuadir ou influenciar o leitor. Essa definição de argumentação tem sua origem na retórica clássica e, nela, predomina-se o teor de contraposição, com finalidade de ensinar o aluno a convencer e a persuadir o interlocutor. Nos capítulos Como desenvolver o parágrafo e Argumentação, os conceitos de parágrafo e de argumentação são abordados a partir de exemplos retirados de fragmentos de textos da literatura, da sociologia, filosofia e de explicações, que enfatizam a escrita do estudante no nível dos aspectos formais e, também, propondo posicionamentos nas produções do texto argumentativo. A singularidade constitutiva dessa obra caracteriza-se pela inter-relação de valorações ideológicas, como a abordagem linguística inovadora à época. Muito da obra marca as permanências tradicionais do ensino da língua e da argumentação, mantendo-se publicada por mais de 50 anos, e que permanece sendo referência presente em muitos concursos públicos para professores de Língua Portuguesa.
Palavras-chave: Argumentação; Comunicação em prosa moderna; Heterodiscurso; Manual de redação.
 
Data da defesa: 01/02/2021
O Português e as outras línguas: um estudo das imagens das línguas em textos acadêmicos produzidos no Brasil e em Portugal
Resumo: Nesta pesquisa tivemos como objetivo analisar os mecanismos linguísticos e discursivos que contribuem para a construção e sustentação de imagens da língua portuguesa de Angola na produção acadêmica de Brasil e Portugal. Como objetivos específicos: i) discutir as implicações discursivas dos verbos modais; ii) verificar como os pesquisadores se posicionam ao falarem sobre a(s) língua(s); iii) examinar as escolhas lexicais usadas para caracterizar a língua; iv) Analisar a heterogeneidade enunciativa a partir dos discursos presente nos textos. Como aparato teórico utilizamos as concepções centrais sobre formações imaginárias advindas da Análise do Discurso (PÊCHEUX, 1993), bem como as concepções modalizações linguísticas (POTTIER, 1978), sobre heterogeneidade enunciativa de (AUTHIER-REVUZ, 1998). A coleta do material analisado deu-se por meio da busca de textos acadêmicos sobre Língua Portuguesa em Angola, defendidas em Portugal e Brasil. Estabelecemos como período de interesse os últimos vinte anos para a coleta, e recorremos ao banco no Sistema Integrado de Bibliotecas da Universidade de São Paulo (SIBI), pelo acesso no Portal de Busca Integrada (PBI), encontramos vinte e três trabalhos, quinze teses e dissertações e oito artigos científicos. Selecionamos quatro para análises pesquisas que discorriam sobre a unidade linguística em Angola, também estudos que discutiram o ensino das línguas nacionais e o processo de colonização e todas demarcaram que as línguas nacionais interferem no ensino da língua portuguesa. Como resultados, no que se refere aos textos acadêmicos da universidade portuguesa, em Angola como minoritária e consolida a imposição da Língua Portuguesa, também sustenta uma imagem de língua como mercado; em relação ao texto acadêmico da universidade brasileira, observamos que a posição dos pesquisadores perpassa marca uma polarização pela língua oral e escrita. O discurso posto em movimento sobre a língua portuguesa é circunscrito pela compreensão de que a norma do português e o português brasileiro e angolano são variedade. Notamos uma imagem enunciada da língua portuguesa pelos pesquisadores estar associada às imposições linguísticas do período colonial, também uma imagem de que as línguas nacionais contaminam a língua portuguesa, bem como uma imagem de língua de um multilinguismo encoberto. Podemos verificar que os sujeitos, nos textos analisados, se posicionam frente à língua a constituir uma única língua da ciência e criando imagens de línguas como sistemas estáveis.
Palavras-chave: Angola; Imagens de língua; Língua(s); Textos acadêmicos.
 
Data da defesa: 10/12/2021
Artigo de opinião em livros didáticos do Ensino Fundamental: mudanças e permanências
Resumo: O objetivo central deste trabalho é a análise de como os estudantes são conduzidos em seu aprendizado para a construção da opinião e do ponto de vista nas seções de produção escrita do artigo de opinião, em coleções didáticas, sob a justificativa da argumentação como direito à vida (PACÍFICO, 2016). A escolha desse gênero discursivo deve-se ao fato de ele pressupor, em seu eixo estrutural, a exposição de opinião por meio de um percurso de construção argumentativa movida pelos valores de quem escreve. O recorte temporal é o período de final de vigência dos Parâmetros Curriculares Nacionais ou PCN (BRASIL, 1998) e início de vigência da Base Nacional Comum Curricular ou BNCC (BRASIL, 2018a). Três são as perguntas norteadoras desta pesquisa: (1) Qual é o tratamento dado às esferas de circulação no que tange ao trabalho com artigo de opinião nos livros selecionados? (2) De que modo os textos argumentativos, como o artigo de opinião, são orientados para as atividades de produção escrita nesses mesmos livros? (3) De que maneira as atividades propostas nesses livros exploram o posicionamento crítico do estudante e mobilizam os elementos da linguagem na produção e recepção dos textos? Os conceitos trazidos para fundamentação teórica são o de argumentação dialogal (PLANTIN, 2008a; 2008b); o do modo de organização argumentativa (CHARAUDEAU, 2016); o da argumentatividade inscrita na própria língua (CABRAL, 2020; KOCH; ELIAS, 2018); (KOCH, 2011, 2018a, 2018b); o de gêneros do discurso (BAKHTIN, 2011 [1979]); o de texto como acontecimento da vida da linguagem (BAKHTIN, 2016 [1979]) e o de enunciado concreto (VOLÓCHINOV, 2017 [1929]). Para composição do corpus, foram selecionadas as seguintes coleções didáticas dos Anos Finais do Ensino Fundamental: Tecendo linguagens (OLIVEIRA, T. et al., 2015); Tecendo linguagens (OLIVEIRA; ARAÚJO, 2018); Singular & plural (FIGUEIREDO; BALTHASAR; GOULART, 2015); Singular & plural (BALTHASAR; GOULART, 2018). O processo de análise das seções de artigo de opinião deu-se em torno à leitura dos artigos de opinião apresentados; aos encaminhamentos linguístico-discursivos das atividades para a construção argumentativa dos estudantes; e aos encaminhamentos finais para a escrita. Dessa forma, identificamos que as mudanças ocorridas nesse processo de transição de um documento oficial a outro concentram-se, principalmente, nos detalhes. No entanto, configuram-se ainda forte permanência e pouca transformação na macroestrutura das coleções didáticas; nas escolhas para os temas e textos, que pouco se atualizaram; e nos campos de atividades humana da BNCC (BRASIL, 2018a), que implicam ainda fragilidades no tratamento. Desse modo, o contorno social do processo de autoria fica limitado.
Palavras-chave: Análise dialógica do discurso; Argumentação; Língua portuguesa; Livros didáticos.
 
Data da defesa: 15/12/2021

 

Defesas no ano de 2020

Teses de Doutorado

Flexão de gênero: estudo historiográfico sobre a genealogia dos conceitos e abordagem semiótica da morfologia no português

A abordagem da flexão de gênero pressupõe um conceito de flexão e o reconhecimento, em unidades linguísticas, de propriedades cuja presença seja determinante de sua classificação, uma vez que o gênero linguístico é uma categoria dos nomes. A flexão tem sido concebida como um processo morfológico que não gera palavras, isto é, serve a um princípio gramatical; e o gênero linguístico tem sido abordado como um reflexo da designação dos sexos ou de outras distinções semânticas em pares lexicalmente opostos, ou seja, serve a um princípio lexical. A controvérsia encontra-se na junção de ambas as noções, pois, se a flexão não gera palavras, não há meio de saber como, nesses pares opostos, uma das unidades lexicais foi criada. De fato, a flexão de gênero está no cerne da problemática distinção entre flexão e derivação. Assim, o objetivo principal desta pesquisa é compreender a gênese e aplicação da flexão de gênero no português. Como a problemática que envolve a flexão de gênero não é um fenômeno isolado, a investigação subdividiu-se em dois outros objetivos: buscar definições mais precisas dos termos gênero linguístico e flexão como operações conceituais e estabelecer os paradigmas morfológicos da flexão de gênero no português. Em nível conceitual, examinou-se o conceito de gênero linguístico, na Antiguidade Clássica, origem das discussões sobre o tema, na Filosofia da Linguagem e na Gramática; o conceito de flexão foi investigado em três períodos, a saber, a Antiguidade Clássica, o século XIX e o século XX, ou seja, buscaram-se as primeiras menções do termo para, em seguida, investigar possíveis continuidades e descontinuidades na metalinguagem. O tratamento conceitual fundamentou-se na Historiografia Linguística, especialmente nos parâmetros estabelecidos em Swiggers (2004; 2010), nas bases propostas para Definições Lógicas de Hegenberg (1974) e na Conceitografia de Frege (1892a; 1892b; 1895), por meio de corpora textuais, analisados em perspectiva interna e longitudinal. Em nível morfológico, propôs-se inicialmente uma abordagem semiótica da morfologia, fundamentada em Peirce (1839-1914), problematizando o conceito de signo linguístico e de morfema e incorporando oconceito de signo semiótico a fim de consolidar um modelo morfológico de descrição e análise do gênero linguístico e da flexão de gênero no português; a partir do modelo proposto, por meio de um corpus linguístico, verificou-se, em unidades lexicais, especialmente os chamados substantivos, a relação entre terminação, tonicidade, sufixo e gênero linguístico. A análise dos conceitos evidenciou que não há um conceito de gênero linguístico aplicado aos nomes, mas sim um conceito de Gênero, advindo da teoria aristotélica, que categorizou todos os seres, dentre estes, a linguagem; quanto à flexão, a investigação permitiu constatar uma série de camadas de significado, oriundas das diversas concepções teóricas, embora tenham restado traços conceituais herdados da tradição canônica. Por fim, demonstrou-se que flexão e derivação não são conceitos dicotômicos. A análise das unidades lexicais evidenciou haver, no português, uma relação entre terminação ou sufixo e gênero linguístico e uma relação entre distinções semânticas e gênero linguístico, ou seja, a flexão de gênero pertence concomitantemente a princípios gramaticais e lexicais da língua.

Palavras-chave: Conceito de flexão; Conceito de gênero linguístico; Flexão de gênero; Signo linguístico; Signo semiótico.

Autoria: Andréa Lacotiz

Orientação: Mario Eduardo Viaro

Data da defesa: 01/12/2020

Um estudo de metáforas terminológicas presentes em gêneros acadêmicos da economia: aspectos linguísticos, comunicativos e cognitivos

Este trabalho, que se circunscreve no âmbito da Terminologia, visa analisar as metáforas conceptuais da Economia, nossa área-objeto de pesquisa acadêmica. Essa investigação justifica-se devido ao fato de a linguagem científica desse ramo ser um recurso prolífico nas conceptualizações e denominações dessa área de conhecimento, uma vez que as metáforas da Economia possibilitam a apreensão de um conhecimento "complexo" junto às analogias que se referem a algo já conhecido em nosso cotidiano. Para a realização desta pesquisa, constituímos um corpus composto por gêneros acadêmicos que circulam entre especialistas e em vias de formação na área econômica, tais como: artigos científicos, dissertações de mestrado e teses de doutoramento disponíveis em formato eletrônico pelos sites da USP e da Unicamp. Observamos que o grau de especialização dos textos estudados determinou a natureza e a função das metáforas terminológicas desse campo de estudo: expor informações a fim de transmitir e de construir saberes, colaborando por sua vez no processo de conceptualização de um referente - devido a relações de semelhanças estabelecidas entre o conceito especializado e um conceito familiar. Os termos prospectados e analisados, sobretudo sob o viés da Linguística Cognitiva, revelam que os conceitos apresentados por esse tipo de linguagem são projetados pelos domínios-fontes de outros domínios de conhecimento como a Física ou a Biologia; além de se apoiarem em domínios do cotidiano, o que funda a estrutura do pensamento científico. Por último, consideramos também que as metáforas da Economia do ponto de vista de seus aspectos comunicativos, semânticos e cognitivos apresentam uma função pedagógica e sobremaneira heurística, uma vez que os mapeamentos de seus conjuntos de correspondências conceituais entre os elementos de um domínio-fonte para o domínio-alvo revelam a compreensão de conceitos que didatizam seus conhecimentos em um processo de interlocução de ensino e aprendizagem no nível da especialização.

Palavras-chave: Ciência; Cognição; Economia; Metáfora; Terminologia.

Autoria: Elenice Alves da Costa

Orientação: Ieda Maria Alves

Data da defesa: 26/10/2020

Análise da variação terminológica entre o Português Europeu e o Português Brasileiro: o caso dos Produtos para saúde

Esta tese se propõe a analisar termos designativos de Produtos para Saúde em Português Europeu (PE), extraídos de um banco de dados multilíngue de relevância internacional, e verificar como se dá a variação terminológica entre o PE e o Português Brasileiro (PB) nesse âmbito especializado. Para atingir esse objetivo, o trabalho foi inicialmente fundamentado em pesquisas sobre a variação denominativa na língua portuguesa de modo geral. Buscou-se traçar um panorama histórico de modo a acompanhar a presença constante e fundamental do fenômeno da variação desde o desenvolvimento da referida língua na Península Ibérica, uma variante da língua vinda do Lácio, até o momento de sua chegada e implementação no Brasil. A partir desse ponto, foi possível destacar alguns dos fatores geo-históricos e socioculturais que marcaram o processo de distanciamento entre as duas variantes que serão analisadas na tese (PE e PB) e apresentar algumas reflexões que tratam da dificuldade em estabelecer um limite entre essas duas variantes da língua portuguesa. A partir da definição desse olhar para a variação como característica fundamental, inerente e natural das línguas criadas pelos seres humanos, e, por isso, também presente nas linguagens especializadas, buscou-se pesquisas em Terminologia que considerassem a variação terminológica como parte integrante do discurso especializado. Após revisão bibliográfica, optou-se pelos vieses da Socioterminologia (BOULANGER 1981,1995; GAUDIN 1993,1996) e da Terminologia Cultural (DIKI-KIDIRI, 2009) para fundamentarem a observação dos dados em PE, que foram extraídos de um banco de dados terminológico e não de contextos reais portugueses (terminologia in vitro). Para análise das variantes terminológicas em PB, considerou-se o modelo de FREIXA (2014) para categorização dos tipos de variantes terminológicas e convencionou-se como causa geral motivadora das variações a diferença geográfica entre os dois países. O banco de dados utilizado como corpus deste trabalho foi a Global Medical Device Nomenclature (GMDN), ferramenta utilizada por órgãos de vigilância sanitária em mais de 20 países, órgãos esses que são responsáveis, dentre outras coisas, pela regulação do uso dos Produtos para saúde em cada território nacional. A Agência GMDN cedeu acesso integral e gratuito aos dados por meio de um acordo de cooperação entre a Agência GMDN e a Universidade Federal de Itajubá UNIFEI, universidade em que atuam os especialistas que deram suporte técnico para esta pesquisa. Após a definição de uma metodologia de análise específica para este trabalho, foi possível estudar alguns termos designativos de Produtos para saúde a partir do ponto de vista formal, e desenvolver análises descritivas e contextuais de termos selecionados. Por meio desse estudo, comprovou-se que há significativa variação terminológica entre os termos designativos de Produtos para saúde em PE e PB, notadamente as variantes terminológicas que não apresentaram parentesco formal entre si e que foram chamadas neste trabalho de variações heteronímicas. As variantes selecionadas para análise foram categorizadas, do ponto de vista formal, num continnum variacional. Com base nesse resultado, pretende-se trazer à tona alguns questionamentos acerca de problemas reais e práticos de comunicação dessa área especializada e demonstrar como os profissionais de terminologia podem contribuir para a compreensão de algumas questões linguísticas fundamentais com as quais os especialistas encontram dificuldades em suas rotinas.

Palavras-chave: Português Brasileiro; Português Europeu; Produtos para saúde; Terminologia; Variação Terminológica.

Autoria: Pâmela Teixeira Ribeiro

Orientação: Mariangela de Araújo

Data da defesa: 19/10/2020

O perfil teórico-metodológico da Grammatica portugueza, de Júlio Ribeiro

A temática desta tese é o perfil teórico-metodológico da Grammatica portugueza, redigida por Júlio César Ribeiro Vaughan (1845-1890) em 1881 e, depois, reformulada na segunda edição, publicada em 1885. Partimos do corolário de que a Grammatica portugueza tem sido representada em pesquisas como responsável pela ruptura com a teoria gramatical racionalista, considerada demasiadamente "metafísica", para a adoção de teoria que aborda empiricamente os fatos linguísticos, como a histórico-comparatista do século XIX. Trabalhamos com as hipóteses de que: (i) não há rupturas teóricas na Grammatica portugueza, pois as teorias racionalista, comparatista e naturalista acumulam-se na obra, e a dinâmica de integração dessa acumulação reflete seu perfil teórico-metodológico; (ii) a Grammatica portugueza contém uma teoria gramatical particular, decorrente do horizonte de retrospecção heterogêneo do autor, que deixa transparecer o contexto intelectual do final do século XIX; (iii) a Grammatica é, consequentemente, uma obra na qual a inovação não ocorre pela substituição de uma teoria por outra, mas pela integração das teorias racionalista, histórico-comparatista e naturalista que são acrescentadas à base teórica greco-latina; e (iv) esse perfil teórico-metodológico implica uma peculiar formulação de conceitos, regras e exemplos da gramática. Para aferir essas hipóteses, identificamos, primeiramente, como, na gramaticografia brasileira, críticos e pesquisadores estabeleceram duas representações dominantes e distintas acerca do papel histórico da Grammatica portugueza: (i) a representação de que a obra é pioneira em adotar novas teorias; e (ii) a de que a obra é precursora em anunciar novas teorias. Em seguida, descrevemos o horizonte de retrospecção da Grammatica portugueza, a fim de investigar os autores e as obras que Júlio Ribeiro indexou conscientemente na elaboração de sua gramática, para descrever (i) a natureza teórica das obras e dos autores mencionados; (ii) a finalidade da indexação; e a (iii) a maneira como Ribeiro se posiciona ao indexá-los na obra. Por fim, examinamos a integração das teorias presentes na composição dos saberes materializados na Grammatica portugueza, a fim de descrever como Júlio Ribeiro integra premissas de diferentes teorias para constituir os elementos estruturantes de uma gramática. Por meio dessas reflexões, confirmamos que o perfil teórico-metodológico da Grammatica se dá pela integração das teorias racionalistas, histórico-comparatistas e naturalistas (sobre a base greco-latina), decorrente do horizonte de retrospecção heterogêneo de Ribeiro, o qual lhe permite formular de modo particular conceitos, regras e exemplos na Grammatica portugueza.

Palavras-chave: Gramática brasileira; História das ideias linguísticas; Integração teórica; Júlio Ribeiro; Século XIX; Teorias.

Autoria: Mairus Antonio Prete

Orientação: Marli Quadros Leite

Data da defesa: 15/10/2020

O processo de aquisição-aprendizagem de Português como Língua Adicional (PLA) por falantes bilíngues/plurilíngues em contexto de imersão

Esta é uma pesquisa aplicada, de caráter exploratório, inserida na grande área da Linguística Aplicada, na sua vertente indisciplinar e crítica, de língua como manifestação de cultura; e da Sociolinguística, na sua interface com as novas questões postas pelo fenômeno da globalização. O objeto de pesquisa foi o processo de aprendizagem de português língua adicional (PLA) por estudantes bilíngues/plurilíngues candidatos ao Programa de Estudantes-Convênio de Graduação (PEC-G) da Universidade Federal do Pará (UFPA) em contexto de imersão, que participaram do curso preparatório para o exame CELPE-Bras. O objetivo geral foi analisar esse processo, considerando o caráter de bilinguismo/plurilinguismo dos sujeitos da pesquisa e o contexto de imersão de fala do português brasileiro (PB), e o impacto do choque cultural e sua influência no processo de aquisição-aprendizagem de PLA, buscando dirimir as dificuldades, visando ao desenvolvimento das habilidades/competências interacionais na perspectiva da interculturalidade. Os objetivos específicos foram (i) identificar as dificuldades do processo de aprendizagem de PLA enquanto língua-cultura; (ii) apresentar o bilinguismo/plurilinguismo e o contexto de imersão como condição dos aprendentes; (iii) considerar o papel do choque cultural no processo de aquisição-aprendizagem de PLA; (iv) relacionar essa condição ao desenvolvimento das diversas competências, inclusive as interacionais e interculturais, envolvidas no processo de aprendizagem e uso da língua adicional (LAd). A investigação aconteceu em dois momentos: (i) durante as aulas do curso preparatório para o exame CELPE-Bras; e (ii) após o exame, quando aqueles que foram classificados tornaram-se estudantes efetivos da UFPA. A geração de dados se deu a partir da observação participante durante as aulas, dos questionários aplicados, das narrativas dos estudantes gravadas em áudios e, posteriormente, transcritas, e da entrevista feita com o presidente da Associação de Estudantes Estrangeiros da UFPA (AEE/UFPA), além de documentos disponibilizados pela Coordenação do Projeto de Extensão para Alunos do pré-PEC-G/UFPA e pelo Grupo de Pesquisa de Ensino-Aprendizagem de Línguas-Culturas da UFPA. Os resultados mostram que o ser bilíngue/plurilíngue e o contexto de imersão não estão sendo adequadamente utilizados como propulsores do processo de aquisição-aprendizagem de PLA devido à falta de apropriação (consciência) por parte dos aprendentes e/ou por entraves outros, alheios a eles, como as dificuldades com as culturas-alvo, mais especificamente, o choque cultural por eles vivenciados. Cabe, portanto, ao professor agir como mediador entre esses estudantes e o desafio de agregar o PB ao seu repertório linguístico explorando da melhor forma o privilégio de serem sujeitos bilíngues/plurilíngues e de estarem imersos no contexto de uso da língua-alvo.

Palavras-chave: Aquisição-aprendizagem; Bilinguismo; Choque Cultural; Globalização; Imersão; Plurilinguismo; Português Língua Adicional (PLA).

Autoria: Jessiléia Guimarães Eiró

Orientação: Rosane de Sá Amado

Data da defesa: 25/08/2020

Xipat, professora: letramentos acadêmicos de reexistência na formação inicial de professores munduruku

Esta Tese, construída conjuntamente com meus alunos do Curso de Licenciatura Intercultural Indígena da Turma Munduruku, do município de Jacareacanga, no estado do Pará, constituiu-se em um cenário em que o povo munduruku deseja, cada vez mais, exercer o protagonismo a que tem direito, em busca de projetos concretos de justiça social. Cenário em que esse povo indígena desafia modelos predatórios de desenvolvimento trazidos pelo agronegócio através do plantio da soja e da criação de gado, da exploração desenfreada de minério por garimpeiros, da ilegalidade da atividade madeireira, da construção de hidrelétricas; funda espaços de resistência para preservar seus territórios da voracidade capitalista, que deseja abrir ambientes ainda não violados e devidamente resguardados; impõe-se contra a pseudocorrida desenvolvimentista que desrespeita a Convenção 169 da OIT, que lhes assegura o protocolo de consulta prévia, livre e informada sobre o que ocorrer em suas terras; e, mais ainda, tenta utilizar, política e decolonialmente as línguas munduruku e portuguesa, nas interfaces e nos entrecruzares em que se realizam no dia a dia das aldeias, das universidades e dos espaços por onde transitam enquanto cidadãos brasileiros. Nesse ínterim, partimos do pressuposto de que era necessário caracterizar a complexidade linguística vivida no atual contexto educacional de professores munduruku em formação docente, em que o estar entre línguas é a regra e não a exceção. Assim, esta pesquisa tem por objetivo principal, narrar e representar letramentos acadêmicos ideológicos e de reexistência de professores indígenas em formação inicial, que vivem entre as línguas munduruku e portuguesa. Insere-se na área da Linguística Aplicada (LA) Indisciplinar, Crítica e Transgressiva, de autores como Moita Lopes (2013); Cavalcanti (2013); Pennycook (1998, 2001, 2010); Makoni e Pennycook, 2007; Bloommaert (2013), uma LA de cunho pós-colonial, que se realiza no campo aplicado da etnografia de práticas de linguagem representadas em letramentos acadêmicos situados e próprios de professores indígenas em exercício e em formação inicial. Ampara-se em uma metodologia que utiliza narrativas etnográficas de formação para dar visibilidade a minorias, tecendo espaços para fiações de epistemologias plurais, que convergem para a relação e a legitimação entre os conhecimentos não indígenas e os saberes indígenas. As narrativas de formação produzidas nos eventos de letramentos nos apontam mundos que possuem paradigmas específicos de utilização da língua-(gem); mundos que têm uma relação característica com a escrita e com a oralidade; mundos que usam as línguas munduruku e portuguesa para resistir e reexistir frente à colonialidade do ser e do saber ainda presentes nos dias atuais.

Palavras-chave: Formação de professores; Letramentos acadêmicos; Línguas munduruku e portuguesa; Resistência e reexistência.

Autoria: Antonia Zelina Negrão de Oliveira

Orientação: Rosane de Sá Amado

Data da defesa: 17/08/2020

Edição e estudo lexical de documentos novecentistas do sertão baiano

Os manuscritos atestam a língua e os aspectos da história e da cultura de uma determinada sociedade. Logo, quando o filólogo tem acesso a documentos armazenados em acervos públicos e/ou privados, ele é conduzido a investigar tais aspectos e a preservar as informações constantes naqueles, através da edição. Partindo-se disso, a Filologia, ciência milenar, que tem como objetivo central a preservação de fontes documentais, oferece, junto às suas ciências afins (a Paleografia, a Codicologia, a Diplomática e a Ecdótica), o aparato teórico-metodológico necessário à realização de edições e ao estudo de textos diversos. À vista disso, apresentamos, nesta tese, as edições fac-similar e semidiplomática de três documentos feirenses do início do século XX, que estão sob a guarda do Centro de Documentação e Pesquisa (CEDOC), órgão pertencente à Universidade Estadual de Feira de Santana-BA. Tratam-se de dois testamentos e do primeiro volume de um inventário, lavrados entre 1918 e 1922 na cidade de Feira de Santana-BA, e cujo total de fólios chega a 187, os quais encontram-se escritos no recto e verso, em letra cursiva, em papel almaço e em formulários, nos quais constam carimbos, selos, manchas, borrões, rasgões, furos etc., dos quais estes últimos dificultaram, em parte, a leitura de alguns trechos dos documentos sem, no entanto, impedi-la. Além das edições, realizamos a descrição codicológica de 27 documentos armazenados no CEDOC/UEFS, dentre os quais estão inclusos os 3 que foram editados, e paleográfica e diplomaticamente descritos, a fim de realizarmos a contextualização sócio-histórica do corpus e dos seus escreventes. Ademais, depois de editados, os dois testamentos e o primeiro volume do inventário tiveram o seu vocabulário estudado, a partir do método dos Campos Lexicais, estabelecido por Coseriu ([1977] 1991), o qual nos possibilitou inventariar, alocar e analisar 369 lexias em 10 Campos Lexicais, subdivididos em macrocampos, microcampos, subcampos (e suas subdivisões) lexicais, com o objetivo de trazer à tona as lexias consideradas as mais representativas do corpus e, portanto, do vocabulário dos escreventes. Ao final desta tese, apresentamos o perfil sócio filológico-lexical dos escreventes, que redigiram a maior quantidade de fólios do corpus, tarefa realizada a partir das discussões empreendidas ao longo do trabalho. Para a realização dos nossos objetivos de pesquisa, contudo, utilizamos como aporte teórico os trabalhos de Andrade (2010), Bueno (1967), Dubois (1993), Cambraia (2005), Fachin (2008), Megale e Toledo Neto (2005), Melo (1971), Spaggiari e Perugi (2004), Queiroz (2006, 2007) etc., que tratam do labor filológico, paleográfico e/ou codicológico, e Abbade (2003, 2006, 2009, 2011), Biderman (1981, 1996, 1998, 2001), Coseriu ([1977] 1991), Geckeler (1976), Oliveira e Isquerdo (2001), Paula (2007), Queiroz (2012), Xavier (2012) etc., que tratam do léxico, da sua teorização e da aplicação do método dos Campos Lexicais a textos diversos, no nosso caso a documentos notariais.

Palavras-chave: Campos Lexicais; Documentos feirenses novecentistas; Edições fac-similar e semidiplomática; Lexicologia; Perfil sócio filológico-lexical dos escreventes.

Autoria: Josenilce Rodrigues de Oliveira Barreto

Orientação: Manoel Mourivaldo Santiago-Almeida

Data da defesa: 25/06/2020

Uma análise da descortesia como estratégia de persuasão em interações polêmicas: o debate político

O presente estudo tem como propósito analisar as estratégias de descortesia empreendidas no embate político-eleitoral, bem como os recursos de natureza retórica e interacional utilizados em sua concretização em um ambiente de interação marcadamente agonal (Marques, 2012; 2017). Trata-se de examinar de que modo o comportamento verbal agressivo pode cumprir finalidades argumentativas e estratégicas em um tipo específico de contrato interlocutório (Blas Arroyo, 2011), uma interação trílogue, de visada argumentativa (Amossy, 2017; 2018), cujos propósitos discursivos consistem na busca do estabelecimento de um consenso com um interlocutor que não participa fisicamente da interação, mas para o qual se dirigem ambos os debatedores: o eleitor em potencial. De fato, no embate eleitoral, as estratégias descorteses e recursos argumentativos de natureza diversa que ora a intensificam, ora a veiculam, estão imbricados na busca pelo estabelecimento de alianças ou coalizões (Blas Arroyo, 2011) que os debatedores intentam estabelecer com um terceiro participante ao qual se visa persuadir (Kerbrart-Orecchioni, 2006). Essas coalizões podem ocorrer mediante a instauração de um duo consensual com o auditório (Fávero e Aquino, 2002), por meio da manipulação deliberada de um quadro participativo específico, intrínseco a esse tipo de interlocução (Fávero e Aquino, 2002) , da ambiguidade referencial (Blas Arroyo, 2010; 2011), assim como pela instauração de uma imagem credível pelos debatedores diante do público eleitor, a qual se erige em detrimento da imagem do candidato adversário, em um trabalho de face eminentemente agressivo (Goffman, 1967). Consideramos, pois, que a descortesia se afigura em um complexo processo interacional que, no debate político-eleitoral, pode cumprir fins de persuasão. Em razão disso, tomamos, como fundamento teórico, as contribuições de teorias da Descortesia, sobretudo de Kaul de Marlangeon (2003; 2005; 2014), Culpeper (1996; 2011), Blas Arroyo (2010; 2011), Silva (2013), Marques (2012, 2017) dentre outros, para uma análise do comportamento verbal agressivo no embate político-eleitoral. Por tratar-se de um tipo de interlocução polêmica, que apresenta propósitos persuasivos - o debate político se configura em um discurso de claras intenções argumentativas - consideramos as contribuições de teorias da argumentação (Perelman e Olbrechts- Tyteca, 2005[1958]), (Fávero e Aquino, 2002) e da Argumentação no Discurso (Amossy, 2018), procedendo à articulação entre os construtos teóricos da descortesia verbal e da argumentação para uma abordagem das diferentes estratégias descorteses e procedimentos retóricos e interacionais que as concretizam, veiculados pelo discurso eleitoral. O corpus constitui-se do debate do segundo turno das eleições presidenciais de 2014 entre os candidatos Dilma Rousseff e Aécio Neves. Tal debate foi realizado em São Paulo e transmitido pela emissora SBT.

Palavras-chave: Debate político-eleitoral; Descortesia; Imagem; Persuasão; Polêmica.

Autoria: Ana Paula Albarelli

Orientação: Luiz Antonio da Silva

Data da defesa: 18/06/2020

Um estudo da face no discurso acadêmico de graduandos do curso de Letras - Língua Portuguesa

Esta pesquisa estuda a elaboração da face nos textos acadêmicos escritos de graduandos de Letras. Parte do pressuposto de que marcas de interatividade cumprem várias funções discursivas em contextos acadêmicos, (cf. Barros, 1998; 1999; 2012), estabelecendo relação entre o escrevente com seu interlocutor a partir da interação, conforme Marcuschi (2001). Nessa perspectiva, o texto é espaço de interação entre os sujeitos, possibilitando flagrar a elaboração de face pelo graduando. No contexto desta pesquisa, as marcas de interatividade indicam não somente, a busca, por parte do graduando, pelo envolvimento do professor, mas revelam, sobretudo, a preocupação com o monitoramento da interpretação do seu interlocutor. O objetivo geral procura compreender o funcionamento intersubjetivo das práticas do discurso acadêmico por meio do gerenciamento da face, a fim de contribuir para desenvolver um discurso acadêmico mais voltado para sua natureza interacional pelo graduando de Letras. Quanto aos específicos, estão: analisar movimentos de elaboração da face e de trabalho de face (face work) na busca do graduando pelo pertencimento à comunidade acadêmica e compreender as estratégias de que os participantes da interação se valem para preservar a sua própria face e do professor. O corpus constitui-se de 16 textos acadêmicos escritos pelos graduandos durante o curso de Letras, nas disciplinas de Atividades Práticas de Docência, de Introdução à Linguística, de Morfossintaxe II e de Semântica, no período entre 2009 e 2012, em Paragominas, PA. A metodologia utilizada segue os procedimentos da pesquisa qualitativa, abordagem interpretativista, com apoio na base quantitativa. Teoricamente, a pesquisa se respalda nos estudos sociointeracionais da linguagem e da Sociolinguística Interacional. Os resultados da pesquisa levam a conclusão de que os graduandos acionam estratégias de prevenção da face ligados ao status assumidos pelos graduandos na interação.

Palavras-chave: Discurso Acadêmico; Interação; Preservação de Face.

Autoria: Dinair Barbosa de Freitas

Orientação: Luiz Antonio da Silva

Data da defesa: 21/05/2020

O processo de derivação prefixal do português: um estudo semântico-histórico do formante DIS- e da variante DI-

Objetivamos, com esta pesquisa, descrever as propriedades morfosssemânticas do prefixo dis-/di-, em verbetes coletados em dicionários e em estudos gramaticais diacrônicos e sincrônicos, na busca por sistematizarmos o significado desse formante; verificarmos a frequência de uso, a produtividade e a polissemia desse prefixo no corpus de análise; e cotejarmo-lo com os prefixos des- e de-. Averiguamos, ainda, pautados nos estudos de Santos (2016), quais os critérios de seleção e/ou arranjos, desse formante, em relação à base a que adjunge, apresentando os resultados acerca do processo de derivação prefixal do português, sob o viés semântico-histórico. Para tanto, baseamo-nos nos pressupostos de Rio-Torto (1998, 2013, 2014), Lopes (2013), Viaro (2004, 2011, 2014), De Bona (2014, 2018), Santos (2016), entre outros. Estudamos a ocorrência desse prefixo na formação prefixal em palavras já derivadas, investigando quais as Regras de formação de Palavras, usadas na formação dessas palavras derivadas, pautando-nos nos pressupostos de Basílio (2003, 2004). Nesta pesquisa, de cunho qualitativo, procedemos a um levantamento bibliográfico para auxiliar na descrição do corpus coletado no Dicionário Houaiss (2001), comparando esses dados com os de outros dicionários, usando, para tanto, a metodologia estabelecida pelo grupo de pesquisa GMHP (Grupo de Morfologia Histórica do Português ). Entendemos que o prefixo dis- e sua variante possa contribuir para uma visão clara do processo histórico-semântico da língua portuguesa, dada a variação semântica identificada.

Palavras-chave: Derivação; Morfologia; Prefixo dis-/di-; Processo Semântico-histórico; Sincronia.

Autoria: Rosana Siqueira de Carvalho do Vale

Orientação: Mário Eduardo Viaro

Data da defesa: 23/04/2020

Um estudo da Grammatica Philosophica da Lingua Portugueza: uma história do panorama do horizonte de retrospeccção de JSB

Este trabalho é sobre a Grammatica Philosophica da Lingua Portugueza (1822), de Jerônimo Soares Barbosa, uma gramática baseada na teoria da gramática geral. O objetivo foi o de demonstrar a filiação teórica de Barbosa aos princípios da teoria racionalista pelo estudo do sistema verbal organizado pelo gramático. Com fundamentos da História das Ideias Linguísticas, examinamos e interpretamos do Capítulo VI Do verbo, do livro III Da Etymologia, ou partes da oração portugueza, as seguintes seções: o conceito de verbo; o Artigo I Do verbo substantivo, e seus auxiliares; o Artigo II Da conjugação do verbo substantivo, e de seus auxiliares; o Artigo III Do verbo adjetivo e o seu § I Conjugação do verbo adjetivo em sua voz ativa. Para o desenvolvimento dessa análise, o trabalho foi dividido em quatro capítulos: no primeiro, segundo Auroux (1979, 1922, 1998a, 1998b, 2008, 2009a), identificamos e examinamos o horizonte de retrospecção de Barbosa; no segundo, conforme os conceitos de gramática apresentados na Gramática Geral de Port-Royal (GGP-R) e nos artigos Grammaire (1757) e Mot (1751) da Encyclopédie, analisamos a definição de gramática proposta na Grammatica Philosophica da Lingua Portugueza (GPLP); no terceiro, realizamos, inicialmente, uma reflexão histórica sobre o logos na busca da relevância do verbo na composição da proposição, e, em seguida, descrevemos e analisamos a terminologia e o conceito de verbo na GGP-R, na Grammaire Générale (BEAUZÉE, 1767), na Grammaire (CONDILLAC, 1775), na Grammatica Philosophica (BACELLAR, 1783), na Gramatica Portugueza (SOUZA, 1804), e na GPLP (1822), para realizarmos um estudo comparativo e interpretativo dessas gramáticas; e, no quarto, averiguamos as concepções de modo e tempo do verbo nas gramáticas gerais e filosóficas antes analisadas e, em seguida, refletimos sobre os critérios utilizados na GPLP para a concepção de modo e tempo, a fim de identificar e discutir as causas da reorganização do sistema verbal nessa obra. Por meio de descrição-analítica, verificamos que o sistema verbal na GPLP resulta da aplicação dos conceitos apresentados nas gramáticas gerais e filosóficas antecedentes a obra, dos quais Barbosa se apropriou parcialmente, visto que: a) o verbo ser permanece como componente essencial da proposição; b) a essência do verbo é o sentido de "existência"; porém, c) o verbo auxiliar recebe uma nova interpretação; e, d) o sistema de modos e tempos verbais é organizado com base no critério funcional-sintático, por meio do qual os tempos são distribuídos apenas em três modos verbais. A pesquisa mostra que, apesar de Barbosa estar fundamentado nos princípios da gramática geral, o sistema verbal exposto na GPLP não é apenas uma simples cópia, mas há uma interpretação crítica dos sistemas apresentados nas gramáticas de Port-Royal, Beauzée e Condillac para exteriorizar uma proposta distinta ao sistema verbal da língua portuguesa.

Palavras-chave: Gramática geral e filosófica; Horizonte de Retrospecção; Modo verbal; Tempo verbal; Verbo.

Autoria: Jordana Tavares Silveira Lisbôa

Orientação: Marli Quadros Leite

Data da defesa: 17/04/2020

A produção escrita dos ribeirinhos: sua cultura e seus saberes

Os estudantes ribeirinhos do Pará enfrentam diariamente uma luta cotidiana frente à construção do seu processo de escolarização. Tais desafios estão traduzidos em pequenas narrativas que contam a travessia entre as duas margens (ribeirinha e urbana), e revelam experiências miúdas da cultura de fronteira presente nas escolas públicas estaduais de Belém. Partindo dessa realidade, o objetivo desta tese é discutir como a vida concreta determina as formas da escrita na produção dos gêneros escolares de autoria de alunos ribeirinhos, e como essas formas refletem e refratam a realidade da vida dos ribeirinhos na esfera escolar. Para esse estudo, centramos a fundamentação teórico-metodológica na abordagem dialógica da linguagem, cunhada por Bakhtin e o Círculo, nos conceitos de signo ideológico e gêneros do discurso, e, nos Novos Estudos dos Letramentos, sobretudo nas distinções que emergem no interior do debate sobre letramento autônomo e letramentos sociais. A pesquisa de campo de caráter qualitativa ocorreu na forma de pesquisa participativa, realizada entre janeiro e junho de 2017, em três escolas da rede pública estatual de Belém do Pará. O corpora - 41 textos multimodais produzidos por 28 alunos ribeirinhos - resultou de cinco eventos de letramentos idealizados em diálogo com os professores e realizados em turmas do 6º ano do ensino fundamental nos anos finais. As atividades didáticas, ou eventos de letramentos, caracterizaram-se pela centralidade no entrelugar da cultura de fronteiras, debate desenvolvido originalmente pelos Estudos Culturais ingleses. Na escrita dos estudantes ribeirinhos estão os indícios de um processo complexo e ininterrupto que traduz seu acesso à cultura escrita escolar. Nota-se como as experiências com a escrita chegam à escola como resultado de um processo complexo e dinâmico, que se inicia na aquisição da variante oral traduzida na cultura popular de sua comunidade de origem e nos sentidos que a escrita assume na dependência histórica das populações ribeirinhas da Amazônia com a zona urbana (dependência econômica, de serviços, de acesso aos bens materiais industrializados, política etc.). As formas dadas ao material para a produção do conteúdo dos gêneros escolares, constituem a autoria dos ribeirinhos no espaço escolar. Ao realizarem a travessia para dar continuidade a sua escolarização, as ideologias do cotidiano são articuladas aos saberes escolares. A cultura popular desestabiliza a imanência do pensamento idealista que constitui a ideia de língua na esfera escolar. A cultura única dissolve-se na vivência coletiva dos ribeirinhos. A heterogeneidade discursiva dos gêneros escolares é a concretização da subversão de um modelo de pensamento único para um pensamento concreto que tem a realidade social como sua principal fonte de referência. Contudo, a forma arquitetônica da produção escrita dos ribeirinhos, constituída na fronteira entre a ideologia do cotidiano (cultura ribeirinha) e a ideologia oficial (cultura escolar), tem nos gêneros escolares a materialização dessa cultura de fronteiras.

Palavras-chave: Cultura de fronteiras; Escrita de estudantes ribeirinhos; Gêneros do discurso; Letramentos sociais; Signo ideológico.

Autoria: Cristiane Dominiqui Vieira Burlamaqui

Orientação: Maria Inês Batista Campos

Data da defesa: 06/04/2020

A política linguística nos documentos oficiais de orientação didática de língua portuguesa para surdos entre 1979 e 2010: arquitetônica, memória e discurso

O Ministério da Educação (MEC), entre 1979 e 2010, estabeleceu orientações didáticas de ensino de Língua Portuguesa para estudantes surdos no país. Essas orientações refletiram diferentes discursos em relação às designações para surdos, às concepções de linguagem e às abordagens de ensino monolíngue ou bilíngue. Verifica-se, nessa problemática, tensões entre o uso da Língua Portuguesa com foco na língua oral e escrita e o uso da Língua de Sinais presentes nas esferas institucionais. Esta tese tem como objetivo analisar as orientações didáticas oficiais de Língua Portuguesa expressas nos documentos publicados, implementados pelo Ministério da Educação (MEC), nos governos de João Batista Figueiredo (1979-1985), Fernando Henrique Cardoso (1995-2003) e Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2011). Para atingir o objetivo, duas questões nortearam a pesquisa: (i) Como esses governos representados pelo MEC, no período que abrange os anos de 1979 a 2010, posicionaram-se frente às singularidades do estudante surdo? (ii) Que concepções de linguagem e de ensino de Língua Portuguesa engendram os discursos dos documentos oficiais? A partir dessas questões, foram selecionados seis documentos oficiais publicados entre 1979 e 2010, que tratam da política linguística para educação básica, como objeto de pesquisa. Constituem, assim, o corpus desta pesquisa a seguinte materialidade: (1) Proposta curricular para deficientes auditivos (BRASIL, 1979); (2) O aluno surdo na educação básica e superior (BRASIL, 1998b); (3) Ensino de língua portuguesa para surdos: caminhos para prática pedagógica (BRASIL, 2002b); (4) Saberes e práticas da inclusão: desenvolvendo competências para o atendimento às necessidades educacionais especiais de alunos surdos (BRASIL, 2005b); (5) Atendimento Educacional Especializado - Pessoa com Surdez (BRASIL, 2007); (6) Abordagem bilíngue na escolarização de pessoas com surdez (BRASIL, 2010). Para rastrear a memória do objeto de pesquisa, primeiramente, este trabalho apoia-se nas concepções teórico-metodológicas de Bakhtin e o Círculo, considerando os conceitos de arquitetônica, memória e enunciado concreto de M. Bakhtin (2002; 2003;2010, 2016, 2017) e V. Volóchinov (2017). Em segundo lugar, a partir da organização do corpus, constituído por seis documentos oficiais, recupera-se a memória do objeto, apresentando as principais diretrizes instauradas, no que se refere, sobretudo, às orientações didáticas oficiais de Língua Portuguesa para surdos a fim de compreender posicionamentos expressos nos documentos publicados. Os resultados interpretados mostram que são propostas didáticas, muitas vezes, compreendidas como política linguística, compostas de parte teórica e prática no que se refere ao ensino de Língua Portuguesa para surdos. Conclui-se, portanto, que o documento 1 designa o ensino dos fonemas e da sintaxe, prevalecendo o método oral, o documento 2 tem a função de preparar aluno para ser integrado na sala regular de ensino baseado na leitura e escrita da língua portuguesa, os documentos 3, 4, 5 e 6 defendem o ensino bilíngue, ou seja, a Língua Portuguesa instituída como L2 e a Língua de Sinais reconhecida como L1. Nos documentos 5 e 6, três momentos de ensino nas salas de recursos multifuncionais são recomendados: o ensino de Língua de Sinais, o ensino em Língua de Sinais do conteúdo escolar e o ensino de Língua Portuguesa escrita. Esta tese traz reflexões sobre a necessidade de um ensino em sala de aula bilíngue com recursos didáticos e tecnológicos com profissionais especialistas, sendo um professor de língua e um intérprete, atuando de forma colaborativa na educação de alunos surdos, usando a Língua Portuguesa escrita e a Língua de Sinais, para instituir uma proposta de política linguística efetivamente inclusiva.

Palavras-chave: Arquitetônica; Memória; Discurso; Documentos oficiais de política linguística; Língua Portuguesa para surdos.

Autoria: Rita de Nazareth Souza Bentes

Orientação: Maria Inês Batista Campos

Data da defesa: 27/03/2020

Gramática e estilística em diálogo: a crônica em narrativas escolares

Esta pesquisa apresenta o resultado de um estudo acerca do conjunto de trabalhos voltados para a abordagem estilística, especialmente no ensino de língua portuguesa, inspirado na experiência vivida por Bakhtin quando foi professor de língua russa na Educação Básica em meados do século XX. Para tanto, investigamos: a trajetória desses estudos no Brasil; a perspectiva de estilo/estilística no Círculo de Bakhtin, ao qual o estilo é fruto das relações de interação social em que a língua se realiza, por meio do encontro de vozes de sujeitos sócio-históricos e dialogicamente constituídos no outro; e, por fim, propomos uma abordagem de ensino de língua portuguesa de base estilística. Desse modo, via realização de uma pesquisa-ação, desenvolvemos um projeto didático destinado a alunos do ensino médio, pautado em atividades de leitura, escrita e reescrita de crônicas, considerando-se os elementos que constituem esse gênero e a escolha dos recursos estilísticos empregados na construção dos enunciados. A escrita dos alunos apresenta, por um lado, o relato de fatos cotidianos compartilhados por meio de narrativas em que se expressam e provocam no seu interlocutor sentimentos que oscilam da indignação ao humor ou mesmo uma reflexão. Por outro lado, destacam-se componentes gramaticais e discursivos utilizados para construir determinados sentidos e provocar respostas presumidas no seu interlocutor, num processo de interação em que entram em cena as suas valorações sociais. Os resultados da pesquisa demonstram que o estudo da estilística no Brasil constitui referência na estilística linguística, na estilística literária, na estilística sociolinguística e, mais recentemente, na abordagem enunciativo-discursiva, inclusive em trabalhos inspirados na perspectiva dialógica da linguagem. A intervenção didática realizada despertou nos alunos a sua capacidade de acessar diferentes recursos estilísticos para a construção de textos, que revelam seus interesses na seleção dos articuladores da narrativa para atingir seus propósitos discursivos em situações de interação. A pesquisa possibilitou também avanços e retomadas nos estudos estilísticos e, por seu caráter interventivo, pode contribuir para a formação de escritores e para o ensino de língua portuguesa.

Palavras-chave: Círculo de Bakhtin; Ensino de Língua Portuguesa; Estilística.

Autoria: Sueli Pinheiro da Silva

Orientação: Sheila Vieira de Camargo Grillo

Data da defesa: 27/03/2020

O texto multimodal e os construtos identitário-ideológicos no discurso político do Facebook

Esta pesquisa apresenta como escopo o estudo da inter-relação entre identidade, ideologia e discurso político no texto multimodal presente nas postagens das Páginas no Facebook. Considerando os Estudos Críticos do Discurso e a Análise do Discurso Multimodal, além de sua base multidisciplinar, como Filosofia, Comunicação e Ciência Política, estabelecemos como objetivos: analisar os elementos verbais e visuais utilizados para marcar, ideologicamente, as páginas; observar de que modo esses elementos encaminham à construção da identidade verbo-visual dessas páginas, ao se posicionarem frente às questões políticas; e verificar as categorias de estrutura das ideologias de cada página (VAN DIJK, 2011), as estratégias que envolvem uma autoapresentação positiva em detrimento da ênfase negativa do opositor (VAN DIJK, 2010) e os sistemas de composição do texto multimodal (KRESS; VAN LEEUWEN (2006 [1996]). Temos por hipóteses que a construção da identidade das páginas do Facebook ocorre a partir das postagens; as marcas ideológicas omitidas no momento de definição inicial revelam-se na interação; a presença de traços ideológicos na relação discursiva verbo-visual constitui-se o elemento essencial à constituição identitária; e a inter-relação identidade, ideologia e discurso político acontece na composição dos elementos visuais e verbais. Para atingir os objetivos, determinamos como corpora, quinze Páginas; em cada uma, selecionamos as fotos de perfil e de capa e duas postagens, a partir da identificação do eixo ideológico. Analisamos as publicações do período entre 2017 e 2018, por considerá-lo ápice de momentos de intensa polarização no Facebook. Procedemos à discussão teórica a partir de quatro eixos de estudo. No primeiro, buscamos compreender a relação entre modernidade, discurso político e novas mídias, recorrendo a teóricos como, Giddens (1991a), Bauman (2001) e Charaudeau (2009), que definem modernidade; Jenkins (2009), ao tratar da cultura de convergência; Crystal (2006), Ferrari (2010), Barton e Lee (2015), Naughton (2011), que consideram a internet como fato social; Castells (2003, 2017 [1999]), Lévy (2011), ao discutirem sobre as comunidades online ou virtuais; Charaudeau (2011), Chilton (2004) e Palumbo (2013), ao destacarem a emergência das práticas discursivas, a partir do discurso político. No segundo eixo, objetivamos o entendimento do conceito de ideologia, recorremos, principalmente a van Dijk (2011), Thompson (2011[1990]), Eagleton (1997). O terceiro constitui-se da discussão sobre identidade, com base nos estudos de Giddens (1991a, 2002), Hobsbawn (1996), Hall (2000, 2006), Bauman (2001, 2005), De Fina (2011), Aquino e Palumbo (2016), Charaudeau (2016), Castells (2017 [1999], 2018 [1999]). E, no quarto, discutimos sobre multimodalidade e reflexividade, com suporte teórico em Giddens (1991b), Kress (1998, 2003, 2010), Bateman (2014), Fairclough, Mulderrig e Wodak (2011), Gonçalves Segundo (2011), Barton e Lee (2015), entre outros; Gramática do Design Visual, a partir de Kress e van Leeuwen (2006 [1996]), Kress (2003), Saint-Georges (2004), Norris (2004); e práticas discursivas e multimodais digitais, de acordo com van Dijk (2009), Georgalou (2017), Jones, Chik e Hafner (2015). A partir das análises, concluímos que a seleção dos recursos na composição da mensagem tem como ponto de partida a questão identitária, atrelada ao viés ideológico, no caso do texto multimodal de cunho político, que se manifesta no Facebook, representando a ágora moderna, na qual os atores sociais, organizados em comunidades, constroem uma interação digital polarizada, alimentada continuamente por conflitos.

Palavras-chave: Discurso político; Identidade; Ideologia; Texto multimodal.

Autoria: Josane Daniela Freitas Pinto

Orientação: Zilda Gaspar Oliveira de Aquino

Data da defesa: 19/03/2020

Análise de objetos de aprendizagem em websites de Português Língua Adicional: foco na competência interacional

A área de ensino e de aprendizagem do Português como Língua Adicional (PLA) vem apresentando, nos últimos anos, uma expansão evidente. A tecnologia, por seu turno, tem reconfigurado a área de ensino e aprendizagem de línguas, e esse processo certamente inclui o campo do PLA. Há de se considerar o interesse de aprendentes de línguas estrangeiras em complementar seus estudos de maneira independente, utilizando espaços virtuais que agreguem lições interativas, com materiais em áudio, vídeos e exercícios. Esses ambientes, no âmbito da aprendizagem de Português como Língua Adicional, podem ser encontrados na Web no formato de aplicativos, repositórios de Objetos de Aprendizagem (OAs) e websites educativos ou instrucionais, objeto de nosso estudo. Muitos desses ambientes, no entanto, acabam apresentando a língua de modo fragmentado ao usuário, com meras traduções de textos/vocabulário, ou com ênfase maior nas regras gramaticais, sem priorizar aspectos interacionais da língua-alvo. O propósito deste trabalho é investigar como websites educacionais/instrucionais da área de PLA, contribuem para o desenvolvimento da competência interacional do aprendente. O estudo, de cunho qualitativo e descritivo, apresenta a avaliação de vinte OAs, encontrados em dez websites, com base em fichas de avaliação organizadas em diferentes eixos relacionados à bibliografia pesquisada, tais como: princípios da Arquitetura da Informação, critérios técnico-pedagógicos do Learning Object Review Instrument (LORI) e elementos fomentadores da competência interacional. A pesquisa também apresenta um protótipo de objeto de aprendizagem utilizado em aulas de PLA a intercambistas visitantes da Universidade do Estado do Pará (UEPA), tarefa desenvolvida em um grupo de pesquisa com alunos do curso de Letras/Língua Inglesa daquela IES. Espera-se, assim, contribuir com as pesquisas direcionadas ao e-learning no campo do PLA, e destacar a importância de se aprender uma língua indo além de práticas individuais, a partir de atividades que explorem a dinâmica conversacional e interacional da língua-alvo.

Palavras-chave: Competência interacional; E-Learning; Objetos de aprendizagem; Português Língua Adicional.

Autoria: Erika Suellem Castro da Silva

Orientação: Maria Helena da Nóbrega

Data da defesa: 06/03/2020

Interculturalidade e formação de professores em curso de imersão para o Celpe-Bras

Esta pesquisa objetiva contribuir para as práticas de ensino de português como língua adicional (PLA) em um curso preparatório para o exame Celpe-Bras em ambiente de imersão, com a proposição de intervenções na preparação de professores em formação, estagiários do programa, buscando um aperfeiçoamento em suas abordagens e conteúdos no que tange ao desenvolvimento da competência intercultural dos aprendizes estrangeiros. Esse contexto de ensino e aprendizagem conta com a regência de aulas por professores estagiários e turmas compostas por alunos de origens, línguas e culturas diversas, que vêm ao Brasil sem nenhuma preparação prévia e quase nenhum conhecimento acerca do país e suas culturas. Em cerca de oito meses, eles devem ser aprovados naquele exame de proficiência, requisito para a participação do Programa Estudantes-Convênio de Graduação (PEC-G) na Universidade Federal do Pará (UFPA). Essas especificidades, aliadas à observação de que alguns aprendizes apresentam um desempenho muito abaixo em relação ao restante da turma, mesmo após alguns meses de curso, e que parte deles acaba por reprovar no exame, levaram a uma investigação da relação entre a atuação docente segundo uma abordagem intercultural nas aulas de PLA e a adoção de comportamentos e atitudes mais receptivos por aqueles alunos aos falantes de outras línguas e culturas, nativos ou não, e suas produções culturais, o que, em tese, geraria um maior proveito das oportunidades inerentes à convivência em um ambiente de imersão. Foi realizado, então, um estudo de caso qualitativo (ANDRÉ, 2013) com a turma de 2017, cujos sujeitos de pesquisa foram quatro professores estagiários e os seus dezenove alunos. O estudo documental e bibliográfico contou com um levantamento preliminar da literatura acerca do PEC-G, do Celpe-Bras, de crenças e suas mudanças na área de ensino e aprendizagem de línguas, cultura, interculturalidade e competência comunicativa intercultural (CCI) e aprendizagem de línguas em contexto de imersão. A investigação e análise das crenças dos sujeitos foi realizada segundo a abordagem contextual, com distintos instrumentos de coleta de dados: questionários, entrevistas e observações de aula. Foram também entrevistados, para maior detalhamento do contexto em questão, uma professora informante, a coordenadora do programa e o presidente da Associação dos Estudantes Estrangeiros da UFPA. Após a análise dos dados, foi observada lacuna na preparação de três dos estagiários em relação ao ensino e à abordagem de cultura e interculturalidade nas aulas de PLA, bem como reações como confronto, indignação expressa, omissão e interrupção da aula para o recurso imediato à coordenação em incidentes que envolveram choques entre as culturas em jogo em sala de aula. Foi desenhada, então, uma proposta interventiva visando a uma complementação de sua formação no que tange ao gerenciamento do choque cultural de alunos e professores, a abordagem de cultura e interculturalidade em aulas de línguas e o desenvolvimento da CCI dos aprendizes estrangeiros em imersão, nos moldes do cronograma de preparação docente do curso em questão.

Palavras-chave: Formação de professores de línguas; Interculturalidade; Linguística Aplicada; Português como língua adicional.

Autoria: André Monteiro Diniz

Orientação: Maria Helena da Nóbrega

Data da defesa: 05/03/2020

Uma proposta crítico-discursivo-filológica de análise da censura: emendas inquisitoriais na edição de 1586 da Compilação de todas as obras de Gil Vicente

A obra do dramaturgo português Gil Vicente (1465-1536) foi transmitida por meio de folhas volantes e de duas edições, uma de 1562 e outra de 1586, do livro intitulado Compilação de todas as obras de Gil Vicente. Ambas edições foram vistoriadas por qualificadores da Inquisição portuguesa, porém apenas a segunda foi notadamente emendada. Por a entendermos como um documento histórico que carrega as marcas do processo censório da Inquisição portuguesa, o objetivo principal desta pesquisa de doutorado foi fazer um estudo crítico-discursivo-filológico de caso sobre esse procedimento editorial. Assim, tendo como bases teórico-metodológicas a Crítica Textual (BLÉCUA, 2001; CAMBRAIA, 2005; SPAGGIARI E PERUGI, 2004) e a Análise Crítica do Discurso (FAIRCLOUGH, 1941, 2008, 2009; VOLÓCHINOV, 2017; FOUCAULT, 2014 [1970]; e GONÇALVES-SEGUNDO, 2011, 2018), realizamos o seguinte: 1. Investigação a respeito de Gil Vicente e sua obra, da produção tipográfica e da Inquisição em Portugal no século XVI; 2. Seleção, com base no trabalho de Freire (1944), e colação das peças em língua portuguesa com mais de quarenta alterações na edição de 1586 em relação ao testemunho de 1562; 3. Dupla classificação das variantes substantivas; 4. Análise filológica e crítico-discursiva das variantes, considerando as possíveis motivações censórias, movimentações editoriais realizadas e, dentre as ordens do discurso, como representações de experiências de mundo, ou seja, como determinados discursos (metafunção ideacional) emergem a partir delas. Utilizamos para os cotejos as edições fac-similadas das duas referidas edições da Compilação disponíveis no site da Biblioteca Nacional de Portugal, e também, como apoio, a edição crítica e fac-similada dirigida por Camões (2002) e do centro de estudos de teatro (CET,2010) da universidade de Lisboa. Assim, encontramos 1145 variantes totais, entre as quais, a motivação blasfema totalizou 506 variantes (44,19%); a escandalosa, 433 variantes (37,81%); a supersticiosa, 111 variantes (9,69%); e a erudita, 95 variantes (8,29%). A maioria (1115) ocorreu por supressão (97,37%), seguida de substituição (30 variantes - 2,62%). Verificamos que as duas primeiras categorias censórias constituem-se como tabu e que as emendas sobre elas buscam preservar dois pilares de poder e da ideologia conservadora da Igreja: o seus dogmas e o que os embasam; e o seu funcionalismo interno. Por outro lado, as superstições não foram tão visadas quanto as anteriores tendo em vista que dizem pejorativamente de quem nelas acredita ou as pratica, ocorrendo emendas apenas por seus locais críticos coexistirem com outros mais polêmicos.

Palavras-chave: Análise crítica do discurso; Censura inquisitorial; Compilação de 1586; Crítica textual; Gil Vicente; Ordens do discurso.

Autoria: Ana Carolina de Souza Ferreira

Orientação: Manoel Mourivaldo Santiago-Almeida

Data da defesa: 07/02/2020

Um estudo etnolinguístico centrado na variedade de português vernacular dos tembé do rio Guamá (PA)

Nesta pesquisa apresento um estudo etnolinguístico com enfoque na variedade de português vernacular falada por indígenas da etnia tembé do rio Guamá. A investigação foi centrada nas aldeias Sede, Itwaçu, Ita Putyr, Frasqueira, Pinawa e São Pedro, localizadas no município de Santa Luzia do Pará, na Terra Indígena Alto Rio Guamá. Os resultados principais da pesquisa apresentada nesta tese foram baseados: (i) na captação de um corpus de fala espontânea por meio de gravações realizadas nas aldeias; (ii) na transcrição do corpus; (iii) na organização de um banco de dados dessa variedade de português. Na tese, advogo a hipótese de que o povo tembé do rio Guamá está em processo terminal de consolidação de language shift do tembé/tenetehar para o português. Essa hipótese foi guiada por um estudo da situação etnolinguística deste grupo indígena bem como por uma descrição e algumas análises de fenômenos dessa variedade de português rural. Proponho também que a variedade de português falada pelo povo tembé do rio Guamá possa ser enquadrada na subdivisão de variedades de português rurais denominadas de português afro-indígena.

Palavras-chave: Etnolinguística; Language Shift; Plurilinguismo; Português Afro-indígena; Português vernacular falado pelo povo tembé do rio Guamá.

Autoria: Mara Silvia Jucá Acácio

Orientação: Márcia Santos Duarte de Oliveira

Data da defesa: 23/01/2020

Dissertações de Mestrado

Movimentação Epistêmico-Axiológica em canais de ativismo digital feminista: uma perspectiva multidisciplinar

Ao longo dos últimos anos, mobilizações feministas, antirracistas e pró-LGBTTQIAPN+ têm ocupado as redes e as ruas ao redor do Brasil. Considerando o atual cenário, defendemos que investigar as estratégias discursivas contra-hegemônicas, voltadas para a (des)construção da diferença, presentes no ativismo digital feminista, possa auxiliar a entender o seu papel na formação de uma nova geração política. Para tanto, nesta dissertação voltamos o nosso olhar para vídeos de duas youtubers ativistas (Nátaly Neri e LouiePonto), publicados no primeiro semestre de 2017. São eles: "HETEROFOBIA E RACISMO REVERSO EXISTEM? | Louie Ponto e Nátaly Neri"; "POR QUE VOCÊ É TÃO AGRESSIVA, NÁTALY" e "YOUTUBER SÓ FALA MERDA NA INTERNET? Feat. Louie Ponto"; "RÓTULOS ME LIMITAM OU ME DEFINEM? | Especial Dia do Orgulho LGBT | Louie Ponto". Nosso objetivo foi investigar o papel da (des)construção das diferenças a partir do dissenso em suas estratégias argumentativas em vídeos de formação política. Para tanto, desenvolvemos o conceito de Movimentação Epistêmico-Axiológica, uma contribuição teórica de aprimoramento da noção de Posicionamento enquanto estratégia discursiva, conforme definida por Hart (2014) em sua proposta cognitivamente orientada de Análise Crítica do Discurso cognitivamente orientada. Partimos da hipótese de que tal aparato teórico-metodológico multidimensional permitiria aprimorar a visão sobre os mecanismos utilizados na construção de Espaços Discursivos em textos de visada argumentativa (epistêmica ou prática) e compreender de que forma são construídas relações de solidariedade, neutralidade e antagonismo entre comunidades discursivas a partir da disputa entre Alegações e Propostas de Ação. Propomos um modelo de análise centrado em tal processo que nos permitiu investigar a representação do Eu, do Nós e do Outro enquanto objetos do discurso (entidades discursivas) com o apoio de layouts de configuração funcional dos argumentos (TOULMIN, 2006; FAIRCLOUGH; FAIRCLOUGH, 2012; GONÇALVES-SEGUNDO, 2020a). Dessa forma, pudemos reconhecer uma maior variedade de formas de mapear as diferenças tanto entre as entidades discursivas, quanto entre tais entidades e o endo/exogrupo. A partir desse mapeamento, analisamos de que forma as vozes autorais se articulavam ou se opunham a outras vozes ao longo dos textos. Mais especificamente, por meio das análises da Avaliatividade, verificamos o grau de abertura dialógica das vozes autorais em relação à perspectiva do Outro nos pontos de tensão entre os movimentos argumentativos. Com isso, determinamos as mudanças efetuadas na distância relativa entre as entidades e, consequentemente, os tipos de relação sugerida entre as comunidades discursivas às quais elas faziam referência. Em quase todos os vídeos analisados depreendemos instâncias de movimentos de aproximação e afastamento epistêmico-axiológico, exceto naqueles cujos debates se configuraram como instâncias de desacordo profundo (FOGELIN, 2005). Os movimentos foram mobilizados para, respectivamente, amenizar e reforçar, respectivamente, as tensões dialógicas entre os elementos argumentativos considerados como critérios inegociáveis para determinar a filiação ideológica ao endo/exogrupo. Com isso, depreendemos os papéis dos movimentos epistêmico-axiológicos para as práticas de formação política no âmbito do ativismo digital e comprovamos a produtividade do modelo.

Palavras-chave: Análise Crítica do Discurso; Argumentação; Ativismo digital; Feminismo; Linguística Cognitiva.

Autoria: Winola Weiss Pires Cunha

Orientação: Paulo Roberto Gonçalves Segundo

Data da defesa: 15/12/2020

Uma análise atualizada dos étimos chineses no Glossário luso-asiático de Sebastião R. Dalgado

No início do século XX, o orientalista goês Sebastião Rodolfo Dalgado (1855-1922) coligiu, em seu Glossário luso-asiático (1919-1921), os vocábulos de origem asiática encontrados em obras sobre o Oriente escritas por autores portugueses desde o século XVI. Com base em extensa pesquisa bibliográfica e documental, Dalgado produziu um dicionário histórico-etimológico com mais de cinco mil verbetes abundantemente comentados, abonações apresentadas em ordem cronológica e étimos de pelo menos 25 idiomas da Ásia. Essa obra, não poucas vezes descrita - com justiça - como monumental, tem servido, ao longo do último século, como principal referência para a etimologia das palavras de origem asiática no léxico português. O conjunto dos étimos chineses propostos em suas páginas, no entanto, jamais foi objeto de uma revisão completa. O presente estudo reúne os verbetes de origem supostamente chinesa localizados nos dois volumes da obra e revisa a etimologia apontada pelo autor. As hipóteses apresentadas por Dalgado são analisadas à luz de novos dados e argumentos que permitam confirmar os étimos ou construir novas proposições etimológicas.

Palavras-chave: Etimologia; Língua Chinesa; Língua Portuguesa; Linguística Histórica; Morfologia Diacrônica.

Autoria: Amilton Jorge da Costa Reis

Orientação: Mário Eduardo Viaro

Data da defesa: 25/11/2020

Um estudo crítico discursivo e das marcas avaliativas da responsividade nas cartas do leitor relativas à reforma da previdência em jornais paulistas

Materializada nos textos (orais ou escritos), a linguagem é o componente social que nos permite interagir com o mundo, com o outro, avaliar e apreciar pessoas, objetos e relatar experiências. Nesta pesquisa, propusemo-nos a compreender de que modo os atores sociais respondem, na carta do leitor, ao discurso circulante sobre um tema de interesse social, a reforma da Previdência. Sobre esse tema, concorrem interesses políticos e do mercado baseados em medidas neoliberais, de um lado, e o interesse da população, de outro. Nesse campo de interesses divergentes, motivou-nos pesquisar como os atores sociais avaliavam e se posicionavam sobre a reforma, constituindo-se como nosso objetivo geral. Os objetivos específicos constituem-se em: 1) identificar os discursos que circulam e sustentam esses posicionamentos; 2) compreender quais recursos linguísticos avaliativos são usados de modo relevante; 3) compreender como se configura o engajamento do leitor-autor em relação aos discursos e às construções das perspectivas que ele produz sobre o tema, em relação aos discursos circulantes e na negociação intersubjetiva de seu posicionamento com outros leitores. Nossa hipótese foi de que o Sistema da AVALIATIVIDADE de Martin; White (2005) pudesse ser uma ferramenta útil para depreender o nível de responsividade na avaliação e no posicionamento do leitor sobre o tema da reforma, constituindo-se como nossa categoria de análise. O corpus deste trabalho concentra-se no gênero Carta do leitor, do qual analisamos 45 cartas que respondiam ao tema da reforma. Os dados foram tratados via Sistema UAM Corpus Tool versão 3.3, de O`Donnell (2019). Este estudo pautou-se na Análise Crítica do Discurso, por Fairclough (1995; 2001; 2004); em Thompson (2011 [1990]; 2014 [1995]), no que compete aos conceitos de ideologia, relações de poder e formas simbólicas; em Charaudeau (2013), referente ao discurso da mídia e ao discurso político e nas noções de dialogismo, heteroglossia, compreensão e atitude responsiva, de Bakhtin (2003 [1979]) e de Bakhtin; Volóchinov (2006 [1895-1975]). Os resultados gerados pelo uso do Sistema da AVALIATIVIDADE confirmam que ele se mostrou como um Sistema útil para compreendermos as formas de avaliação e de engajamento do leitor sobre o tema, por ajudar a sistematizar os recursos linguísticos usados em tais avaliações e por permitir compreender os recursos implícitos no texto que indicam as avaliações do leitor, categorizados por meio de seus subsistemas. O uso predominante do engajamento monoglóssico e contrativo, independentemente do posicionamento adotado, forneceu-nos indícios de que o padrão responsivo do leitor-autor prima por restringir, contestar e simular o apagamento de outras perspectivas em face do tema da reforma. A responsividade do leitor-autor de posicionamento "contra" e de "aceitação parcial" é sustentada por discursos circulantes semelhantes no que compete a não aceitação da proposta do governo para a reforma e diferem no fato de aceitarem (de "aceitação parcial") ou não ("contra") a necessidade da reforma. Ambos diferem significativamente dos pontos de discussão trazidos nas cartas "a favor". Para o posicionamento favorável à reforma, a base de preocupação trazida é de ordem econômica e o leitor engaja-se de modo alinhado aos discursos do governo. Neste, o espaço de responsividade foi relevantemente marcado por discursos que sustentam as ideologias dominantes, reproduzindo as relações de poder e as ideias neoliberais que cercam o tema da reforma. Já nos tipos "contra" e de "aceitação parcial", os espaços de responsividade foram predominantemente marcados por discursos contestatórios críticos, nos quais há um engajamento não solidário ao discurso do governo. No posicionamento de "aceitação parcial", há a abertura para que seja feita uma reforma que leve em conta questões diversas da realidade do mercado de emprego, das condições de vida e saúde das pessoas. Portanto, esses valores mobilizados nos posicionamentos "contra" e de "aceitação parcial" foram sustentados por discursos circulantes que entendem que a Previdência Social deve manter os ideais pelos quais foi instituída no Brasil, preservando os direitos de proteção social garantidos pela Constituição de 1988.

Palavras-chave: Análise Crítica do Discurso; Cartas do Leitor; Reforma da Previdência; Responsividade; Sistema da Avaliatividade.

Autoria: Sandra Gomes Rasquel

Orientação: Maria Lúcia da Cunha Victório de Oliveira Andrade

Data da defesa: 05/11/2020

Diálogos entre Volóchinov e Humboldt na filosofia da linguagem: a participação do idealismo na síntese marxista

Esta pesquisa de mestrado é o seguimento de um trabalho que começou na Iniciação Científica: a análise da influência idealista na síntese marxista apresentada por Valentin N. Volóchinov, membro do Círculo de Bakhtin, em Marxismo e Filosofia da Linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem (doravante MFL, de1929). Ainda nos passos iniciais, dados na IC com o filólogo Karl Vossler, Wilhem von Humboldt já emergia como o mais significativo representante do idealismo na linguística. Na Rússia, nação do Círculo, Humboldt é considerado o fundador da linguística geral. Em MFL, Volóchinov elege a tradição idealista como a tese que, confrontada à antítese (a Escola de Genebra de Saussure), gera as reflexões críticas sobre as quais a síntese marxista se constrói. Três tópicos de análise comparativa entre o pensamento humboldtiano e o volochinoviano foram desenvolvidos: i) a concepção de dialogismo de cada autor entregou duas grandes diferenças na concepção de sujeito: para o primeiro, a manifestação de uma inteligência universal (o espírito), cuja consciência individual é dotada de capacidade linguística inata; para o segundo, um sujeito responsivo ao meio - sua potencial liberdade não é absoluta, e sim orientada por situações extraverbais concretas. ii) A teorização da formação da palavra como fruto daqueles mecanismos inatos ou como fruto da comunicação social ideológica corroborou o resultado anterior: a grande disputa entre idealismo e marxismo no tocante à filosofia da linguagem é, precisamente, a concepção da consciência individual como apriorística à experiência ou como fato sócio-ideológico. iii) Por fim, a influência da língua na organização coletiva - as visões de mundo humboldtianas e ideologia do cotidiano volochinoviana - revelou que, enquanto o ser marxista é social, a sociedade idealista é análoga a um corpo individual. Os resultados convergem para a inversão do ponto de origem da dialética dessas correntes, já ressaltada durante a IC: para o idealismo, o movimento começa no ser e se expande para fora; para o marxismo, começa no seio da sociedade e adentra o ser.

Palavras-chave: Círculo de Bakhtin; Filosofia da linguagem; Marxismo; Idealismo; Wilhelm von Humboldt.

Autoria: Taciane Domingues Ferreira

Orientação: Sheila Vieira de Camargo Grillo

Data da defesa: 15/09/2020

Léxico e estilo em Olhinhos de gato, de Cecília Meireles

Nesta dissertação pretendemos analisar algumas escolhas lexicais feitas por Cecília Meireles na prosa Olhinhos de Gato. O objetivo é verificar como as escolhas lexicais nos remetem às memórias de infância de OLHINHOS DE GATO, personagem central da obra. Como uma câmera que tudo registra, a narradora, onipresente e onisciente, detalha minuciosamente alguns objetos da casa além das roupas e acessórios de Mãos de prata, mãe da menina. A narrativa contempla a natureza e as relações humanas, algumas efêmeras; outras, eternas. Ao descrever esses pertences e relatar algumas de suas aventuras, Cecília Meireles evidencia, por meio de escolhas lexicais pontuais, como fora sua infância. A poeta, por meio de OLHINHOS DE GATO, narra memórias doces e amargas. As escolhas lexicais, precisamente feitas por Cecília Meireles, têm papel fundamental: além de descreverem as memórias, inserem o leitor em uma época. Objetivamos, portanto, verificar como essas escolhas lexicais são importantes para relatar eventos passados e, primordialmente, dar às memórias da menina uma carga subjetiva latente, capaz de despertar sensações e envolver o leitor em uma atmosfera mágica. Para melhor compreender de que forma o estilo da obra pode ser sentido/observado por meio das escolhas lexicais, usaremos, como parte da fundamentação teórica, CRESSOT (1947), LAPA (1991), MONTEIRO (1991), CÂMARA JR. (2004), MARTINS (2012). Embora nossas análises estejam centradas nas escolhas das unidades léxicas, notamos, também, o uso reiterado do sufixo - inho, que, passa, portanto, a ser um traço de estilo da obra. Em todos os capítulos da narrativa, as memórias são revividas por meio de descrições detalhadas. A dissertação é estruturada em quatro capítulos. O primeiro é de cunho teórico e os outros três são dedicados às análises. No primeiro, abordamos a questão de estilo, estilística e o estilo da obra. No segundo, discorremos sobre a criação de personagens, abrindo o capítulo com uma discussão teórica e, em seguida, analisando as escolhas lexicais feitas para descrever as três personagens que sustentam a narrativa. No terceiro capítulo, voltamo-nos às escolhas lexicais usadas para descrever os objetos deixados pela mãe e aqueles que compõem a casa. Por fim, no quarto capítulo, falamos sobre as escolhas lexicais sinestésicas. Mostraremos, por meio das análises, que o leitor é tocado pela habilidade que Cecília Meireles tem para escolher as palavras e, mais, pela exímia capacidade de explorar diferentes recursos de linguagem e de discurso para envolver o leitor nas tramas daqueles anos de infância, eternizando memórias, evidenciando sentimentos e resgatando uma época.

Palavras-chave: Cecília Meireles; Escolhas lexicais; Estilo; Memórias de infância; Olhinhos de Gato.

Autoria: Rodrigo Schulz Ferreira

Orientação: Elis de Almeida Cardoso Caretta

Data da defesa: 26/06/2020

A Carnavalização em Game of Thrones: um estudo verbivocovisual

A presente dissertação tem como objetivo compreender como a simbologia da cultura popular da Idade Média e do Renascimento, mais especificamente a carnavalização e o grotesco, estudados pelo pesquisador russo Mikhail Bakhtin (1963;1965), se constrói por meio da linguagem verbivocovisual dentro da série televisiva norte-americana Game of Thrones. Buscamos verificar também como esses elementos integram a arquitetônica da série. Para tal, nossa fundamentação teórica está alicerçada nos estudos do Círculo de Bakhtin, bem como em teorias do cinema e do audiovisual. Metodologicamente, com a finalidade de atingir tais objetivos, foram observados "os enquadramentos", "o fundo sonoro", entendido como todo e qualquer som que acompanha e potencializa o sentido narrativo do verbal e do visual, e, por fim, "os diálogos", que são as interações entre as personagens, por meio das legendas em língua portuguesa. Utilizamos em nossas análises o software livre ELAN para que pudéssemos examinar com mais precisão as dimensões verbal, vocal e visual, tanto separadas quanto em interação. Assim, foi possível verificar a presença dos simbolismos da cultura popular nas três dimensões da obra e identificar como uma dimensão em interação com as demais pode colaborar para a construção de significados carnavalizados e/ou grotescos no todo da série. Um dos resultados da pesquisa aponta para a existência desses elementos como acessórios na composição temática da narrativa seriada e nos levou a refletir sobre questões de cunho mercadológico que envolvem a temática da série e a emissora que a produziu, a HBO inc., bem como sobre o papel desempenhado pela mulher em sua figurativização enquanto personagem e/ou em seu papel, maior ou menor, de realizadora da obra (direção, roteiro e produção).

Palavras-chave: Game of Thrones; Carnavalização; Círculo de Bakhtin; Grotesco; Linguagem Verbivocovisual.

Autoria: Ana Carolina Pais

Orientação: Sheila Vieira de Camargo Grillo

Data da defesa: 26/05/2020

A dissertação nos livros didáticos de língua portuguesa de 1980-1990: uma presença constante

O livro didático de língua portuguesa é um símbolo do cotidiano escolar de várias gerações, influenciado por renovações no discurso acadêmico e adaptado a diferentes programas oficiais e tecnologias. É, desse modo, uma importante fonte de recuperação da memória cultural e, enquanto vetor da língua, da cultura e dos valores das classes dirigentes, um importante instrumento político. O objetivo deste trabalho é analisar as formas de apresentação da dissertação, gênero escolar, em duas coleções didáticas de língua portuguesa de 2° grau do início da redemocratização brasileira: Fundamentos de Língua e Literatura (MARTOS; MESQUITA, 1987) e Português: Linguagens (CEREJA; MAGALHÃES, 1990). No período entre o final da ditadura militar e o início da redemocratização, a aula de língua portuguesa era tida por alguns linguistas aplicados como um espaço de promoção da transformação social, e a produção de texto, um elemento didático em prol da cidadania. Com base nas redações dos vestibulandos, foram desenvolvidas diversas teorias que convocavam o aluno a tomar um posicionamento diante de questões sociais em sua escrita, em uma tentativa de se vencer as práticas e as concepções autoritárias. À luz dos conceitos de enunciado concreto (BAKHTIN, 2016; VOLÓCHINOV, 2017) e de discurso alheio (BAKHTIN, 2015; VOLÓCHINOV, 2017) e do modelo ideológico de letramento (STREET, 2014), busca-se uma análise que explicite as consequências da relação entre o trabalho enunciativo e o trabalho interacional na materialidade linguística dessas coleções. Para tanto, os objetivos específicos são: (i) descrever e analisar as formas composicionais, os estilos e os temas das seções dedicadas à dissertação, enunciados concretos; (ii) reconhecer como o discurso alheio é apresentado nessas seções; (iii) interpretar, à luz do modelo ideológico de letramento, com quais efeitos de sentido para o aluno esses discursos alheios são reconstruídos e ressignificados no ensino da dissertação. Em Fundamentos de Língua e Literatura (MARTOS; MESQUITA, 1987), parte-se da literatura e, na gramática e na redação, tem-se categorizações que visam articular pensamento, língua e mundo em uma única relação termo a termo, cujo domínio é sinônimo de escrever bem e pensar bem. O intuito da dissertação é estritamente disciplinar. Já em Português: Linguagens (CEREJA; MAGALHÃES, 1990), a (re)apresentação dos conceitos de argumentação e de parágrafo como objetos de ensino e as propostas de pesquisa e debate revelam a preocupação em se fazer com que o aluno assuma posicionamentos nas produções de texto dissertativo. A inferência de transparência e objetividade nas seções de redação de ambas as coleções indicam, no entanto, que, apesar de tematicamente, haver significativas mudanças, a concepção de língua(gem) que subjaz à escolha e à organização dos objetos de ensino da dissertação privilegia uma atitude grafocêntrica que hierarquiza os estudantes. A dissertação, desse modo, é (re)apresentada como um objeto de distinção (BOURDIEU, 1979), como em décadas anteriores.

Palavras-chave: Discurso alheio; Dissertação; Linguística aplicada; Livros didáticos; Pesquisa documental.

Autoria: Nathália Akemi Sato Mitsunari

Orientação: Maria Inês Batista Campos

Data da defesa: 04/05/2020

Coesão verbo-imagética: um estudo sistêmico-funcional sobre multimodalidade em mídias digitais

Estudos de multimodalidade em mídias digitais enfrentam um desafio, na medida em que os objetos de estudo apresentam volatilidade, por serem constantemente transformados e renovados, seja em decorrência da emergência de novas práticas discursivas, seja por conta de novas possibilidades tecnológicas. Isso requisita ao analista verificar a aplicabilidade de categorias e de métodos de análise multimodal já existentes em face das novas práticas, atentando para as formas pelas quais unidades mínimas de análise são sistematizadas, para o papel atribuído ao layout no direcionamento da atenção do consumidor textual e para os modos pelos quais as diferentes possibilidades de articulação intermodal viabilizadas pela plataforma, pelos gêneros e pelas tecnologias de edição, manipulação e remixagem são contempladas nas diversas proposições. Desse modo, partimos, nesta pesquisa, da hipótese de que um sistema de COESÃO VERBO-IMAGÉTICA, estruturado a partir do sistema de TRANSITIVIDADE, ligado à Metafunção Ideacional da Linguística Sistêmico-Funcional permite consolidar unidades de análise, mapear relações estruturais, processuais e instanciais entre as modalidades e estabelecer direcionalidade de modificação a partir da determinação da modalidade dominante. Nesse sentido, assumimos como objetivos desta pesquisa: i. propor um sistema de COESÃO VERBOIMAGÉTICA e uma metodologia de análise; ii. determinar os critérios de definição e de operacionalização de unidades de análise em interações verbo-imagéticas; iii. depreender efeitos semântico-discursivos da instanciação de laços coesivos. A investigação é articulada a uma hipótese secundária de que a articulação entre as noções de Figura e Fundo e o sistema de VALOR INFORMACIONAL permite que identifiquemos Níveis de Visualidade envolvidos no consumo de textos multimodais digitais. Assim, podemos determinar sobre quais dimensões visuais o sistema de COESÃO VERBO-IMAGÉTICA é aplicável. Para tanto, fundamentamo-nos, primariamente, na Linguística Sistêmico-Funcional (HALLIDAY, 2004; LAVID; ARÚS; ZAMORAO-MANSILLA, 2010; FUZER; CABRAL, 2014; GONÇALVES-SEGUNDO, 2014), por fornecer categorias de análise que possibilitam descrever a construção do significado em termos de experiência dos atores sociais em práticas discursivas diversas, e, secundariamente, na Linguística Cognitiva (LAKOFF; JOHNSON, 1980; LANGACKER, 2008; TENUTA; LEPESQUER, 2011; HART, 2014; GONÇALVES-SEGUNDO, 2017; VEREZA, 2007, 2013, 2016), por fornecer categorias para refinar o olhar interpretativo sobre os efeitos semântico-discursivos de laços coesivos e para a determinação do estatuto atencional de elementos verbais e imagéticos no âmbito de Níveis de Visualidade, além de possibilitar a compreensão da relação entre coesão e metaforização multimodais. As proposições que desenvolvemos permitiram identificar a partir de um corpus constituído por textos estáticos e dinâmicos publicados no YouTube, no Twitter e no Instagram três modos de correspondência estrutural coesiva entre elementos verbais e imagéticos (Reiteração, Adição e Identificação), que se articulam em maior ou menor grau aos efeitos de Ajuste de Focalização (Restrição Referencial e de Ajuste de Saliência), de redução de ceticismos e de orientação de raciocínios inferenciais. Além disso, discutimos a possibilidade de padrões coesivos verboimagéticos estarem associados à estruturação de gêneros discursivos.

Palavras-chave: Coesão; Mídias digitais; Multimodalidade; Transitividade; Visualidade.

Autoria: Gabriel Isola Lanzoni

Orientação: Paulo Roberto Gonçalves Segundo

Data da defesa: 05/02/2020

Elementos para uma memória discursiva do ensino de escrita: livros escolares de português (1930-2002)

Neste trabalho, um conjunto de dezesseis livros escolares constitui o material de partida para a investigação de uma memória do ensino de escrita no Brasil, no período de 1930 a 2002. O arcabouço teórico é constituído pela articulação entre a Análise do discurso francesa (PÊCHEUX, 2014 [1975]; COURTINE, 2014 [1981]) e fundamentos teóricos vindos da área da História (LE GOFF, 2013 [1977]; NORA, 2013 [1979]) e da Sociologia (HALBWACHS,1990 [1950]). Pensando o livro escolar como objeto variável e instável (BATISTA, 1999), o objetivo do trabalho é o estabelecimento de elementos para uma memória discursiva do ensino de escrita a partir da forma material de oito livros escolares metodicamente selecionados dentre os dezesseis inicialmente escolhidos destinados ao último ano do primeiro ciclo do secundário. Essa forma material na qual sociedade e história se plasmam evoca também as turbulências sociopolíticas do período entre 1930 e 2002, permitindo investigar permanências, antecipações e apagamentos quanto ao que se concebeu, no período,como língua, escrita e ensino de escrita. Do ponto de vista metodológico, examino aquele conjunto de oito livros escolares, cuja representatividade para cada década foi estabelecida por meio de dois critérios: o autoral-editorial e o enunciativo-discursivo. O critério autoral-editorial considera os dados editoriais de cada livro como enunciados em ruína do acontecimento discursivo de sua produção/circulação/recepção; por sua vez, o critério enunciativo-discursivo toma os elementos do gênero do discurso: conteúdo temático, estilo e construção composicional (BAKHTIN, 2016 [1979]) para descrever as propostas de produção escrita dos livros escolares quanto às ênfases dadas a cada um desses elementos. Considerada a análise realizada a partir das ênfases dadas aos elementos do gênero do discurso, que resultou, num primeiro momento, na constatação de que, entre 1930 e 1960, predominava a ênfase no conteúdo temático e, entre 1970 e 2002, na construção composicional, proponho duas categorias para constituir uma memória discursiva do ensino de escrita entre 1930 e 2002: (i) a proposta-sintagma, que foi encontrada, principalmente, em livros publicados entre 1930 e 1960; e (ii) a proposta-roteiro, que foi encontrada, principalmente, em livros publicados entre 1970 e 2002. Os resultados obtidos permitem constatar que a alternância entre proposta-sintagma e proposta-roteiro é fruto de duas concepções diferentes de trabalho que, entre 1930 e 2002, estiveram vigentes em conjunturas históricas particulares e determinaram concepções de língua, escrita e ensino de escrita. No caso da proposta-sintagma, pautada em grandes temas (invocação de semióforos) e pequenos temas (os quais,de algum modo, conclamam o sujeito a se marcar como integrante de experiências culturalmente ritualizadas) e na atenção à sintaxe da língua, predomina uma concepção de trabalho em que basta discorrer para fazer, ao passo que, na proposta-roteiro, caracterizada pela presença de conteúdo instrucional e uso de marcadores discursivos de sequenciação,predomina uma concepção de trabalho em que é preciso o fazer [do mediador] para [o aluno] fazer. A análise dessas categorias, visando às concepções de língua, escrita e ensino de escrita,levou à constituição de uma memória discursiva do ensino de escrita entre 1930 e 2002.Convivendo sob diferentes ênfases no decorrer das décadas, as formas materiais das atividades guardam pré-construídos sobre o que a sociedade retoma ou projeta como trabalho para as gerações que se sucedem: para os que terão de ocupar posições e discorrer sobre elas epara os que terão de saber como fazer, sem nenhuma certeza quanto a se lograrão apenas reproduzir um ritual de preparação ou se vão se fato encontrar as posições no lugar projetado,prometido e esperado. Para a escrita e para o ensino da escrita, a convivência de diferentes formas materiais, sintetizadas, neste trabalho, na proposta-sintagma e na proposta-roteiro,parece apontar para a atenção às contradições, as quais, se estão linguisticamente marcadas pelas concepções de língua, escrita e ensino de escrita, podem também ser remetidas, na qualidade de formas materiais de sua existência sócio-histórica, a projetos de país ligados a conjunturas sociopolíticas específicas.

Palavras-chave: Ensino de escrita; Escrita; Livros didáticos; Livros escolares; Memória discursiva.

Autoria: Cristian Henrique Imbruniz

Orientação: Manoel Luiz Gonçalves Corrêa

Data da defesa: 20/01/2020

 

 

Defesas no ano de 2019

 

Teses de Doutorado

A neologia no entrecruzar das ciências médicas e biológicas e da engenharia: estudo terminológico do léxico pertinente à engenharia biomédica

O presente trabalho, com abordagem lexicológico-terminológica, é fruto de uma proposta de estudo da contribuição dos domínios ancestrais na formação da terminologia de um domínio emergente, a Engenharia Biomédica. Partimos do pressuposto de que esse domínio, por seu caráter multi- e interdisciplinar, exibe, na construção de seu sistema conceptual e na sua formação terminológica, uma forte hibridização de vários campos do saber, para além das engenharias e das ciências médicas e biológicas. Muitos dos termos que compõem esse discurso especializado são empréstimos ou formações mistas a partir de unidades lexicais especializadas de domínios preexistentes. Nosso objetivo, nesse sentido, é investigar, de modo exploratório, o conjunto terminológico pertinente à Engenharia Biomédica, por meio do exame da relevância de outras áreas do conhecimento sobre o domínio estudado. Seguimos fundamentação teórica e metodológica das Ciências do Léxico, sobretudo no tocante à terminologia e à neologia, baseando-nos principalmente na Teoria Comunicativa da Terminologia, em outras possíveis abordagens sobre terminologia discursivo-textual e em estudos acerca da neologia. Para tanto, estabelecemos, como corpus da pesquisa, teses e dissertações publicadas recentemente em programas brasileiros de pós-graduação, consideradas textos acadêmico-científicos de alto grau de especialização. Utilizamos ferramentas computacionais no processamento textual e estabelecemos, como corpora de exclusão, dicionários de língua geral e dicionários de especialidades dos domínios ancestrais, quando existentes. Os resultados são descritos a partir de três eixos norteadores: o fenômeno da interseção de áreas, nossa ênfase, e, ainda, os fenômenos morfossintáticos e semânticos na formação dos termos e os fenômenos pragmático-textuais do discurso especializado em Engenharia Biomédica. Esses eixos evidenciam a condução de nossa análise assentada sobre as noções de que: (i) as áreas ancestrais do conhecimento servem de inspiração para a criação das condições de emergência de uma nova área; (ii) os gêneros discursivos estão inerentemente ligados à esfera de comunicação da qual fazem parte e, por conseguinte, refletem suas finalidades e suas condições específicas de produção, de recepção e de construção de sentidos; (iii) as unidades lexicais especializadas são parte da língua geral e estão sujeitas aos mesmos fenômenos desta, comportando, entre outros, variações, sinonímias e neologismos. Classificamos as áreas ancestrais que permitem a emergência da Engenharia Biomédica em domínios incidentais, adjacentes e interseccionais, conforme a relação estabelecida com o domínio emergente. Paralelamente ao fenômeno da interseção de áreas, observamos que a complexidade dos processos neológicos, a instabilidade denominativa, a influência da língua inglesa e as características da situação discursivo-comunicativa são aspectos predominantes nas formações terminológicas desse domínio. Por fim, acreditamos que este estudo contribuirá para a sistematização terminológica da Engenharia Biomédica e para o surgimento de novos estudos sobre o panorama que buscamos delinear ao longo de sua realização.

Palavras-chave: Discurso especializado; Engenharia biomédica; Intersecção de áreas do conhecimento; Neologia; Terminologia.

Autoria: Márcia de Souza Luz Freitas

Orientação: Ieda Maria Alves

Data da defesa: 12/12/2019

Formação de leitores: movimentos dialógicos e relação de alteridade em réplicas de leitura

Esta tese pesquisa a leitura realizada na escola, com foco na formação de leitores em aulas de língua materna. Ela se baseia na concepção de linguagem dialógica e heterogênea, ancorando-se nos pressupostos teóricos do Círculo de Bakhtin e da Análise do Discurso Francesa, particularmente, no segundo caso, nos conceitos propostos por Pêcheux. Também lançamos mão de estudos sobre a subjetivação do sujeito advindos da Psicologia da Educação e da Psicanálise lacaniana; além de estudos de outras áreas, como Sociologia e Pedagogia, importantes para a compreensão de nosso objeto de investigação de modo transdisciplinar, conforme preconiza a Linguística Aplicada, área de concentração desta tese. O corpus compõe-se de produções de alunos do Ensino Médio e da graduação em Matemática, do Instituto Federal de São Paulo, campus de Campos de Jordão. Esses textos foram elaborados a partir de atividades de leitura; configuram-se, pois, como réplicas de leitura. Dentre os diversos gêneros produzidos, elegemos a "resenha" e o "comentário de leitura" para análise. A metodologia analítica não teve caráter prescritivo nem intenção estatística; teve, sim, caráter descritivo e interpretativo. O objetivo norteador da análise foi responder ao seguinte: como o dialogismo se manifesta nos textos discentes? Essas produções passaram por descrição formal, pela qual buscamos fatos linguísticos que, no plano enunciativo, ganharam estatuto de indícios dialógicos. As réplicas escritas foram analisadas em seções, levando em conta as propostas de leitura trabalhadas em classe. Como resultados, observamos nelas vestígios enunciativos que vislumbraram: 1. os movimentos dialógicos concretizados, dada a relação de alteridade estabelecida; 2. a forma de constituição dialógica de cada conjunto de textos; e 3. aspectos da subjetivação dos sujeitos-leitores, entendidos como modos de individuação do sujeito. Observamos dados como: estratégias enunciativas; a quem (ou a quê) o escrevente replicou; filiações ideológico-discursivas, entre outros. Esses traços deram às réplicas ora um aspecto polifônico, ora um aspecto monofônico. Na maioria dos casos, encontramos o aspecto polifônico. Mesmo naqueles com aparência monofônica, a análise minuciosa desvendou o processo dialógico estabelecido na leitura realizada pelo escrevente. Assim, cabe questionar a lógica do erro/da falha, segundo a qual a escola, frequentemente, pratica e avalia a leitura. A nosso ver, esse processo pode ser modificado em favor de um trabalho de produção e análise de réplicas por um viés dialógico. Não defendemos, em absoluto, o abandono do ensino da norma culta padrão e da gramática normativa como parte do processo de desenvolvimento da competência leitora. Entendemos, contudo, que esse enfoque ganharia muito, se fosse associado a uma metodologia de formação de leitores que leve em conta: o papel do gênero discursivo; suas possibilidades de materialização criativa; sua estabilidade e sua instabilidade composicional e estilística; a prática de leitura que considere o dialogismo que a constitui. Acreditamos que essa estratégia de formação de sujeitos-leitores fortaleceria o contexto democrático e inclusivo que almejamos, como professores, desenvolver em sala de aula.

Palavras-chave: Alteridade e subjetividade em leitura; Dialogismo em réplicas de leitura; Formação de leitores; Heterogeneidade discursiva; Práticas avaliativas de leitura.

Autoria: Viviane Dinês de Oliveira Ribeiro Bartho

Orientação: Norma Seltzer Goldstein

Data da defesa: 09/12/2019